domingo, 3 de julho de 2011

51

Já nada após a queda restaria
Somente esta carcaça do que fora
Palavra tantas vezes sonhadora
E agora resta apenas na ironia
De um verso que decerto não traria
Sequer uma expressão que, redentora,
Gerasse no final a tentadora
Loucura que tocasse esta alquimia.
Meu manto resumido em nada ser,
O tanto quanto possa apetecer
Grassando sobre o solo mais agreste
Do quanto pude crer e não viera,
Apenas resumisse a primavera
No templo que em vazio se reveste.

52

Embora tão distante do que eu possa
Viver sem mais temores nem anseios,
A dama se desnuda e os belos seios
Transcende ao quanto a vida apenas roça,
E sei da maravilha que se apossa
Do olhar entre momentos, devaneios,
Ousando acreditar em novos meios,
Deixando para trás cerro e palhoça,
No fundo a solidão não mais transmuda
E sei do que se faça sem ajuda
Sentidos tão diversos ida e volta,
O pendular momento que ansiasse
Gerando no final o mesmo impasse
E nisto outra palavra o sonho escolta.


53

Não tendo outra versão, apenas esta,
O quanto resolvesse não mais traz
Semente do que a vida deixa atrás
Embora outro caminho, a sorte atesta,
O prazo resumindo em mera fresta
O vento tanto quanto for capaz
De transcorrer deixando o que se faz
Na ausência desta noite feita em festa.
Mergulho nos anseios e presumo
O tanto que pudera noutro rumo,
E quanto mais deveras eu me esqueça
Do pouco ou quase nada que inda trago,
Vivendo o que pudera sem afago,
Ainda assim no fim eu enlouqueça.





54

Não mais coubera um tempo onde se tente
Nas velhas ironias de um passado
Há tanto pelo sonho demarcado,
Vencido pelo sol mais inclemente
E quando se percebe ser recente
O temporal vislumbra no traçado
O cântico deveras desejado
Ou mesmo este cenário condizente.
Não quero acreditar noutra incerteza
Que trague com terror a sorte presa
Nas tramas mais sutis do desafeto,
O beijo se amortalha e conduz
Ao tétrico caminho já sem luz
E desta turbulência eu me repleto.


55

Coração aventureiro
Não se cansa de lutar
E se mostra por inteiro
Procurando céu e mar
Onde seja o derradeiro
Neste instante a mergulhar
Quem se fez do amor cordeiro,
Sonha versos ao luar
Trovador sem mais destino
Velho encanto já deslumbra
Quando o mundo descortino
Muito além desta penumbra
E voltando a ser menino,
Emoção rara vislumbra.


56

Nada tenho do passado
Nem quisera no futuro
Caminhar neste legado
Que deveras configuro,
Procurando sempre ao lado,
O momento mais seguro,
Onde possa e se me evado
Noutro instante transfiguro,
Vida segue e de tal forma
Nada cessa nem pudera,
O cenário que se forma
Expressasse o que tempera
A incerteza como norma
Ilusão rude e sincera.

57

Nada mais se aproximasse
Do que tanto tento e vejo,
Minha vida noutra face
Traz a sorte do desejo
E se possa em desenlace
Traduzir um benfazejo
Caminhar enquanto trace
Nos meus sonhos, o azulejo,
Encantando em poesia
O que vejo e se refaz,
Novo tempo moldaria
Coração imerso em paz,
E se bebo a fantasia,
Na verdade tanto faz.

58

Nada mais se vendo após
O momento desta queda
Ouço então a firme voz
Que no fim já se envereda
Onde o tempo segue atroz
O caminho nada veda
E o tormento rompe os nós
Presumindo o quanto enreda
Na palavra mais sutil,
No momento em turbilhão,
Outro tempo se previu,
Noutra sorte, esta eclosão,
Sendo o mundo mais hostil,
Sendo o passo sempre em vão.


59

Um arguto sonhador
Quando a vida traz de fato
Muito mais que desamor
Noutro tom tento e retrato,
Vagamente um trovador
Na viola que maltrato
Expressasse a sua dor,
Ou quem sabe o desacato,
Feito enquanto ali ponteio,
Numa lua sem igual,
O que tanto ora rodeio
Deixa a sorte no final,
E se possa quando veio,
Ter um sonho magistral…

60

Inda lembro da criança
Que corria ali, descalça,
A saudade nos alcança
Infindável mundo ora alça
Expressão que fora falsa
Na verdade ora se lança
E transcende ao que realça
Mesmo vaga esta lembrança,
Do meu mundo em varandas
Entre luas e quintais,
Recordando das cirandas
Dos diversos madrigais
Dos coretos, suas bandas,
E dos tantos milharais...

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