domingo, 16 de maio de 2010

32951 até 33000

32951

A volta do que fora e não valera
Deixando marcas fundas, cicatrizes
Aonde nós pensávamos felizes
Apenas a tortura conhecera
Cenário mais atroz se concebera
E neles outros tantos quando dizes
Dos variáveis tons, tantos matizes
E a morte em plena vida se tecera,
Vencidos pela angústia do vazio
No quanto me entregara e nada havia
A porta se mostrara em fantasia
E assim ao me encontrar nada crio
E morro na rotina a cada dia
Perdera da emoção qualquer pavio..


32952

Pisando devagar em folhas mortas
Deixando meu outono para trás
O frio se aproxima e sempre traz
Trancadas neste instante minhas portas,
E quando do passado ainda aportas
Tomando este caminho mais audaz,
O olhar que ainda tenho, tão mordaz
Mantendo assim fechadas as comportas,
E tantas vezes vejo este engrenagem
Vivida por um sonho, uma bobagem
E nada se mostrasse mais diverso
Do quanto acreditei em tempos idos,
Os dias vão perdendo os seus sentidos,
Restando tão somente um vago verso.

32953

Fumaças entre nuvens madrugadas
E as cenas repetindo este tormento,
Aonde muitas vezes violento
As normas entre tantas destroçadas,
Resumos dos momentos, madrugadas
Entregues ao que possa o pensamento
Palavra sem sentido ganha o vento
E busca outras manhãs ensolaradas,
O toque da buzina do meu carro,
A sorte com certeza tira um sarro
E nada mais do tempo ainda vejo,
Aporto no futuro e sinto a sombra
Da morte em plena vida que me assombra
E nada se aproveita neste ensejo.


32954

O meu caminho vaga em ruas turvas
E segue sem destino em longas chuvas
As mortes encaixando como luvas
E vejo com descrença velhas curvas.
Não pude mais saber de outra verdade
Tampouco merecesse nova chance
Ainda que ao vazio não se lance
A porta com certeza não agrade
A quem buscara inútil, fútil, luz
E o corte se aproxima da garganta
A voz ainda tenta e se levanta,
Porém somente à morte se conduz
Um esmolar caminho segue o rito
Levando ao suicídio, ao infinito.

32955

Fazendo das escórias meu provento
Negando qualquer chance a quem pudera
Vencer com calmaria qualquer fera
Deixando o pensamento ao longo vento
E no meu rumo se inda fumo o sofrimento
No peso do passado se tempera
O gozo novamente gira a esfera
E dela a morte traça o pavimento.
Néscios caminhos tramo em solidão
Num ermo desenhar etéreo e vão
Galgando temporais em noite opaca
Os pés procuram solo, mas não resta
Sequer de uma esperança qualquer fresta
E assim a própria vida já se empaca.

32956


Não acredito em bruxas, nem em santos
Mas quando me perguntam como vou
Respondo que estou bem, o que restou
Dos meus dias transformo em desencantos
E sigo embebedado pelos cantos
Mergulho nos resíduos do que sou
E tento ainda ver se ora sobrou
Metade pelo menos dos meus mantos
O véu desta esperança já puído
Ao menos poderia algum ruído
Falar do quanto cri e nada veio,
Mas logo noutro canto bebo o fim
E sinto o meu destino sendo assim,
Apenas simplesmente algum receio.


32957

Não quero mais servis nem serventias
Aonde no passado mergulhaste
Com toda fúria e sonegaste
As mais diversas luzes, ardentias
E quando noutro tanto tu recrias
A ponta do que seja faca ou haste
Ainda que deveras me sangraste
A noite não traria sombras frias
E nem as fantasias mais ferozes,
Medonhas gargalhadas dos algozes
Nem vozes discrepantes destes tais
Mesquinhos caminhares noite afora,
A fonte do passado me devora
Deixando para trás velhos cristais.

