segunda-feira, 21 de junho de 2010

38001 ATÉ 38020

1

Jamais acreditei em alquimias
Tampouco nas mentiras que propagas,
Ao velho só restaram rugas, chagas
Enquanto em ti são vivas fantasias,
Teu deus é rara fonte onde bebias
O meu não tem presença nestas plagas,
O sol neste horizonte tu afagas
As minhas noites morrem, são sombrias.
O tempo se esgotando, pouco resta
Senão leve luzeiro em frágil fresta
Das festas do passado, nem lembrança.
À plenitude em vida, enfim, mal tocas
E quanto a mim escondo-me em vãs tocas
Ao apogeu tu vais; morte me alcança.

2

O tempo em inclemência não me poupa
As ânsias esquecidas; nada levo
E quando a um mar tranqüilo eu já me atrevo
Realidade pui a velha roupa,
Rompantes de ilusão? Tolas quimeras,
Meu mundo já desfeito não permite
O quanto se pensara num limite,
Se eu amortalho inverno és primaveras
As marcas tão profundas da verdade
Jamais renegariam o que eu sou,
A decadência plena me tomou,
Enquanto a cada dia eu já degrade,
Em abissais mergulho a cada instante
Mortalha me envolvendo doravante.

3

Jamais imaginei outro cenário
Senão este real e mesmo brusco,
Se alguma luz ao fundo ainda busco
O passo com certeza é temerário,
Eu sei o quanto o sonho é necessário,
Porém à sombra torpe enfim me ofusco,
Sequer resta um momento em lusco fusco
A vida ultrapassando o calendário.
Na decomposição precoce da alma,
Nem mesmo uma ilusão ainda acalma,
As horas derradeiras; toco enquanto
O mundo se desnuda em tom cruel,
A morte descerrando o turvo véu
Ao próprio funeral eu me adianto.

4

Enquanto a morte ronda o que foi vida,
Não tendo outro momento de esperança
A carpideira sorte já se avança
E a estrada há tantos anos vai perdida,
Aonde imaginara ser urdida
Ao menos uma luz em temperança,
O passo não se dando em confiança
A história preparando a despedida.
Alhures ouço a lira de um poeta
Seara desta ausência se completa
Sobrando ao meu olhar a turbulência,
E quando procurara algum amparo
Quem sabe algum momento em tom mais claro,
A vida se desnuda em inclemência.


5


Olhando o meu retrato eu pude ver
A marca inexorável da verdade
Enquanto o fim atroz à vida invade,
O quanto resta em mim no anoitecer?
Não tendo outro caminho a percorrer
Somente a mansidão onde degrade
Ausente da sutil voracidade,
O fim velho ditame a me envolver.
As brumas, trevas ditam o vazio,
Às sombras do passado inda desfio
Um derradeiro canto em frágeis vozes,
Os tantos sonhos morrem, nada resta
E bebo desta imagem mais funesta,
Os tempos adentrando suas fozes.

6

Jamais me perdoei por ter sonhado,
O tempo não escusa quem se entrega
E segue sem destino, uma alma cega,
Ainda vive à sombra do passado,
Não tento corrigir este ermo fado,
Num mar em turvas águas se navega
E tento desvendar a falsa entrega
De um mundo com certeza tão errado.
Adivinhando a morte após o caos,
Restando desta escada estes degraus,
O fim já me roçando me enamora,
O pouco desta luz ainda tento,
E mesmo quando busco algum alento
Percebo claramente que é minha hora.



7

Acreditara em luz aonde há tanto
A escuridão reinara em tom mais grave,
O coração audaz, qual fosse uma ave
Ainda perfilara um claro encanto,
Mas quando neste espelho enfim me espanto
A realidade torpe enfim agrave
À morte em derradeira, última nave
O passo; ao fim decrépito, adianto.
Carcaça de uma vida em plenitude,
No quanto alguma sombra ainda ilude
Eu pude acreditar; mera inocência.
E quando desta réstia enfim me afasto
Percebo este retrato ora nefasto
E nele a vera imagem: decadência!


8


A vida me arremete à realidade
E sei do quanto amargo sou, agora.
Nem mesmo alguma sombra revigora
Aonde a turbulência em vão invade,
Pudesse ainda haver felicidade,
Porém em tela escusa se decora
O passo rumo ao nada e se descora
O quanto fora outrora claridade.
Preparo-me afinal no último instante
E aguardo este ato atroz e derradeiro,
Sem rumo e sem um norte este ribeiro
Em corredeiras segue; alucinante
Invés de ser apenas claro aporte
Encontra um estuário e um fim na morte.

9


Aprendo com meus erros, mas sei bem
Do quanto ainda tenho que entender
Da vida em tédio e se inda busco ver
O quanto do vazio me contém
Das ânsias tão somente algum refém,
Não tendo onde nem como me verter
Senão na leda ermida do meu ser
Enquanto o fim inglório ora não vem.
Perdido entre as borrascas, sem ao menos
Tentar adivinhar portos amenos,
Enveredando as dúvidas, procuro
Um lenitivo ou mesmo algum alento
E quanto mais, inútil cais eu tento,
O céu se apresentando mais escuro.

10


Não tive nem sequer sombra de um rumo
E quando procurara a mansidão,
Apenas entranhando a negação
Da sorte sem prever algum insumo,
Vencido pela dor jamais me aprumo,
E quanto mais teimava; a direção
Diversa de onde quis atracação,
Aos poucos, sem caminho em vão me esfumo.
Pereço nesta ausência de esperança,
A voz já não se ouvindo, nem alcança
Aonde poderia haver resposta,
Uma alma envelhecida ainda tenta
Singrar tal mar intenso e na tormenta
A cada outro naufrágio é decomposta.

