domingo, 1 de agosto de 2010

43601 até 43700

001

Embaís este que deveras sonha
E busca algum alento, embora ausente
E quando nova queda se pressente
A face da mentira é mais bisonha,
Enquanto noutra senda esta alma enfronha
Apenas ilusão, e prepotente
Vacância no teu peito ora se sente
Diverso do que o canto em paz se ponha.
Agarro-me aos princípios mesmo que
O nada após o nada é o que se vê
Nesta contraditória vida a dois,
Se eu quero e não me queres, tu sonegas,
Andando em noite escusa, sempre às cegas
Sem ter noção do quanto vem depois.


002

O quanto eu te confesso ser errôneo
E ter apenas medo e nada além,
Enquanto a vida mesmo não convém
Expressa a cada ausência um pandemônio,
Gerasse dentro em mim novo demônio
Talvez ainda houvesse algum desdém,
Mas como da esperança sigo aquém,
Lavrando esta ilusão; tolo campônio.
Vestindo esta armadura sutilmente,
Minha alma tão somente se apresente
Sem ter sequer defesas, mas prossigo.
Apenas o silêncio; este aliado,
Presume os meus enganos do passado,
E adverte se inda vejo algum perigo.


003

Às mãos que com sobeja maestria
Pudessem transformar com um cinzel
A imagem mais sublime em raro céu
Aonde a luz intacta se irradia,
Vencer com tanta força a hipocrisia
E crer ser mais possível seu papel
Ousando acreditar num claro véu
Enquanto a noite desce mais sombria.
Não ser como deveras se apresente
Um ser que na verdade vejo ausente,
Mas sei quanto se estende ao infinito,
Perceba a ingratidão, mas não se cale,
Ao não se corromper jamais se embale
Na torpe solidez de algum granito.

004


Amar o que se vira noutras eras
Bebendo desta safra avinagrada,
É como se levar pela passada
Inverno procurando as primaveras,
Não vejo nem talvez o quanto esperas
Na sorte ao quanto fora consagrada,
A morte a cada passo desenhada
E dela se observando as mesmas feras.
Seguir é necessário e conseguinte
Momento que virá depois de um velho,
E quando a cada dia mais me engelho
Preparo para o passo além; seguinte.



005


Desnudas eras torpes dentro em mim
E vês o quanto fui e não soubera
Viver a provisão em mansa espera
Ousando a cada passo e botequim,
Vasculho meus pedaços, vodca e gim
E vejo retratada esta quimera
Aonde a própria vida destempera
E traz o apodrecer antes do fim.
Escuridões comuns de quem a anseia;
E sabe muito além, em senda alheia
O quanto imaginável, mas distante.
Dos bares e dos sonhos, meu naufrágio,
A vida com ser tosco e vão contágio
Expressa este cenário degradante.


006

Amante das riquezas e dos cobres,
No quanto nada eu tenho; um mero pária
A sorte de quem ama é temerária
E nesta fantasia não me cobres
Enquanto noutros sonhos te recobres
E vês em falsos tons a luminária,
Não servirei apenas de alimária,
Retorno aos meus anseios, meros, pobres;
E quando pude crer noutro momento
E ter desta visão discernimento
Eu percebera em ti a tosca gala,
Ausente destas rodas sociais,
Meus dias são decerto mais banais
E a voz quando o percebe, ora se cala.


007

O meu agosto; eu sinto se esvaindo
Levando em névoa e dor, o quanto resta
Não deixando antever sequer a fresta
De um tempo mais diverso, outrora lindo.
Expondo a minha face e me traindo
Não tendo outra visão, a que inda gesta
O passo noutra escusa, mais funesta
Aos poucos me perdendo em sonho findo.
Resumos entre gélidas paragens,
Assisto à viração destas aragens
E os meus caminhos; sei, são derradeiros,
Aonde pude outrora crer florada
Após o inverno eu sinto não há nada,
Eterno estio toma os meus canteiros.


008


Nevando dentro da alma de um poeta
Que tanto quis a sorte e não a vira,
O tempo se expressando já retira
O quanto desta vida não completa
E sigo sem saber sequer se há meta
A vida se expressando em vã mentira
Eu sei que a terra inteira ronda e gira,
Realidade pura e mais concreta.
Mas tanto quanto pude acreditar
Num tempo aonde ao menos o luar
Descesse em claridade soberana
Tocando a minha face em argentinas
Belezas, mas deveras determinas
A senda onde esta vida ora se dana.


009


Os pés já tão cansados; descaminhos
Os dias não seriam mais felizes
E quando se presume e contradizes
Os passos são decerto mais daninhos.
Errante caminheiro em vagos ninhos,
Olhando para trás meros deslizes
Acumulando enfim as cicatrizes
Tocado por momentos tão mesquinhos,
Aberto o peito adentro o quanto possa,
Sabendo no final a queda, a fossa,
Mas tento e até por isto merecia
A sorte bem melhor do que ora vejo,
Refém deste delírio em vão desejo,
Arcando com a turva fantasia.


010


Reanimar quem tenta após a queda
Seguir contra a maré mais furiosa,
Enquanto a própria vida se antegoza
Deste caminho aonde o passo veda,
E pago sem saber, mesma moeda,
Na sórdida presença caprichosa
Por vezes, não desminto, até dolosa
E assim cada passada se depreda
Arquétipo imbecil, tola vingança,
E quando este cenário vil se alcança
Resulto deste a quem inda alimento,
Um ser espúrio e digo até dantesco,
Perambulando escuso, ora grotesco
Num sórdido delírio virulento.


011

O quanto quis lirismo a cada verso
E o mundo sonegasse com as brumas,
Carcaça dos meus sonhos, tu te esfumas
E vagas pelas sendas do universo,
E quando neste insólito submerso
Esgoto o meu caminho, além tu rumas
E bebo as solidões, dores algumas
E nelas cada dia meu disperso.
Escória, pária, verme o que quiser.
Não tendo uma esperança mais, qualquer,
Esgoto aonde humana face exponho,
Um ledo vagabundo em noite pálida,
Esta alma sem destino, tosca e esquálida
Num corpo sem proveito, enfim, medonho.


012


Risível caricato eu sigo em hordas
E faço destas súcias meu abrigo
O quanto de mim mesmo não persigo
Espectro sem destino que inda acordas,
E vago em tais abismos, ledas bordas,
Existência traduz em si perigo
E as sombras dos meus erros eu consigo
Traçar entre os demônios que ora abordas,
Espúrio caricato; garatuja
Minha alma imensamente turva e suja,
Apêndice de vida, um ser vulgar,
Um cão jogado às pedras do abandono,
Encontro por consolo e como abono,
Os raios magistrais de algum luar.