32958

Passado adormecido pelos cantos
Não serve para nada, morto está
E quando se percebe aqui e já
Os novos sonhos beijo belos mantos
E ainda se mostrasse desencantos
O sol incrivelmente brilhará
Independentemente tomará
Secando ou renovando tolos prantos,
Não quero a velharia de onde venho,
E ainda que mostrasse algum empenho
O mofo dominando o velho armário
A morte a cada instante se fazendo
E o tempo noutra face renascendo
Mostrando o quanto o sonho é necessário.


32959

Aonde me fiz teu e não vieste
Toando o mesmo canto do passado
Ainda noutro tempo decorado
Negando qualquer tom, caminho ou peste
Restando do que eu fora, nem metade
Aguardo alguma voz onde não houve
Nem mesmo a ventania ainda se ouve
Por quanto a própria vida não agrade,
Nascentes dentro em mim trançando rios
E neles desabando em cachoeiras
As plantas que tu vês são derradeiras,
Mas nelas inda vejo desafios,
Esmeraldina sorte de quem luta
Ainda que a verdade venha bruta.


32960

Por um fio seguindo cada fera
Em seus momentos terminais
Vestindo estes tormentos desiguais
Escarrando a fome e nela se gera
O quanto poderia ser quimera
E o gozo dos cenários em cristais
Retinta madrugada, madrigais
E o beijo deste espectro é o que se espera.
Realço com meu canto cada fase
E nela mesmo quando o tempo atrase
Trará novamente brilho ao meu caminho,
Só sei que desafio a própria morte
E quando se prepara o fundo corte
Eu bebo solitário o doce vinho...

32961

Aonde se pudesse em maravilha
A rosa mais bonita do jardim
Agora ao perceber chegando ao fim
Amor onde esperança não palmilha
Vestindo esta ilusão a sorte trilha
Caminho tão diverso e mesmo assim
Durante muito tempo ainda em mim
Vivera a fantasia, uma armadilha.
Resisti e consigo a liberdade
Porquanto tanta luz ainda invade
Em tom disperso e mais fugaz
Não quero nem saber do meu passado
O mundo noutro tempo renovado
Agora quero amar, mas sempre em paz.

32962

Na batalha final entre deidades
Mergulho no oceano dividido
E nele nada toca meu sentido
Enquanto noutro canto te degrades
Riscando estes espaços claridades
E nelas outro tempo percebido
O mundo que queria repartido
Agora perfilado em unidades
Mesquinharias tolas nada creio
E quando no caminho sem rodeio
Encontro novamente algum tormento
Não vago pelas ondas, resto em cais
E tanto acostumado aos temporais
Apenas do não ser eu me alimento.

32963

Riscando qualquer sombra do que ainda
Reside num instante ou mesmo mais,
Restando noites frias e banais
O resto que desejo não mais finda,
A morte no presente se deslinda
E mostra em faces turvas, magistrais
Risonhos caminhares, e jamais
O corte se propaga enquanto brinda
Resquícios de esperança são fugazes
No todo que deveras não mais trazes
O medo se estampando em tal progresso
Que nada mais resiste e vejo a face
Tramada pela angústia que inda grasse
E ao quanto mais sonhei, teimo e regresso.


32964

Não pude conceber a minha sorte
Aonde na verdade nada havia
E tanto poderia outra alegria,
Mas como se o viver nega o suporte?
Resumo neste verso o dia a dia
De quem a própria morte agora adia
E sabe finalmente o podre norte,
Vestígios deixarei e já me basta
Saber que a face escusa e mesmo gasta
Do mundo que sonhara nunca veio,
Ainda bebo em honra a quem se fez
Em plena consciência e lucidez,
Diverso do caminho que eu anseio.

32965

Dançando a noite inteira em ruas, céus
Vencidos pelos gozos mais sublimes
No quanto deste todo ainda estimes
Exibes nos teus olhos fogaréus,
E cobrem velhos dias novos véus
E neles emoções em que redimes
Os erros cometidos, tolos crimes
Seguindo em tempestade noutros léus.
E assim ao serenar a tempestade
Deixando para trás qualquer valor
Entranho nas mesmices de um amor
Enquanto no passado houvesse grade
Agora não percebo mais algemas
E assim a vida passa sem problemas.

