segunda-feira, 22 de setembro de 2014

ABORTOS



Amigos, perdoem-me, mas me cansei.
Não se trata de depressão, tampouco de solidão ou qualquer coisa do gênero, apenas cansaço e a certeza do dever cumprido.
A vida sem razão é razão para o final da própria. E, embora ainda trabalhe e irei manter meus compromissos, a minha já se foi.
Tentei lutar e buscar algum motivo, mas já não há nem “Minas nem mar” apenas o inferno absoluto do oco, do vazio, da falta de sentido e de perspectiva.
Simplesmente queria ser jogado nas águas do rio e devolver à mãe natura o que foi me ofertado, mas minha podridão é tal que a vigilância sanitária obriga o sepultamento dos restos para o banquete dos vermes, meus eternos e etéreos companheiros.
Somente quero que não haja comunicação tampouco nenhuma marca sobre a sepultura nem a hipocrisia de qualquer velório. Não se gasta vela com defunto irrisório. Ainda que sepultado respirando, quando o ciclo se completar somente desejo o incógnito, a absoluta certeza da incerteza do túmulo, no mais simples e vil féretro, para o mais indigno cadáver.
Despeço-me com um último pedido de perdão. Pelo jamais feito, pelo jamais concluído e, principalmente pelos inúmeros abortos que carrego na alma.]


MARCOS LOURES

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