013


Errático assassino da esperança
Não vejo mais futuro e sigo ao fim,
O tanto que apodrece dentro em mim,
Enquanto a vida ao nada ora me lança,
Meu sonho qual fiel desta balança
O risco se aproxima e vejo enfim
A morte que insolúvel vem a mim
E sinto no vazio esta fiança.
O rastro derramado pelas ruas
E nisto com certeza tu flutuas
Galgando a imensidão que nunca fora
Sequer alento ao menos para quem,
Já sabe do sombrio mar que tem,
Esta alma tão banal e sonhadora.


014


Apodrecendo os sonhos que inda trago
Abandonado aos cães e nada mais,
Somente bebo os fartos vendavais
E nesta solidão, enfim me alago,
Dos vermes no final, um manso afago,
Os dias se repetem, são iguais
Meus passos na sarjeta; tão banais
Se há sorte; inutilmente ainda indago.
Resquício do que fora um ser humano,
Agora quando espúrio enfim me dano,
Não quero e não preciso mais de alento,
Qual fora um animal, velho e sarnento,
O olhar sem mais sentido, quase insano
Trazendo o abençoado alheamento.


015

Das brumas e das névoas sou parceiro
E singro este vazio em noite escusa,
O passo pelas sombras se entrecruza
E canto com meu sonho corriqueiro
O encanto mais venal e verdadeiro
De quem em vida sórdida e confusa
Encontra em bela Morte sua Musa
E foge do rebanho, um bom cordeiro.
Nas tramas mais infaustas da mentira,
O quanto ainda resta se retira
E serve-se em banquete aos deuses vãos
Alheio aos vis detalhes desta empresa.
Prefiro na verdade ser a presa
Do que me esparramar em podres grãos.


016


Alhures vejo ainda um brilho opaco
Do quanto desejei e nada vinha,
A sorte com certeza mais daninha
E o passo sem destino, agora empaco,
Meu canto se perdendo mero e fraco,
A voz quando se escuta, é vã, mesquinha
E quando da mortalha se avizinha
Da vida já não levo nem um naco,
Apenas a mentira e nela encontro
A face desolada em desencontro
Apronto os meus caminhos neste errático
Delírio aonde possa ainda ver
O fim num nauseante apodrecer,
Sem ser digo a verdade, nem enfático.


017


Soltar a minha voz e a minha pena
Os dedos deslizando no teclado,
O quanto desejei e meu legado
Ao longe já puído e torpe acena,
Enquanto a realidade me envenena,
O vento noutra face, desolado,
Mergulho nos ditames de um passado
Na sórdida ilusão, soberba e plena.
Esculpo do meu nada; o novo ser
E sinto a cada passo o enternecer
De quem se fez poeta e nada mais,
À morte brindo em cálices sobejos
E quando dos meus sonhos, os desejos
Expressam seus caminhos, são venais.


018


Não quero mais falar de amores quando
O tempo se aproxima do seu fim,
A pútrida verdade no jardim
Não deixa qualquer sonho se notando
O quanto no passado, cultivando
Mortalha que cerzira cabe enfim,
Não quero nem demônio ou querubim,
Apenas decomposto, transformando.
Do mero ao nada ser, resta tão pouco
E vago sem guarida, fosse um louco
Derramo nas palavras o meu ego
A farsa de uma vida entregue ao não
E as sórdidas imagens que virão,
É tudo o quanto tenho e inda carrego.


019

Eu agradeço a ti a cusparada
Meus dias não seriam mais felizes,
E quantas vezes bebo as mesmas crises
Sabendo no final, não resta nada,
Somente a mesma face escancarada
E os olhos onde quieta; tu me dizes
Das tantas virulências em deslizes
Salpicas com espinhos esta estrada,
O escárnio num escarro traduzido
E tudo faz agora o seu sentido,
Não pude ou merecera melhor sorte,
E assim sem ter guarida nem promessa
Meu passo no vazio já tropeça
Restando tão somente o fim, e a morte.


20


Olhando neste espelho vejo a face
Já carcomida e podre da esperança
E quando no vazio a vida lança
Quem tanto na ilusão ainda grasse,
Resumo o meu delírio neste impasse,
E bebo sem saber furor e lança,
Não mais conceberia a contradança
Enquanto este cadáver já se enlace.
O manto denegrido em fantasia
A morte a cada instante mais sorria
E nela eu me redimo, estou bem certo
Um suicida, um louco, meramente
Na degradante face se apresente
O mundo que decerto ora deserto.



21


Enquanto tive Lara fui feliz,
A luz irradiando cada verso,
E nesta claridade um universo
Marcado pela força geratriz

Do amor que tantas vezes sempre quis
E nele cada dia mais imerso,
Ao seu caminho em sonho não disperso
E bebo a me fartar, querendo o bis.

Em Lara com certeza esta ventura
De um tempo aonde a sorte fora minha,
Felicidade além já se adivinha

Nem mesmo esta saudade vã, tortura,
Enquanto Lara havia dentro em mim,
O sonho parecia não ter fim...


22


Amar e ver estrelas quando passo
E tento adivinhar por onde andaste,
O sonho com temor, ledo contraste,
O caos que reconstruo e já desfaço,
Ausência dominando cada espaço
Até que ao te sentir, o velho traste
Renova-se e deveras mal notaste,
Clareias este mundo outrora baço.
E vendo a sutileza imensa e rara
Imerso nos teus braços, posso crer
Na doce fantasia de um prazer
Aonde toda a glória se declara,
Teu nome é como benção a dizer
Somente num sussurro, amada Lara.


23

Quem teve nesta vida o privilégio
De ter entres seus braços quem queria,
Tornando mais plausível fantasia,
Momento entre momentos raro e régio.
O amor supera tudo, e sendo egrégio
Expressa a cada sonho esta alegria
E nela a luz sublime se irradia
Matando qualquer medo ou sortilégio.
O quanto deste encanto se encontrara
Nos olhos delicados, bela Lara,
E agora esta lembrança me acalenta
Enquanto a vida molda outro cenário,
Um mundo bem melhor e imaginário
Minha alma a cada passo teu; atenta.



24


Amar e ter certeza de que possa
Vencer e ser além de mero sonho
O verso aonde o mundo recomponho,
Deixando no passado o medo e a fossa,
O quanto da ilusão meu canto apossa,
E cerzi este momento mais risonho,
Vivendo a plenitude onde me ponho
Na sorte que bem sei, somente é nossa,
E tendo em ti, amada o farto brilho,
Nos rastros que deixaste; Lara, eu trilho
E tento a cada instante perceber
A imensa claridade deste olhar
Farol intensamente a dominar
Resumo deste insano e bom prazer.


25

Porquanto em Lara tive a maior glória
De um tempo mais feliz, e não sabia,
Reinando dentro em mim a poesia,
Lampejo deslumbrante da memória,
A vida se refaz em nova história,
Mas guardo ainda viva a fantasia
E nela Lara sempre poderia
Trazer esta impressão: plena vitória.
O mundo muitas vezes é cruel,
E quando mais se tenta ver o céu
Apenas retornamos ao passado,
Aonde num momento, pelo menos
Os dias com certeza mais amenos,
O passo rumo à vida, iluminado.


