1
Partindo para o nada de onde vim,
Cevando em paciência o que puder,
E sei deste vazio sem sequer
Querer colher a flor em meu jardim,
Existo e tão somente sigo assim,
No pouco ou no vazio se vier
O resto do banquete, um vão talher
O olhar indecoroso do chupim.
Jogado sob a terra, no futuro,
Adubo o solo em ânsias, ledo e escuro,
Voltando ao meu passado, agricultor,
Porém deste resgate nova face
Aonde a mesma ceva dome e grasse
Sem medo, penitência ou mesmo dor.
2
O quanto pensa ser além do nada
Permite ao mais estúpido dos seres
Gerar neste vazio os seus poderes,
Ceifando com terror sublime estrada
A imagem desta cena, desolada,
E nela muito além do que quereres
Terás noção de tudo se não veres.
O olhar bem mais atento agora grite
E mostre ao ser imundo o seu limite,
Mas logo se apresenta de outra forma,
Perfeita sincronia? Nada mais...
Prepara com furor seus funerais
E à própria mãe que o gera, ele deforma.
3
Um peregrino segue em passo audaz
Vagando sobre as sendas mais distantes,
E mostra com seus ares degradantes
Que nada na verdade o satisfaz
De tudo com certeza é tão capaz,
E quando vês o fato não te espantes,
Minúsculo com ares de gigantes
No olhar sempre sedento e tão mordaz,
A velha garatuja não contenta,
E segue sua fúria, mais sedenta,
Destroços espalhando em arrebol,
Esconde-se deveras neste falso
Delírio onde se mostra sem percalço
Maior do que talvez o próprio sol.
4
Ao se elevar por sobre este cenário
Imensos turbilhões, faces cruéis,
E vendem com ternura fartos féis,
Dos sonhos cada qual sendo um corsário,
Um ser tão asqueroso e temerário
Refaz e muda logo os seus papéis
Abelha que às avessas bebe os méis
Um semideus vazio e imaginário.
Assim ao demonstrar a insanidade
Esboço em vilania, humanidade,
Um bípede venal, um símio espúrio,
Buscando a eternidade? Que ironia...
Enquanto a própria ceva destruía
Qualquer prece se faz como um perjúrio.
5
Brilhando neste breu
Olhar inconfundível
O sonho é combustível
E quanto se perdeu.
O mundo vago e ateu,
O passo nunca crível,
O amor sendo impossível
Jamais seria meu.
Abrindo então tal pano
O sórdido e profano
Caminho se desvenda,
O gozo de um momento,
Completo desalento,
É simples, mera lenda.
6
Que mostra toda a sua
Beleza em cor sutil,
O amor quando nos viu,
Deveras logo atua,
E bebe inteira a lua,
E nela mais gentil,
Recebe o que previu
E assim também flutua.
Adentro esta certeza
E tendo sem surpresa
A vida mais suave
Sem nada que me cale,
Montanha sobre o vale,
Liberta como uma ave.
7
Princesa das estrelas
Rainha do infinito,
O sonho mais bonito
Em luas, posso vê-las
E tanto até retê-las
Portanto necessito
Além do mero rito
O gozo de envolvê-las
Palavras doces, sonho
E tudo se eu proponho
Repartes com ternura,
O tanto que te quero,
E sendo enfim sincero,
Dos males, minha cura.
8
O mundo que trouxera
A luz de teu olhar
Cansado de lutar
Buscando a primavera,
A sorte amarga e fera,
O tempo a imaginar,
No céu já sem luar
A morte desespera.
Mas quando te aproximas
De tudo enfim redimas
E creio ser feliz.
O quanto te desejo
Além de mero ensejo
É tudo o que eu mais quis.
9
Nos pântanos e charcos
Delírios de quem tenta
Vencer qualquer tormenta
Em dias turvos, parcos,
A sorte com seus arcos,
A boca mais sedenta,
A fúria que é sangrenta
Os dias com seus marcos,
O peso da existência
A vida em penitência
Jamais eu quis buscar.
