- A DERRADEIRA POESIA
Abordo meus fantasmas com descrenças
À bordo dos meus sonhos, sigo insone
E quando ouço chamar neste interfone
Preparo pra enfrentar mais desavenças.
Não tendo mais nem fé sequer as crenças
Nem mesmo uma palavra que me abone,
Por mais que a solidão não me abandone
Antigas esperanças são imensas.
E quando apodrecendo mais um tanto,
A vida se perdendo em farto encanto
No desencanto grana um novo dia
Imerso nas neblinas corriqueiras,
Arcaicas ilusões erguem bandeiras
E nasce a derradeira poesia...
MARCOS LOURES
Força, bardo!
Querido, tua dor não é segredo!
Dá medo perceber: tua fé se esvai!
Descai o meu semblante e sei que é cedo
Pro ledo engano que tanto subtrai...
É Pai o Criador e só c’um dedo
Degredo manda embora e Satã sai.
Sei vais me compreender, pois que concedo
O enredo do sofrer que sobressai-me
Meu ai que tu conheces, meu irmão!
É vão o entregar-se derrotado
Bocado que tu sabes ser sorvido
Bebido pelo Bicho, pelo Cão.
O não se lamentar deixa-o de lado
Sedado pelo orar do destemido!
Ronaldo Rhusso
Cansado de lutar contras as marés
Bravias desta insânia coletiva,
Ainda quando o sonho sobreviva
Velhas correntes atam os meus pés,
Cansado de seguir noutro viés
Enquanto a fantasia não cativa,
Minha alma da esperança já se priva
E perco o quanto houvera em ledas fés.
Um dia, após o fato consumado,
O verbo conjugado no passado,
Não sobrará sequer algum resquício
Do que pensara ser bem mais suave,
E a cada novo engodo a vida agrave
Cavando simplesmente o precipício.
MARCOS LOURES
Força Bardo II
Eu digo que estás equivocado!
Tu és a grande luz entre os poetas
E mártir deve estar, sim, preparado
Para chegar à última das metas.
Sem medo, mas com fé e de bom grado,
Um vate como tu suporta as setas
Aniquilando a dor que é mau bocado
Com versos lindos. E eis que ao mal tu vetas!
Meu caro tu és forte e a Depressão
É mal que nunca dura, eu sou a prova!
Pois quando a dor se vai meu Dom renova.
A fé não morre, pois é a razão
Que leva a tua alma à inspiração
E no que é feio tu tens dado sova!
Ronaldo Rhusso
Porém minha esperança em funerais
Não deixa nem sequer a menor sombra
Que tanto me conforte quanto assombra
Gerando dias turvos, desiguais.
Na alfombra onde pensara haver descanso,
Somente a sensação de algum faquir
No quanto poderia e sem porvir,
Deveras, no final já nada alcanço.
A luta se fazendo quixotesca
Moinhos gigantescos, medos tantos,
E os olhos entre velhos vis quebrantos
Resumem cada cena mais grotesca,
E o que consola quem tanto peleia:
Poder vagar além da lua cheia.
MARCOS LOURES
Força Bardo III
Eu digo que te enganas novamente,
Pois teu legado é grande e muito encanta.
Só morre quem viveu e, displicente,
Deixou passar em branco a lida tanta!
Irmão, qualquer um vê, és diferente
E a obra tua à toda se agiganta.
Tu és quem põe ess’arte a ir pra frente;
Fazes da poesia u’a arte santa!
Aqui, coadjuvante, eu testemunho
O brilho de teus versos magistrais
Que calam o sonido de teus ais
A alma que expões a próprio punho
Eu tento imitar, mas só rascunho.
E esse teu ser jamais se satisfaz?
RONALDO RHUSSO
Ainda que cogite em poder ter
Nas mãos este buril que me emprestaste,
Jogado pelos cantos feito um traste,
Ausento-me do sonho de viver,
A fonte já secando e sem saber
O quanto poderia em tal desgaste
Traçar além do que deveras eu me afaste,
Buscando a poesia; frágil haste.
Em ti, além do mais nobre parceiro,
Certeza da florada no canteiro
Das tantas verdejantes primaveras.
Mas quando me observando mais de perto,
Aos poucos, lentamente eu me deserto,
Entregue sem defesa às várias feras.
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