26


Enquanto Lara fosse quem gerasse
Em mim toda a beleza em plenitude,
O canto que deveras nos ilude
Mostrando com ternura nova face,
Ainda que a saudade nunca passe,
Atinge com o tempo a magnitude
E nisto todo dia se transmude
E aumenta sem sentir o forte enlace.
E amei e fui amado. Isto me basta.
A vida entre loucuras, erma e gasta
Agora ao seu final, tenta e bendiz,
Embora devorado pelas cãs
As horas que eu vivera; nunca vãs,
Com Lara, pelo menos fui feliz.


27

A sombra deste amor que me acompanha
E gera mais amor, embora ausente
No quanto de teu corpo se apresente,
Acima de qualquer grande montanha,
Persiste viva em mim a antiga sanha,
E o coração se torna mais contente
Ao perceber que ainda mesmo sente
Vontade sem igual, tanta e tamanha.
Viver a plenitude deste instante
Aonde o que desejo se adiante
E molde com ternuras muito além
Do quanto ainda vivo em Lara, morta,
O vento sorrateiro em minha porta
Avisa que ela um dia ainda vem.


28


Jamais pude esquecer quem tanta vez
Tomando minhas mãos e o pensamento
Trouxera na verdade mais que alento
O todo quanto existo e nisto vês
Presença desta insana lucidez
Gerando a cada dia um sentimento
Diverso do que fora o sofrimento,
Que aos poucos dia a dia, se desfez.
E tê-la viva em mim é o quanto basta,
Purificada imagem ora casta
De quem se fez tão louca quão profana,
O amor não mais calando a voz declara
Enquanto o coração jamais se engana
E volta a te clamar, sonhada Lara.


29

Dos erros cometidos nesta vida,
Engodos onde tanto me perdi,
Voltando num momento chego a ti
E ali eu encontrara esta saída,
A sorte muitas vezes aturdida,
O tempo na verdade conheci
Depois na dura ausência, viva aqui
De quem se fez em glória, rara e ungida
Amar é simplesmente eternizar
Gerando do vazio algum altar
E nele entronizado um ser diverso,
E quando penso em Lara, a minha história
Revela finalmente a imensa glória
Sobejo caminhar por onde verso.


30


E Lara ainda existe, disto eu sei.
O quanto me perdera e consegui
Vencer os meus temores e eis-me aqui
Vagando sem sentindo em sua grei,
O quanto deste instante desejei
E dele cada gota enfim sorvi,
O amor que desejara e o mereci
Expressa tudo aquilo que eu busquei,
A morte me redime, com certeza
E nela ao seguir a correnteza,
Com Lara novamente do meu lado,
O sonho noutro sonho determina
A eterna sensação da incrível mina
Aonde o amor se faz sedimentado.


31

Porquanto em tantos claustros a minha alma
Esboça ao menos mera reação
E sinto a cada passo a indecisão
Que gera novamente medo e trauma,
Pudesse algum momento em plena calma,
Mas sei que novos dias não virão
Trazendo com ternura a solução
E nela a maciez que tanto acalma,
Vagando sem saber se existe um porto,
Apenas este ser que semimorto
Aborta as esperanças, cada vez
Que a vida se transcorre em agonia,
E o pânico deveras regeria
O infausto desenhar que agora lês

32

Enquanto tento ao menos amurar
As velas onde o mar se faz insano,
Encontro a cada ausência o desengano,
Não tendo nem sequer onde ancorar,
Imensidão tomando este lugar
E nele em todo engodo enfim me dano
Um dia me pensara soberano,
Porém a morte chega devagar
E bebe cada gota deste que
Pensara resistir, mas nada vê
Somente este naufrágio e nele tento
Seguir a minha história calmamente,
No quanto do vazio se apresente
Apenas bebo o sal do desalento.


33


Despregam-se do olhar as mais diversas
Belezas onde um dia acreditara
Pudesse ter somente em tal seara
As horas mais felizes. Desconversas.
E quando noutras tantas vejo imersas
A vida sem sentido se prepara
E o corte na verdade, o sonho apara,
E nele sem saber ainda versas.
E resolutamente encontro o fim,
Marcando a ferro e fogo o que há em mim,
Deixando para trás qualquer momento
Aonde possa até acreditar
Nas tantas maravilhas deste amar,
Porém agora singro o esquecimento.


34


Entranhas que aprofundas quando sonhas
Expressam o vazio de teu ser,
O quanto pude mesmo esmorecer
E ver as faces turvas e medonhas,
Enquanto a cada passo mais te oponhas
E vivas sem sentir o que é prazer,
Ao longe num dorido entorpecer
Encontro as dores toscas e bisonhas,
E sinto apenas isto, este vazio,
E nele cada verso desafio
Tentando acreditar noutro segundo
Aonde poderia ter à frente
O sonho e nele mesmo ainda tente
Cerzir com esperança um novo mundo.


35

Com toda frialdade de quem vem
E bebe desta gélida loucura,
O tanto que minha alma se amargura
Sabendo no final, venal desdém,
O nada quando em nada se convém
Resume o meu caminho e na tortura
O medo de seguir, diz sepultura
E o corte se aprofunda e sigo aquém.
Ocaso desta vida em dores feita,
Minha alma este final, logo rejeita
E sabe muito bem do quanto pude,
Viceja dentro em mim alguma messe,
Mas sei que no final tanto padece
Quem mata eternamente a juventude.


36


Floresces as sementes que este Cristo
Deixara por legado, mas agora
A própria criatura que o devora
Traduz este vazio aonde existo,
E quando a tal loucura inda resisto,
O barco noutro cais em dor se ancora
E sinto a solidão, nada se aflora
Somente este terror, mas não desisto
Um canto libertário que aprendi
No amor quando demais, existe em ti
A divindade plena e não discuto.
Mas sei do quanto pode em inclemência
Exposto à mais satânica ingerência
O manso se tornar atroz e bruto.


37


Não creio em santidade feita em ritos
Aonde são diversas as facetas,
No passo se desenham as falsetas
E geram seres torpes e infinitos
Aonde se produzem mais aflitos
No quanto tantas coisas tu prometas
As sortes variadas são cometas
Gerando do vazio os tolos mitos,
Resumo o meu caminho em tal descrença
E sei que na verdade ainda pensa
Quem ama numa luz imaginária,
Mas sei do meu silêncio após a morte,
E nada necessito que conforte
Tampouco esta imprecisa luminária.