Agora que te anseio,
Das dores vou alheio,
Num manso navegar.
10
Corcéis de fina estirpe
Os sonhos mais sutis,
E tendo o que mais quis
Se todo mal se extirpe,
Vagando pelos céus
Imerso em claridade
O tanto que me invade,
Em raros fogaréus,
Delírios entre luzes
Sublimes fantasias,
E assim tu poderias
Enquanto me conduzes
Traçar neste horizonte
A paz onde se aponte...
11
Vasculho pelo céu
Procuro a tua imagem,
E sem sequer paragem
Vagando carrossel,
Navego em tom cruel
Bebendo alguma aragem,
Sem ter uma hospedagem
Cevando em mim o fel,
Ceifando uma esperança
Enquanto a vida avança
Em área movediça
Sequer a claridade
Da imensa liberdade
Ao longe, alheia, viça.
12
Sumiste sem sequer
Deixar um paradeiro,
O sonho aventureiro
Procura onde puder
O quanto inda tiver
Do amor mais verdadeiro
E sem sentir o cheiro
Gostoso da mulher
Galgando este vazio
Ainda assim recrio
A imensa fantasia,
Olhando para o lado,
Decerto abandonado,
Eu sei que nada havia.
13
Agora o quê que faço
Se nada fora meu,
O todo se prendeu
Num tolo e opaco espaço,
Aonde quis o passo,
Um ermo me venceu
E tudo gera o breu
Aonde me desfaço,
Destaco esta ilusão
E sei do quanto é vão
O tempo de sonhar,
Não tendo senão parco
Caminho, o tolo barco
Não sabe onde ancorar.
14
A vida se perdendo
Nos ermos da emoção
Nem mesmo mais verão
Amores num adendo,
E quando não entendo
O rumo e a direção,
A tosca embarcação
Vazia e sem remendo,
Erguera o meu olhar
Além deste horizonte
E nada mais desponte
Sequer sol ou luar,
Apenas cenas gris,
Meu prumo então desfiz.
15
Do brilho que trouxeste
No olhar extasiado,
Apenas no passado,
Sinal dorido e agreste,
No nada se reveste
O corte anunciado
O fardo tão pesado
E nele já se investe
A sorte em turbulência
E sem sequer clemência
A vida se transforma,
Tomando do vazio
Do medo em tédio e frio
Nefasta e dura forma.
16
Somente em teu olhar
Eu pude ver o brilho
Dos sonhos que palmilho
Cansado de buscar,
Depois de tanto amar,
Inútil andarilho,
Agora bebo o trilho
E sei onde encontrar
A doce fantasia
Aonde se recria
Um mundo mais tranqüilo,
E sendo do teu lado,
O tempo apascentado,
Em luzes eu desfilo.
17
Nas noites mais distantes,
Ausência de esperança
Aonde já se lança
Olhares provocantes,
Enquanto não garantes
Sequer qualquer lembrança
A vida sem pujança
Explode em tais instantes
Em reticentes passos,
Os dias morrem lassos
E vejo tão somente
A fome de sonhar,
Vontade de lutar,
Mas tudo em volta mente.
18
Procura no meu peito
Sinais de um mero sonho
E quanto mais medonho
O mundo sendo feito,
Quisera ser aceito
E nisto me proponho
Além deste tristonho
Delírio em que me deito,
Resumo a minha voz
No sonho mais atroz
Ou mesmo na quimera,
No todo que pensei
O nada eu encontrei,
E o mundo degenera.
19
O tempo que se passa
O jogo já perdido,
Amor em duro olvido
A sombra em tal fumaça
O risco, o beijo, a praça
O canto repartido,
O olhar, pois consumido
No todo que o desfaça.
Assim pudesse ter
Ao menos o querer
Mais perto em lenitivo,
Mas nada se apresenta
E estando em tal tormenta,
Apenas sobrevivo...