32966

Catando os meus pedaços pelas ruas
Metade coletada em cada lixo
Um homem sem destino, um pária, um bicho
E nele com ternura ainda atuas,
As áureas madrugadas, belas luas
A sombra não passando de um esguicho
E quando perpetuo aqui meu nicho
Destas sarjetas tantas que cultuas
Bebendo também mesma podridão
Esgota-se abissal a negação
Do sonho mais feliz, tolo e burguês
Assim na insanidade maviosa
Aquela que se fez divina rosa
Agora noutra face se desfez.

32967

Ainda não haveria sequer tristeza
Houvesse pelo menos a esperança
Que a cada novo tempo já se alcança
Qual fora meramente simples presa
E nela toda a caça, com certeza
Poderia ter na mão também a lança
E sendo assim espécie de vingança
Reage contra a incúria, a natureza.
Legado de um momento aonde eu vi
O todo se perdendo e desde aqui
Bebendo cada gota da saliva
Da terra moribunda em tez amarga
O gozo prometido já se embarga
Enquanto uma alegria ora se priva.

32968

Vagando pelas ânsias do passado
Gerando estes momentos do futuro
E nada do que eu busco em solo duro
Promete o novo tempo desejado,
O quanto fora apenas mal traçado
Agora noutra face já perdura
E quando mergulhando em amargura
Não posso adivinhar outro legado.
Lavando com terror as minhas mágoas
Bebendo as poluídas, turvas águas
Encontro estas respostas que buscara,
O pantanal exposto invés do vale
Permitindo à esperança que se cale
Na sórdida ilusão, pobre seara...

32967


Seguindo o meu caminho sem saber
Nem mesmo olhar pra trás ir para frente
No quanto a realidade me apresente
Vontade de lutar e conceber
Momento mais diverso e poder ver
O templo resolvido, mas descrente
Caminheiro vazio nada sente
Senão a mesma ausência a se verter.
Abrindo os meus caminhos, reza e prece
O todo do futuro se obedece
E nada mais teria senão isto:
Retalhos sobre a cama, sou refém
Da morte que deveras sempre vem,
Mas como fosse um louco ainda insisto.

32968

O meu canto poderia apascentar
Ou mesmo transgredir a velha norma
E quando a realidade se deforma
Não tendo mais vontade de lutar
Encontro meus pedaços no lugar
Aonde noutro intento em velha forma
Somente este vazio agora informa
Da bela fantasia de um luar.
No discrepante passo rumo ao nada,
A porta percebida e já cerrada
Transforma o meu caminho em dor e treva,
Atormentado eu sigo em busca vã
Tentando adivinhar outra manhã,
Mas como se em verão intenso, neva?

32969

Levando o meu caminho sem sentido
Vagando por estrelas entre tantas
Ainda quando cedo te levantas
Deixando no passado o já perdido
Desenho muitas vezes esculpido
Nas ânsias das vontades quando cantas
E tentas subverter ou mesmo espantas
Os sonhos desenhados por Cupido
Eu teimo em contramão, e vejo além
Enquanto na verdade me convém
Calar-me e nada mais, melhor seria,
Mas como se te quero e desejo enfim
O amor que ainda existe e vive em mim,
Não permitindo ausência, uma heresia.

32970

Aonde nada faço e nem faria
O candeeiro apagado da esperança
E nele retornando à ser criança
Em temporais diversos, na agonia,
Ardendo dentro em mim tal fantasia
E nela cada voz ao longe lança
Rompendo com ternura uma aliança
Embora no lugar, hipocrisia.
Vestindo angelical imagem tento
Vencer o que pareça algum lamento
E bebo sem pensar em goles fartos,
Mas sei que no final, nada virá
A morte desenhada desde já
Negando às esperanças novos partos...