38


O campo se fizera santo quando
Pisado por quem sabe lá quem era
Enquanto no final, a torpe fera
Cordeiros todos mansos, devorando.
O olhar de quem morreu sacrificando
Durante a mais dorida e triste espera,
Ao ver quanto é tenaz quem se tempera
No caos quando em verdade o vê gerando.
Floresce dentro em mim outra verdade
E nela a mais possível santidade
É feita com ternura e compaixão,
Se milagrosamente existe a vida,
Outro milagre a mais? A alma lapida
Gerando tão somente a corrupção.



39


Glorificar a vida é simples quando
O amor se mostra claro e sem tormentos,
Mas quando vejo em mim tais sofrimentos
E o mundo num instante desabando,
Os sonhos se perdendo em tosco bando,
A terra revoltosa em elementos
E neles os meus dias, excrementos
Quem sabe noutro infausto mergulhando.
À morte um brinde eu faço e até por isto
No quanto ainda tento e em vão persisto,
Distante desta paz que alento em vida,
Redime cada passo num tropeço,
E traz no cadafalso o que eu mereço,
Benesse desejada e já pedida.


40


A tumular presença de quem sonha
E bebe dos seus féretros benditos,
Enquanto se imaginam infinitos
A face após a morte; eu sei, medonha.
Por mais que em fantasias eu me oponha
E trace em ilusões diversos mitos,
Inúteis na verdade, medos, gritos
Aflito caminheiro o nada enfronha.
Ascendo ao mais sublime que inda existe
A morte se apontando agora em riste
Esvai a cada ausência esta esperança,
Fugacidade em forma de excrescência
Do fim eu tenho viva a consciência
À pútrida verdade a vida lança.


41


Se pensas que és cristão somente quando
Tu cumpres teus deveres sociais
Nos dízimos, igrejas, rituais
Ou mesmo quando tentas, perdoando,
Se pensas só nos prêmios, és nefando
E nisto teus destinos, infernais,
Derramas sobre todos os venais
Enquanto ensimesmado estás louvando.
O ser cristão é crer na libertária
Cotidianamente e ainda ver
O podre ser humano e o bem querer,
Sabendo que a rapina procelária
Não vale nem sequer alguma prece,
Porém a alma liberta se oferece.


42

Não compro o meu perdão e nem o vendo,
Apenas perdoar por perdoar
Sem nada a dever nem a pagar,
Jamais acreditar em dividendo.
O quanto de algum ser, tosco remendo
Esboça sem sentir o quanto amar,
E tenta desta forma se livrar
Deste futuro amargo, vil e horrendo,
Não quero ser deveras deste jeito
E tento imaginar enquanto deito
Um mundo mais tranqüilo onde a verdade
Supere quaisquer medos e desvios,
Meus sonhos são deveras desvarios
Enquanto a falsa crença nos degrade.


43


Apresentar a Ti novo rebanho?
Espúria forma mesmo de Te amar,
O quanto é necessário libertar
Para se ter na vida imenso ganho,
E quando a realidade; em Ti entranho
Aprendo com certeza a consolar
E vejo em cada ser um Teu altar
E sinto em minhas costas cada lanho.
Quem crê noutro momento aonde possa
Erguer da mais dorida e escusa fossa
Quem nela se adentrara, evangeliza,
Rebanho? Na verdade isto é venal,
Tratar o tão diverso como igual
É misturar tempesta com a brisa.


44


Tu podes muito bem negar o fato
Enquanto pensas ser melhor, porém
O quanto do demônio te contém
É mais do que talvez o teu retrato,
E quando no vazio eu não resgato
E sigo da verdade muito aquém,
Tentando acreditar que faço o bem
Enquanto com certeza eu já maltrato,
A sórdida e terrível negação
Da liberdade viva de um cristão
Impede que se chegue ao carpinteiro,
Nefasta imagem tosca em pastoreio
O lobo em falsa luz quando o rodeio
Exponho sem defesas, o cordeiro.


45


À juventude morta estes meus versos,
Uma homenagem póstuma a quem tanto
Achara ser sublime o desencanto
Gerando sem sentidos, universos,
São trôpegos tropéis, tanto dispersos
E neles afigura-se o quebranto
E quanto mais em bando mais me espanto
Do quão são mais capazes, tais perversos,
Brindando à mocidade entorpecida
E tanto quanto atroz já desvalida
Jogada pelas ruas, ébrios passos,
Falsários sonhadores? Mero esgoto,
Desenho de um canalha torpe e roto
Nos olhos sorridentes, porém baços.


46


Às vezes vejo o sol, e até permito
Um sonho que inda possa ter à frente
No quanto do vazio se apresente
Gerando a cada passo um novo mito,
Simbólico fantoche, no infinito
O olhar sem mais sentido, qual demente
No fundo se transforma e meramente
Transcorro neste torpe mar, aflito.
Esbarro nos meus erros costumeiros
E tento nos demônios, meus luzeiros.
Satânica presença que eu carrego,
Nublosa noite eu vejo após a queda
E quando a minha vida em vão se enreda
Eu agradeceria então ser cego.


47


A chuva se transborda dentro da alma
E o quanto em nebulosas tardes vejo,
A morte insofismável de um desejo
Aonde nem o medo mais me acalma
Revejo o meu caminho e tento em calma
Aproveitando assim a cada ensejo
Fugir deste terror, mas relampejo
E a vida se refaz em turvo trauma.
Medonha face exposta aonde um dia
Bebera a mais fantástica alegria
E nada mais voltara a ser igual,
Mas quando me preparo, esta alma voa
Retorno ao mesmo nada e sigo à toa
Num erro costumeiro e até venal.

48


Minhas idéias; vejo-as tão confusas
E sinto que se esvai a realidade,
No outono este invernal terror invade
Enquanto sem sentires entrecruzas
Os passos entre as pernas e conduzas
À queda inevitável que degrade,
Matando desde então felicidade
Em faces tão banais, turvas e obtusas.
Expresso em verso e som o que pudera
Talvez apascentar ainda a fera
Atocaiada em mim desde que humano.
Na sordidez de um mundo em desafeto,
O quanto sou apenas um inseto
E vago sem sentido e enfim me dano.


49


Emprego a minha voz ao quanto pude
Tentar aliviar a minha eterna
Loucura quando aquém de uma lanterna
Esboço a invalidez em atitude,
Atinjo sem sentir a plenitude
Da morte que deveras já se interna
E bebe cada gota da cisterna
Enquanto vez por outra ainda ilude.
Esparsa cena vivo a cada dia,
E nela novo tempo não teria
Senão a mesma espúria insensatez,
Cardápio em iguarias tão nefastas
Das pútridas verdades tu te afastas,
Mal sabes que refletes o que vês.

50


Inundações enquanto eu quis a paz,
O risco que se assume quando tenta
Vencer em calmaria esta tormenta,
Inevitavelmente o mundo a traz.
Deixando esta semente para trás
O quanto do passado me alimenta,
E bebo desta face virulenta
Num átimo, um sorriso quase audaz,
Edênico caminho? Eu não mais quero,
Prefiro o delirar e mesmo fero
Arcar com meus engodos; sendo assim
O precipício aberto sob os pés
O olhar já desmedido e de viés
Traduz o que inda resta dentro em mim.