20
O medo não resolve
Nem mesmo poderia
Singrar a fantasia
Que tanto nos envolve,
E quando mais se prove
Da vida noutro rito,
O sonho mais bonito
Sem nada que o comprove
Morrendo um pouco mais,
Ausência de esperança
E ao nada a vida lança
Expressa em vendavais
Aquilo que pudera
Ser clara primavera.
1
Amar quem nunca amei,
Vencer os meus pudores
Ainda aonde fores
Também lá estarei,
Amor ditando a lei
E nele réstias, flores,
Em tantas raras cores
Dourando a nossa grei,
Mas quando a realidade
O todo já degrade
E nada deixa além,
A sombra me domina
Esgota qualquer mina,
E a morte me detém...
2
O fogo que me queima
A sede de viver...
Pudesse eu esquecer
Deixando além tal teima.
E quando a vida esboça
Cenário multicor,
Vivendo em clara dor,
Adentro a velha fossa,
E sei desta cratera
E nela me sacio,
O tempo amargo e frio,
A morte é quem me espera,
Jogado nalgum canto,
Entregue à dor e ao pranto...
3
A língua que me toca,
O olhar não se sacia,
O tempo diz sangria
O medo já se aloca,
O corte se provoca
E a fúria em fantasia,
Matando em agonia,
Adentra o porto e a doca.
Ourives da esperança
O verso enfim me lança
E joga-me em fogueira,
A sorte que eu buscara
A vida sem apara,
Aos poucos já se esgueira.
4
Temor que me domina
Do dia que não veio
O olhar seguindo alheio
Buscando a fonte e a mina,
O gozo se extermina
Apenas o receio
E o tempo onde rodeio
A sorte desanima.
Mortalhas entre trevas
E assim além me levas
Com dores e terror,
Pudesse acreditar
Nas ânsias do luar,
Nas tramas de um amor...
5
Amor não é servil
Nem pode ser assim,
O quanto e de onde vim
O gozo se reviu
Num ato mais sutil,
Cevando este jardim
E nele tudo em mim,
Jamais seria vil.
O corte não se dando
O dia sendo brando
A vida satisfaz.
Mas quando sem destino
Apenas mal domino
A dor, cruel, mordaz.
6
Um Sentimento nobre
Pudesse dominar
O quanto do luar
A vida já recobre,
O nada se descobre
O tempo a derrocar
O corte a me tocar,
O mundo que se cobre,
Ausente dos caminhos
Somente estes daninhos
Momentos reconheço,
O passo rumo ao tanto
Em dor e desencanto
Apenas um tropeço...
7
Procuro insanamente
Apenas um caminho
E sigo mais sozinho
Do quanto se pressente
E assim nada apresente
Somente o vago espinho
E tanto sou mesquinho
Enquanto amor ausente.
No parto em dor e pranto
A sorte não mais canto
Em desencantos, vivo.
Quem fora soberano
Agora em pleno dano,
Dos sonhos um cativo.
8
Ninguém sabe, ninguém
Jamais pode escutar
A voz de quem amar
E sabe muito bem,
O quanto não retém
O passo rumo ao mar,
Vencendo e navegar
Singrando sempre além.
Mas quando tal procela
Aos poucos se revela,
O cais já se afastando,
A morte ronda e toma,
Aquilo que foi soma,
Aos poucos sonegando...
9
Num momento deparo
Com cada dor que leve
Um sonho mesmo breve
Em busca de outro claro,
O corte, o desamparo,
O passo onde se atreve
O coração em neve
O gesto onde declaro
Tão pouco que inda resta
Da vida onde se gesta
Apenas temporal,
O tanto sonegado
As brumas do passado,
Num último degrau.
10
A vida, sem quimera,
O olhar sem horizonte
Já seca a velha fonte
O nada além me espera,
A vida não se esmera
O parto desaponte
Ruindo única ponte,
O rumo desespera.
