FECUNDIDADE, O AMANHECER
O amanhecer repete o gosto do
desejo reprimido, repetido na boca doce da madrugada,no beijo dado na
esperança de uma aurora mais fecunda.
O gosto da vida inunda os
pastos, a lavoura, a alma, no pólen que se espalha, preso nas patas das
abelhas, no vento na explosão de fecundidade.
A avidez pela sobrevivência confunde pernas e penas, sêmen e sementes, espectros passeiam loucos, desvairados, orgísticos.
Num
místico canto, da terra emanam os sons do amor divino, num hino de
louvor ao nascimento, ao contínuo ato de amor, orgásmico e acalentador.
Das estranhas do solo, florescem entre poros, os olhos risonhos dos brotos e dos filhos;
Nesse
momento místico, o transe da terra, numa transa sem trâmites, sem nexo,
o sexo pulula, amanhece o dia e a vaga poesia invade tudo.
Transborda
por todos os cantos, num mantra, num cântico, entre tantas esperas, num
desesperado gesto, um incesto sem protesto, uma dança profusa, confusa,
abusa de tantas rimas e climas, atiça o desejo, sem beijo, sem traumas.
Na
aparente calma, um tornado em torno de todos e tudo, transita pelos
galhos, pelas folhas, voando nas borboletas, nas asas das libélulas, em
todas as células e gametas, cometas são estrelas da vida, dívida paga,
da vida devida, afaga e completa-se.
Nessa profusão de cores, de amores e de flores, nessa confusão bendita, neste solo acariciado, marcado por mãos divinas.
Nesse
néctar, ser poeta é fácil, vira vício, é o início da revivida manhã, da
sortida alegria desse dia, novo dia, novo canto, meu encanto, poesia...
O
cheiro do amanhecer me toma inteiro, nesse janeiro do meu país; em
busca da farra fantástica da igualdade, da brincadeira à esmo, do gosto
do torresmo, do cheiro da dama da noite, da distância do açoite, do
vento assoprando suave.
Da chave da felicidade, na feliz cidade, no gosto do beijo da história.
Na vitória inadiável, no amor incontrolável, na paz capaz de vingar.
No fim da noite sangrenta, no dia que arrebenta; que profuso, faz o cafuso sonhar.
Com o gosto da goiabada, o beijo da mulher amada, o cheiro intenso do café, da fé de saber-se imenso, maior que tudo, o mar...
Brasil, me abrasa teu rumo, chegaste, afinal ao prumo, agora ninguém te detém.
Nesse
louco cataclismo, o meu, teu socialismo, me traz teu novo refrão; o de
fecundar o solo, de transmudar todo poro de tua gente em perfume.
Agora,
atrás do teu lume, iluminando o continente, cheio de gente contente,
que atravessa por cordilheiras, por matas, abrindo bandeiras, atrás de
rica esmeralda;
Esmeras, pois és Eldorado, mundo mais que encantado, é tua a solução.
Para
se acabar com os soluços tantas vezes convulso, da triste América
católica, extropiada e frágil, agora, correndo ágil, em busca da
liberdade.
Da liberdade do solo que, na sua fecundidade transporta o belo amanhã.
MARCOS LOURES