51


Todos os rumores que ainda poderia
Ouvir em plenas tardes de abandono,
E quando da verdade não me adono,
A sorte se transforma, mais sombria,
O tempo transcorrendo em heresia
O risco a cada passo e desabono
Enquanto a solidão impede o sono
Nefasta realidade se veria,
E quanto mais servil pudesse ser
Expresso em tons sutis à meia luz
E sei que no vazio se produz
Apenas tão somente o desprazer.
Mergulho neste hermético delírio
E sorvo a cada infausto, outro martírio.

52

Em frívolos desenhos vejo a vida
E nesta face escusa da verdade
O tanto que deveras já degrade
Demonstra a mesma fúria carcomida
Resvalo no vazio e a sorte acida
Gerando o que pudesse em tempestade,
Ausente deste olhar, felicidade,
A morte a cada passo sendo urdida.
Regando com meu sangue este plantio,
A cada novo dia eu desafio
A própria insanidade e me tomo,
Num átimo vagando em desatino,
E quando em solilóquio determino
O medo incontrolável; nada domo.

53

Quisera conhecer minhas ermidas
E nisto desvendar os meus entalhes
E quando os meus demônios já detalhes
Expressas sem sentir as quantas vidas
Ainda restariam, despedidas
Em farsas onde arrisco em vãos encalhes
E a cada nova queda mais retalhes
As sortes enjauladas e feridas.
Esgoto o meu delírio a cada verso
E tento enquanto posso ou desconverso,
Complexo caminheiro do meu tempo,
Assaz insatisfeito, pois hedônico,
O quanto deste mundo desarmônico
Traduz ou contratempo ou passatempo.

54


Qual fora Madalena em sua senda
A sorte desairosa de um perdão
Expressa noutro impasse a negação
Aonde cada passo não se estenda,
A mão que apedrejando não desvenda
Nem mesmo se entendendo esta lição
Ainda se propondo, algum sermão,
Enquanto na verdade não se atenda.
A morte não redime seus pecados,
Tampouco os dias seguem sendo herdados
Renovação é feita e o novo Cristo
Do amor sem ter medidas, libertário,
Invés do velho algoz, frio corsário
Do qual há tanto tempo já desisto.


55


Passando pela estúpida canalha
As mãos atadas; vejo apenas isto
E quanto mais alheio ainda insisto
No vento sem limites que se espalha
Qual fosse fogaréu em plena palha
A mão que me condena, também Cristo
Sentira com terror, e não desisto,
Minha alma aprisionada inda batalha.
No quanto quero apenas a verdade
E nisto se traduz em liberdade,
Meu pensamento alcança além do cais,
Mas morto em plena vida, se me calas
Jamais estas palavras são vassalas
Nem mesmo os meus destinos são boçais.


56


Do quanto em desventura se provasse
Talvez já redimisse cada engano,
A vida se revela em novo plano
Mostrando com terror a dura face,
E quando se vencendo algum impasse,
O medo se transforma e já me dano,
Negando a solidão eu me profano
Na farsa sem medida que inda grasse.
Desgraço-me ao sentir a salvação
Que é feita muito além de algum perdão,
E traz sem ter medidas o meu sonho,
A podridão humana, eu reconheço,
E sei deste satânico adereço
Num ar torpe, sacrílego e medonho.


57


Buscar após a minha sepultura
A vida que jamais mereceria,
O tanto quanto fora em heresia
A sorte sem remédio, busca a cura.
E tanto se perdendo, inda procura
Além a mais nefasta parceria
E o quanto disto tudo mostraria
A face mais atroz de uma loucura,
Ao menos poderia ser diverso
Se o mundo ao desnudar enquanto o verso
Trouxesse pelo menos o perdão,
Mas vejo inconfundível Satanás
Na ausência do caminho em plena paz.
E sei das tempestades que virão.


58


Não quero a redenção somente por
Saber que existiria alguma messe
A quem na própria vida, o fim já tece
E traça o seu caminho em desamor.
Não quero nem tampouco este louvor
Ao exaurir em mim oração, prece
E quando o meu anseio ora se esquece
Fazendo deste irmão, ledo senhor.
Rompendo com algemas tão banais,
Em vestes ricas, belas, sociais
Cerzindo em seus altares ouro e prata
A fúria desdenhosa de quem rege
E vende a santidade, torpe herege,
Enquanto a quem se louva, já maltrata.

59


A piedade move a pedra escusa
E traz mesmo ao Granito a mansidão
E quando se entregar de coração,
A vida não será jamais confusa,
A divindade em ti conhece e abusa
Ousando até na dura tentação,
Sabendo dos momentos que virão
Aonde em desafeto se entrecruza.
A pútrida versão dos sacerdotes
Pensando na certeza em ricos dotes,
Esgota o que pudesse haver de Cristo,
E sendo mais vendida a própria cruz,
À liberdade em vida não faz jus
Quando em dourada veste eu me revisto.


60


Esposar com amor a redenção
De quem se fez bem mais que mera cruz,
Ao ver já vivo em mim, caro Jesus,
Entendo em ti a grã libertação
Esboço feito em luz; dita o perdão,
Amor extasiando e nisto eu pus
O sonho mais sublime feito em luz,
Bem mais do que qualquer prece e oração,
A cada novo dia se trazendo
No amor sem procurar um dividendo
Assim é que concebo a glória em Ti,
Diverso do que tanto me ensinaram,
Aqueles que de Ti se apoderaram
Matando o que em verdade conheci.



61


Banhasse em tantas dores o meu rumo
E nada mais pudesse além do caos,
Os dias na verdade seguem maus,
E os meus momentos toscos, eu resumo,
E como se pudesse em frágil fumo
Ou mesmo me elevar, ledos degraus
Vagando sem destino nestas naus
Aonde com terror perdera o prumo.
Esparso caminheiro do vazio
E neste passo além inda porfio
Ousando contra a fúria das marés
E sei que em discordância sigo alheio
E quando a solidão, eu devaneio
Encontro com certeza por quem és.


62


Um sepulcral silêncio me atordoa
E sinto a solidão de quem buscara
Apenas mansidão nesta seara
E vaga sem destino, segue à toa,
A voz em solilóquio não ressoa
E o canto semeando a velha escara
O tempo na verdade não prepara
Minha alma sem sentido, não revoa.
Esculpo alabastrina imagem tua,
E quando me percebo em plena rua
Assisto à derrocada terminal,
Dos sonhos onde pus minha esperança
E quando no insensato a vida avança
Encontro tão somente o funeral.