11

O olhar sem horizonte já rechaça
A sombra do que fora libertário,
O medo muitas vezes necessário
O doce paladar, amor cachaça
E quando sem sequer saber de uma acha
O velho coração, incendiário,
Morrendo em turva cena, busca um vário
Caminho e a dor somente; apenas, acha.
Do quanto poderia acreditar
No vasto deste céu e deste mar,
Mas quando enfim concebo a solidão,
A morte sendo bela e mais sublime
De todos os engodos me redime,
Mergulho nesta intensa escuridão.


12

A boca envenenada da saudade
A cada beijo traz esta mortalha,
A ausência em inclemência já se espalha
E apenas o fastio rompe a grade,
Aonde poderia a liberdade,
A vida trama um campo de batalha
A fúria extensa em forte cordoalha
Jamais encontrarei tranqüilidade.
O peso sem promessas de uma vida
Há tanto noutra face destruída,
Sobejamente adentra este vazio,
E quando inutilmente cirzo o fim,
A paz encontro e doma tudo em mim
Etéreo caminhar à morte; espio.



13

Buscara da esperança alguma esmola
E um dia mais tranqüilo, porém nada
Traria o renascer numa alvorada
Aonde a solidão, cruel assola,
Enquanto a realidade já degola
O quanto poderia em desarmada
Vivência em tal clemência desenhada
O passo; nem anseio mais controla.
Erguendo olhar além se à morte eu brindo
O vago neste nada resumindo
O quanto restaria dentro em mim,
O fato de viver já não me basta,
A velha cena agora imerge gasta
Anunciando em dor, o amargo fim.


14

Do quanto imaginara e já perdido
Jamais eu pude ver além da cerca
Contabilizo a dor, em nova perca
O corte novamente sem sentido,
A marca desta vida sem sequer
Um risco de esperança ou de alegria,
A morte a cada passo me extasia
E seja da maneira que vier,
Apenas dessedenta esta vontade
Aonde uma esfaimada noite vinha
Dizendo que em verdade não és minha,
Nem mesmo este alimento em vã saudade.
Arrisco algum olhar e dos umbrais,
Vislumbro ao longe os turvos temporais.

15

O quanto em solidão se balbucia
Tentando em solilóquio ouvir a voz
E tendo este vazio dentro em nós
Quem sabe algum instante de alegria?
O nada sobre o nada se irradia,
O passo perde rumo e morta a foz
O vago caminhar em ânsia atroz
No olhar imensa dor e a covardia.
Sonhar é libertar o que em verdade
Existe e muitas vezes nos degrade,
Mas quando se proíbe esta ventura,
E desvairadamente a vida busca
Além da noite amarga onde se ofusca
As réstias de uma vaga claridade.


16

O olhar estertorado busca um alvo
Entregue às ânsias falsas, vãs promessas
E quando nos teus pés mesmo tropeças
A vida noutro tempo, pois ressalvo
E vejo o que pensara estar a salvo
Imerso nas angústias e te expressas
Nas vagas ilusões e me confessas
Este ermo de minha alma onde eu quis alvo.
Escusas não seriam o bastante
No quanto meu caminho não garante
Sequer alguma paz, nem momentânea
À parte desta espreita onde me dou
Destarte nada em cena se mostrou
Nem mesmo a réstia em luz que ainda ufane-a.

17

Num derradeiro dano um vão harpejo
Ainda buscaria algum alento,
Porquanto a direção diversa eu tento
E quanto mais aquém teimo e revejo
O mundo onde tentara em ar sobejo
Ao menos dirimir meu sofrimento,
Vivendo o que se fez em desalento,
O resto do caminho eu mal prevejo.
Pudera acreditar em norte manso,
Mas quando aos poucos teimo e já me canso,
Percebo quanto é frágil uma esperança.
Na tétrica paisagem, raro esboço
Do quanto no passado em alvoroço
E agora em torpe senda, toca e avança.

18


O quanto do vazio não consola
Quem tantas vezes teima em negação,
Aonde se pensara sim é não,
O amor já não seria nem esmola.
A pedra no caminho, o passo atola
Nas ânsias da tormenta em tal verão,
E apenas os sentidos mostrarão
O rumo que nem mesmo se controla,
Vacância dentro da alma envilecida,
Domínios tão dispersos de uma vida
Jogada pelos ermos de um non sense,
Adormecendo em fráguas, bebo incêndios
E tendo como herança vilipêndios
Sem nem sequer um brilho onde se pense.

19

Uma esperança morta se apresenta
E serve como totem de quem antes
Tentara outros caminhos inconstantes
Vencendo a dura senda ora sedenta,
O quanto deste vão dita a tormenta,
E nada além dos fardos me adiantes
E quando em poesia delirantes
Procuro acreditar, se desalenta
O marco deste instante; inundações
E nelas tantas fúrias ora expões
Ao denegrir o passo em erma senda
Sem ter ao menos luz, procuro a vaga
E torpe sensação quando se alaga
Em pútrida verdade e não se entenda.

20

Não quero o deus que vês nestas igrejas
Ao menos não mais creio em tais milagres
E neles entre angústias teimas, sagres
O quanto na verdade mais almejas,
As rendas entre lendas mais desejas
As hóstias em hostis ânsias consagres
Do vinho secular, vários vinagres
Em truculência espúria tu trovejas
Marcando com teu asco quem não segue
Ou mesmo esta mentira inda renegue,
Tentando apenas lucro, eu não persigo
Qualquer fonte de luz aonde passas
E vendes com ternura tais trapaças
Prefiro a solidão do meu jazigo.

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