Apenas vejo enfim
A morte e chego assim
Ao derradeiro verso,
Deixando para trás
O quanto fora audaz
E agora me disperso...
11
Bem sabes que não tenho
Sequer outra ilusão
Os dias de verão
O olhar manso ou ferrenho,
E tanto não retenho
Do sonho em provisão,
Nem mesmo me trarão
Alento de onde venho.
O pranto, a dor e o medo
Assim eu me concedo
Sem luz e galhardia,
Manhã nunca viria,
A sorte em tempo ledo,
Matando a fantasia.
12
Meu tempo de existência
Aos poucos já se finda
Aonde quis ainda
Um pouco de clemência
Apenas inocência,
O nada se deslinda
A morte então me brinda
Com rara paciência.
E tento noutro instante
Um passo que adiante
E leve ao manso cais,
Mas quando vejo a vida
Em plena despedida
Eu sei que nunca mais...
13
O mundo que terei
Em medo e tempestade
No quanto me degrade
Mudando norma e lei,
De tudo levarei
Somente esta saudade
Que agora ainda invade
E toma a fria grei,
Errático ou perdido,
Não tendo mais sentido
O verso de esperança,
A própria resistência
Aos poucos, na inclemência
Deveras já se cansa.
14
Não posso te entregar
Os olhos nem os sonhos,
Se são ou não bisonhos,
É meu cada luar,
Vasculho a procurar
Em dias enfadonhos
Momentos mais risonhos,
E nada de encontrar,
Mas quero outro caminho
E mesmo se sozinho
Não temo outro cenário,
Do todo de onde vim,
Ao nada e ledo fim,
Sonhar é necessário.
15
A sorte me deixou
Há tempos e não via
Sequer a fantasia
Se o nada me legou,
O tempo aonde vou
O corte esta sangria
A tenra melodia?
Meu sonho capotou.
Mas tento nova sorte
E quem já me conforte
Talvez inda me traia,
Decerto o navegante
Em um ou noutro instante
Encontra enfim a praia.
16
A casa que prometo
De barro e de sapê
Amor que não se vê
Aonde me arremeto
Se eu faço outro soneto
Ou vivo sem por que,
Do todo não se crê
No quanto me cometo.
Aprendo ou logo esqueço
Não sei nem endereço
Nem mesmo quem me dome,
Olhando mansamente
O todo se apresente
E mata a minha fome.
17
Colchão, onde dormimos
Há tanto roto e aquém
Do sonho quando tem
Ou mesmo dividimos,
Dos céus, diversos cimos,
O gozo sem desdém,
O parto outro refém,
E assim nos repartimos.
Levando limos, sonhos
Olhares mais tristonhos
Ou mesmo sorridentes
No tanto que inda resta
Abrindo qualquer fresta
Delírios inda tentes.
18
O teto se chover
Ausência de esperança
Ainda sou criança
E nada quero ver,
Talvez reconhecer
Do medo de mudança
Ausência de aliança
A nos fortalecer.
Meu rito em resto e riso
O passo mais conciso
O dia não virá,
O sol se tem seu brilho
Apenas me polvilho
Aqui ou mesmo lá
19
Nascida com certeza
Nas ânsias de outro passo,
Enquanto o nada traço
Não sendo fera ou presa,
Desvendo sobre a mesa
Apenas o cansaço
De quem se fez mais lasso
E desce a correnteza,
Jogando sobre as rocas
Naufrágios que provocas
Não tendo solução
Eu bebo deste fel,
E sei do tom cruel
E fútil da ilusão.
20
Não sei como consegues
Vencer os teus temores
Somente beija-flores
E neles não sossegues,
Ainda que carregues
Diversos, maus humores,
E tantas são as cores
E tudo já renegues,
Persigo alguma luz
E tanto se me opus
Não vejo claridade,
O risco de sonhar
O medo do luar,
Cadê felicidade?
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