63


Apenas pretendia um tempo aonde
A sorte em concordância com o brilho
Trouxesse esta alegria em estribilho,
Mas nada na verdade corresponde
E o tempo sem sentido não responde
A quem pudesse crer, este andarilho
Vagando em solidão, porquanto eu trilho
Nefasto desenhar onde se esconde
Minha alma em tal feroz tenacidade
E quando apenas sinto o quanto agrade
À morte esta inconstância e nela eu cevo
O templo em sordidez, melancolia,
A solidão deveras reinaria
Tornando o sofrimento mais longevo.


64


Potência entre as potências, este amor
Clamando pela imensa liberdade
E traz no seu caminho a claridade
Difícil discernir em tal torpor,
Não vejo apenas isto, um bom Senhor
E nele tão somente a majestade,
Enquanto bem mais alto ainda brade
Tramando um canto claro em riso e dor.
Somente uma verdade nos transforma,
E quando a realidade toma a forma
Da qual ninguém consegue mais conter,
O amor imensurável; passo a ver
E nele a redenção tanto querida,
Transcende com certeza à própria vida.


65



A causa original, etérea essência
A força geratriz deste universo
Se nele o pensamento agora eu verso
Não vejo tão somente onipotência
Bem mais do que decerto uma clemência
Ou mesmo um caminhar até disperso,
O quanto além do além maior, diverso
Gerando mais que mera coincidência
O que sempre já foi e assim será
No quanto posso crer e estará lá
Após o próprio fim da humanidade,
Eterno e desta forma mais mutável
Perene enquanto traça um formidável
Caminho aonde nada inda o degrade.

66


A miseranda face deste que
Pensara ser superno enquanto eu sei,
Apenas um espectro em larga grei
Menor do que deveras já se vê,
O ser em plenitude que ora crê
E tenta ser senhor da própria lei
No quanto em pequenez eu não verei,
Somente em prepotência se revê.
Alheio ao quanto vale o ser humano,
Propaga sobre a Terra inteira um dano
Do qual já não consegue controlar,
Um histrião bisonho um mero e escasso
Caminho sobre a face mais gentil,
Aonde sem tal mérito se viu
Deixando demarcado o turvo passo.

67

Justiça? Não conheço e nem percebo
Apenas a vingança a cada olhar,
O mérito em demérito a moldar
O amor como se fosse algum placebo,
E quando do vazio eu já me embebo
Sorvendo sem destino nem lugar
O quanto poderia mergulhar
Devolvo da maneira que recebo.
Um egoísta e mero caricato
Na dor que agora causo eu já resgato
Esta ínfima figura, um mero entalhe,
E tento acreditar nalgum poder,
Enquanto na verdade posso ver
A mão que em plena fúria ora retalhe.


68


Errôneo contumaz, farta penúria
Exposta a cada dia e sem clemência
Aonde se pintara em indulgência
Gestando a toda lei a mesma injúria.
O corpo desenhado em tal incúria
Ainda se presume com potência
Gestando sem sentido a incoerência
Pagando o alheamento com vil fúria.
Esgarça a carne podre que consome,
E nisto mata sempre a sua fome,
Gerando outro cadáver com fartura,
E tenta amenizar em culto ou missa
Esta alma sem valia e sempre omissa
A geratriz terrível que amargura.

69


Como se um Deus fosse; esta canalha
Vagando sobre a Terra traz no olhar
A fúria que não pode controlar
E a cada novo instante mais batalha,
Na fome que deveras gera e espalha
A morte como fosse o seu altar,
Ainda a própria história a renegar
No fio mais temido da navalha,
Agora este rebanho em tom cruel
Aspira qualquer coisa como um Céu
E mata sem perdão e sem amor.
Escravizando assim quem já se opõe
No quanto ao próprio Deus, pois decompõe
Fazendo deste escárnio o seu louvor.


70


Um ser tão descuidado e até medonho,
Num átimo mergulha em tez sombria,
E mata o criador, soberba cria
Aonde a cada ausência o decomponho,
E sei do quanto sou triste e bisonho
Tentando me integrar em senhoria
Marcando com a férrea hipocrisia
Enquanto à santidade agora enfronho.
Um mero e traiçoeiro lobo brilha
Teimando em ser o chefe da matilha,
Saqueio enquanto estupro roubo e mato
Depois peço perdão pelos meus erros,
Cerzindo com terror os vãos desterros
A cada louvação; um desacato.


71

Aumentando o tormento quando vejo
O sonho se esvaindo sem saber
O quanto deste encanto pude ter
E sei ser mais disperso a cada ensejo
Do amor apenas sinto este lampejo
E mergulhando em vão nada a prever
Somente este vazio a entorpecer
Gerando a solidão, temor e pejo.
Ainda pude até imaginar
Um canto aonde eu possa desenhar
O dia desejado e nunca visto,
E tendo tão distante dos meus dias,
A dor que agora teimas e desfias
Aonde a solidão eu mal despisto.


72


Falando agora em ti eu tento além
Do quanto nada resta e mesmo assim
Procuro algum sinal dentro de mim
E sei que na verdade nada vem,
Meu sonho desvairado segue aquém
Do todo procurado e sei que enfim
Apenas o vazio diz do fim
Encanto imaginário, e nada tem.
Somente o medo e nele se apresenta
A vida tão sofrida em tez sangrenta
Esparso caminhar pela sombria
Noctívaga loucura que me entranha,
Prossigo desta forma a minha sanha,
Buscando o quanto sonho e nada havia.


73


Murmuro tão somente o quanto amor
Pudera acalentar e nada disto
Persiste enquanto o sonho; ainda avisto
Gerando a cada ausência o dissabor.
Pudesse acreditar e sem me opor,
Mas quanto mais eu luto enfim desisto
Sabendo que deveras quando insisto
Jardim já se perdera em triste cor.
Poética manhã de um ledo sonho
Enquanto na verdade ainda ponho
Meu barco no oceano em turbulência,
Do tanto que pudera e nada fiz,
O sonho se transforma em cicatriz
E amor, apenas mera e tosca ausência.


74

Perfume de teus lábios? Nada resta,
Somente a solidão e esta mortalha
Que aos poucos neste céu, domando espalha
O quanto do passado fora em festa
E agora esta figura vã, funesta
Aonde a podridão dita a batalha
Cerzindo com terror esta navalha
E o odor deste vazio um ar empesta.
Restando do que eu fora, meramente
Um torpe caminhar que se apresente
E denegrindo aos poucos minha vida,
Persisto tão somente por saber
Que após a tempestade possa haver
Bonança, mas bem sei não há saída.

75


A flor que em palidez perdera o viço
Deixando a primavera em invernal
Caminho diz do meu ledo final
Num sonho mais temido e movediço,
O quanto da esperança inda cobiço
E vago sem saber do meu final,
Tropeço neste rito terminal
E sei do meu delírio em ar mortiço.
Apenas coletando cada folha
Da estúpida verdade que se colha
No olhar de quem buscara um horizonte
Sem nada nos meus dias, desalento,
Ainda na esperança eu me alimento
Embora saiba ausência que se aponte.


76


Sentindo quanto há vivo no meu sonho
Eu tento discernir a realidade,
Porém a cada instante mais degrade
Gerando dentro em mim um ar medonho,
E quando um novo dia eu me proponho
Apenas encontrando a tempestade
Nefastas ilusões, porquanto brade
E o canto se perdendo em tom bisonho,
Audaciosamente acreditara
Na paz e nada vendo em tal seara
Escória simplesmente e nada mais,
A mera solidão, amiga entranha
Nesta alma tantas vezes tão estranha
Em erros costumeiros, viscerais.

77


Num delirante gozo em noite escusa,
Bacante melodia e nada existe,
Apenas o vazio inda persiste,
Enquanto a solidão, ainda abusa,
Meu passo numa senda mais confusa
O olhar apodrecido, mero e triste,
Meu canto sem sentido inda resiste
A morte redimindo, bela Musa.
O gesto incoerente de quem ama,
E bebe do tenaz, terrível drama,
Retalha com firmeza a pele e abrasa
O quanto ainda resta de esperança
Ao nada e sem sentido enfim se lança
Em cera construíra frágil asa.


78


Delíquios desairosos quando eu tento
Seguir os passos desta a quem dedico
Meu verso e na verdade exemplifico
O amor como se fosse mais atento,
E quando num fremir, o pensamento
Detalha cada passo mal explico
Atinge num segundo, o cume e o pico
Nos sonhos firmo meu acampamento.
Vislumbro etereamente um mar imenso
E quando mergulhando me convenço
Das praias e sirenas que imagino,
Porém tão movediço o meu destino
E sinto quanto frágil possa ser
Os ritos inconstantes do prazer.


79


No fogo inesperado da paixão,
Ardências entre tantas mil loucuras
E quando explicações teimas, procuras,
Somente esta resposta em negação,
Os dias mais sombrios que virão
E neles as terríveis amarguras,
Enquanto em vão proponho-te ternuras
Meu cais já não comporta a embarcação.
Mesquinhos dias noites solitárias,
As dores dos amores, procelárias
Invadem e destroçam qual tornado
E o tempo se esvaindo entre meus dedos,
Erráticos cometas morrem ledos,
São sombras do que eu fora no passado.


80

Em álgicos tormentos, biliares
Humores discrepância: sonho/vida
Aonde a minha sorte fora urdida,
Deveras tu nem mesmo amor notares,
E quando vi somente vãos altares,
A história se percebe consumida
Na angústia tantas vezes presumida,
Errático eu vagueio pelos bares,
E na aguardente encontro o teu olhar
Risonho este delírio a me tocar,
E bêbado entranhando no infinito,
Estrelas consumindo num absinto
E o beijo; desenhando, agora o sinto
E mesmo inexistindo inda acredito.


81


São tantas estas mágoas que carrego
De tempos onde a vida não teria
Sequer a menor sombra em fantasia
Marcando com terror onde trafego
E busco no meu eu, adentrando ego
E sinto a mesma imagem mais sombria
Do amor que tantas vezes poderia,
Porém já tão cansado agora eu nego.
Vencido pelas ânsias de quem sonha
E sabe a vida atroz, tola e bisonha
Aonde se entranhara inutilmente,
Cerzindo esta mortalha dentro em mim,
Sentindo o meu caminho hoje no fim,
Apenas a saudade me alimente.


82


No mundo um passageiro da ilusão
Galgando as amplidões e nada tendo,
O olhar se apresentando qual remendo
Traduz as noites frias que virão,
O medo se tornando desde então
Apenas um tormento a mais e horrendo
O quanto do vazio em mim desvendo
Negando qualquer sorte em provisão.
Esparso caminheiro, a fantasia
Gerindo cada passo, não mais guia
E leva para o fim quem tanto quis,
Um andarilho em busca de algum porto,
A vida sem saber de amor, conforto,
Gestando e ora gerando a cicatriz.


83


A voz de um ser deveras torturado
Gemidos espalhando noite afora,
A dor que me atormenta e me devora
O dia novamente mais nublado,
O risco de sonhar, desalentado,
O medo que destarte desancora
E o corpo sem descanso, não demora
A morte um raro bem tão desejado.
Essencialmente quis alguma luz,
E o manto em tal negrume se produz
Enlutando minha alma sem guarida,
Aos poucos me perdendo do horizonte
Apenas o vazio além desponte,
Marcando em virulência a tosca vida.


84


Quem dera se pudesse inda senti-la,
O amor já me condena e nada tendo,
Apenas o caminho se detendo
Aonde a solidão, leda, desfila,
Minha alma em fel e mágoa hoje destila
O quanto poderia em estupendo
Desenho, hoje perfaz mero remendo
O sonho, este demônio agora grila.
Restando do passado uma promessa,
Mas quando na verdade se tropeça
E a queda prenuncia o fim e a morte,
Ao menos isto quando acontecer
Trará na remissão, algum prazer,
Que enfim depois de tanto me conforte.


85


A dor que me alimenta seja apenas
Sinal de outro momento em tal bonança,
Mas quanto mais o tempo ledo avança
As horas não se vêm sequer amenas,
E quando a cada ausência me apequenas
O sonho num vazio já se lança
Aonde poderia em temperança
Tu vens e com terrores me envenenas.
Mordazes dias trazem leda noite
E a solidão deveras mais açoite
Esta alma em frialdade e em negação,
As mágoas são constantes nos meus dias
E delas outras tantas criarias
Sem permitir nos sonhos mutação.

86


As sombras que acompanham cada passo
Deste imbecil que tanto quis amar,
E o vento novamente a me tomar,
Gerando a cada instante o descompasso,
E quando alguma luz, buscando; eu traço
Pudesse crer além nalgum luar,
E sei que nada vem e no vagar
A cada movimento eu me desfaço,
Disfarço vez em quando e até sorrio,
Assim se demonstrando um desafio
Enquanto alma sombria nada diz,
Somente se percebe o lacrimejo
No encanto quando além ainda vejo
Dos sonhos esta espúria cicatriz.

87


Sonhar com liberdade que não veio,
Andar sobre estas ondas e poder
Sentir deste desejo o bem querer,
Olhando para os lados, sigo alheio.
E quanto mais mergulho em devaneio
A queda dominando todo o ser,
E assim a cada passo me perder
Na ausência de esperança e sem esteio.
Na queda anunciada há tantos anos
Somente coletando os desenganos
Entoam dentro em mim tristes acordes,
E quando do passado não recordes
Expressas num sorriso esta ironia,
Matando qualquer luz que inda teria.


88


A quem se disse tudo e na verdade
Jamais alguma voz escutaria,
A noite se apresenta imensa e fria,
Olhando para trás, o medo invade,
E o risco de sonhar; ansiedade
Que o tempo por si mesmo levaria,
A morte na verdade redimia
Quem tanto conhecera a frialdade,
Esboço mal traçado e maltrapilho
Enquanto no vazio inda palmilho
Permito-me sonhar e isto me basta,
Minha alma em penitência e sofrimento,
Ainda qualquer luz teimando invento,
Porém realidade é vã; nefasta.


89


Ousar na inspiração de amor sincero
Enquanto na verdade nada vinha
Somente a solidão, e sei que é minha
E nela o meu caminho eu destempero
O rumo onde o nada ainda gero
A sorte tantas vezes mais daninha,
O corte se aprofunda e jamais tinha
Senão este sentido doloso e fero,
Apresentando ainda o quanto é rude
E tento caminhar, mas tanto ilude
O passo de quem faz um verso assim,
Profética loucura me tomando
O dia que julgara ameno ou brando
Satânico chegando a um triste fim.


90


Pudesse reunir num verso apenas
O tanto que sofrera e nada tenho,
Apresento este medo e o mais ferrenho
Caminho e se tu calas; já condenas.
Expresso o delirar e não serenas
A cada novo dia mais desdenho
A sorte aonde outrora em ledo empenho
Trouxeste estas palavras mais amenas.
Resido no que há tanto já não há
O sonho se escondera e desde lá
O manto discernira em férrea senda,
Só peço que deveras tu me esqueças
E assim novo futuro; em paz, já teças
Apoio? Só a morte a mão estenda...



91

Andando pelo mundo sem saber
Aonde possa ainda ter um porto,
Apenas um retalho, um vago aborto
Vestindo a turva face em desprazer,
Emirjo do vazio e nada tenho
Senão a solidão por companheira
E quanto mais a sorte não me queira,
Maior o meu delírio, e mais ferrenho,
Audaciosamente procurara
Durante tanto tempo a solução
Ouvindo a vida inteira o mesmo não,
Somente a gelidez nesta seara,
E o quanto deste encanto inda matizo,
A vida traduzira por granizo.


92


O sonho de quem ama e quer a paz
Envolto pelas sombras do passado,
Aonde no desenho imaginado
O traço na verdade nada traz
Senão a mesma espúria e tão mordaz
E caricata cena, o meu legado,
Ao tanto do que tenho desvendando
No fundo tão somente um passo audaz.
E sinto a desmedida solidão
Num ermo que caminho desde então
Sem ter um norte aonde possa enfim,
Depois de tantos anos, sem ninguém
Cansado do não ser e nada vem
Somente este delírio vivo em mim.


93

Crucificar o sonho será justo?
Não posso acreditar em tal falácia
E tento, na verdade com audácia
A vida a qualquer preço, a qualquer custo.
O risco de sonhar ainda alenta
A quem se fez poeta e merecia
Apenas ter no olhar a fantasia,
Embora a sorte seja tão sangrenta,
Expresso esta temida noite em vão
E sorvo cada bruma que inda enfrento,
Entregue sem defesas, forte vento,
A sorte se transforma em solidão,
Aprendo desde cedo este sentido,
O amor apenas mero ou presumido.


94


A tênue sombra diz do que passamos,
E sinto meramente a frágua morta
E quando esta saudade vem à porta
Os dias matam frondes, secam ramos,
E tantas vezes quando imaginamos
Presença da esperança já se aborta
E enquanto o vento frio toma e corta
Diversos mares; juntos, desolamos.
E sei que na verdade nada existe
Somente um coração e se ele é triste
Palpita em solitária decadência,
O quanto deste amor fora gentil,
Um elo neste instante se partiu,
E a voz já não possui mais eloqüência.


95


Destino em amargura e dor somente,
Não vejo outra saída embora eu creia
Que a vida noutra face mais alheia
Produza qualquer grão, nova semente,
E quando a realidade não desmente
A lua que julgara enorme e cheia
Apenas no vazio ora rodeia
E o coração se torna vão, demente.
Espúrias noites; tento ainda ver
No olhar de quem amei o amanhecer,
E sinto que distante está de mim,
O corte na raiz, o amor disfarça
E o tempo desnudando a antiga farsa
Matando em aridez, ledo jardim.


96


O quanto brutalmente a vida diz
E nega qualquer messe, mesmo quando
O sonho noutro tom se revelando
Deixando para trás a cicatriz,
No fundo nada faço; um infeliz
Morrendo ao mesmo tempo em que negando
A vida noutra face desnudando
O sonho, um tosco e torpe chamariz,
Extraio dos meus dias esta ausência
E nem sequer presumo uma sequência
Aonde poderia haver qualquer
Caminho que trouxesse remissão
Enfronho este deserto e neste não,
Procuro qualquer sombra que tiver.



97


Uma alma se enlutando a cada dia,
Mortalhas costumeiras a quem ama,
E quando a realidade dita o drama,
Jamais outro momento em paz viria,
Apenas o que resta, hipocrisia,
E sinto novamente a velha chama
Ardência tão dolosa quando clama
Em brasas desenhando esta heresia,
Resgato dentro em mim algum alento
E quantas vezes teimo e me alimento
Do nada que se faz onde pudera
Haver qualquer momento em lucidez,
A vida noutra face se desfez
Deixando como herança a fúria e a fera.


98

Um solitário apenas, o eremita
Que tanto quis a sorte e nada veio,
Do mundo neste instante sigo alheio
Minha alma nem nas luzes acredita,
O quanto poderia ser bonita
A vida, muito embora em devaneio,
Perdendo esta esperança, meu esteio
Meu passo, a fantasia delimita.
E escassamente tento alguma messe,
Somente a solidão a vida tece
E traz esta artesã, somente o medo,
E quando ainda tento ser feliz,
O amor que num momento tanto eu quis
Condena o sonhador ao vão degredo.


99


Pressinto em meu caminho algum nuance
Diverso deste rude e vão matiz,
Aonde poderia por um triz
E nada na verdade ainda alcance
O mundo se perdendo não avance
E morto a cada passo, um aprendiz
Do quanto imaginei e nada fiz
Nem mesmo nalgum sonho a alma descanse.
Acendo outro cigarro e, suicida
Percebo se esvaindo a minha vida
E tento algum refúgio no tabaco,
Meu passo desdenhado e sem traquejo
Somente este final ora prevejo,
E cada vez me sinto bem mais fraco.

100


Não tenho mais sequer mera lembrança
De um tempo aonde fora mais audaz,
A voz se cala e nada agora traz
Somente no vazio ora se lança,
A tempestade gesta uma mudança
E o olhar que me rodeia, mais mordaz,
O tanto quanto fora tão tenaz
Agora nem sequer mera fiança.
Esbarro nos meus erros e presumo,
O quanto da verdade é mero fumo
E segue sem destino rumo ao céu,
Mendigo algum afeto, simples pária,
A vida se espalhando em procelária
E o velho timoneiro agora ao léu.

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