32971

Voltar ao meu caminho principal
Depois destes desvios naturais
E tendo nos meus olhos sempre mais
Momento que julgara triunfal
E agora quando volto ao ritual
E dele afasto logo os temporais
E as sortes que busquei atemporais
Deveras permitindo outro degrau,
Ascendo ao que pudesse imaginar
Acendo esta lanterna a me guiar
Na espúria madrugada em trevas feita,
E quando mal percebo a luz do sol,
O tempo retornando em arrebol,
Uma alma finalmente satisfeita.

32972

Não vou cegar meus passos rumo afora
E tanto pude crer na hipocrisia
Gerada pela mesma fantasia
Que ainda sem sentidos nos devora.
Resisto e quando a sorte se demora
Não posso mais negar a alegoria
E tanto noutro tempo moldaria
Tomando com terror; ferida e espora
Arrisco cada passo rumo ao quanto
Pudesse novamente e sei, portanto,
Que é tudo uma ilusão, mas mesmo assim,
Subindo cada escada que apresente
No tanto quanto amor seja freqüente
Podendo novamente ter-te em mim...

32973

Aguardo esta chegada, e nada vem,
O medo não faz parte desta vida
Mas sei que na verdade sem saída
O tempo sempre olhando com desdém,
Navego por um mar e nada tem
Semente que pensara destruída,
E toda a podridão já percebida
Resume a mesma ausência. Sem ninguém...
Refém do que pudesse ser um sonho
Enquanto o paraíso é tão risonho
Medonha face mostra a realidade
No todo apenas vejo resumido
O quanto não se mostra mais no olvido
E ainda sem defesas toma e invade...

32974

Mereço realmente este final
Entranho nas magias do passado
E vejo o quanto havia já quebrado
O copo da esperança, este cristal,
Galgando inutilmente o sideral
Caminho pelo tempo mal traçado
O resto que apresento maltratado
Transcorrendo num ritmo sempre igual
Esboça qualquer face aonde eu creia
E adentra sem pudores cada veia
Entorpecendo o passo que inda possa
Viver a poesia, mas não ligo,
Aonde se pensara num abrigo
Somente esta terrível, fria, fossa.


32975

Chegando de repente de viagem
Nascendo dos meus olhos a esperança
E nela com certeza a vida alcança
Aquilo que pensara ser barragem
Supera com ternura esta engrenagem
E trama a cada dia esta aliança,
Rompendo do passado a velha lança
Criança que inda busca uma hospedagem
No peito enamorado da morena
E quando com sorrisos ela acena
A vida se transforma num segundo,
E assim de tanta glória e de beleza
Antes lutando contra a correnteza
Agora deste sonho já me inundo.

32976

O amor não comportando mais juízo
Não deixa que se veja quase nada,
A vida noutro tanto destroçada
Somando a cada passo o prejuízo,
E quando deste sonho mais preciso
A sorte noutra senda abandonada
Escreve com ternura cada estada
No que mais se aproxima ao Paraíso;
Mas quando a negação doma o carinho
Deixando tão somente dor e espinho,
A morte talvez surja como um trilho,
E ainda sem saber do meu futuro
Bebendo deste fel se me amarguro,
Retorno ao meu começo, um andarilho...

32977

Não posso mais conter esta verdade
E nela transformando o dia a dia
Em louca e mais sobeja fantasia
Tomando com ternura toda a herdade,
Amor que faz perder a identidade
Enquanto nos domina e até nos guia
Gestando ou digerindo a poesia
Sem nada nem tormenta que inda o enfade.
Jogando contra a sorte, teimo e tento
Viver ou pelo menos crer no vento
Deixando este dilúvio no passado,
Entorno-me em paixão e sendo assim,
Ainda que aridez tome o jardim
Eu me sinto por fim recompensado.

32978

Se eu guardo o guardanapo na gaveta
Marcado pela boca carmesim,
Assim também guardando dentro em mim
Por mais que noutro rumo eu me arremeta,
Quem sabe a fantasia, algum cometa
Retorne do princípio de onde vim
E trace novamente no jardim
Delírio que deveras se prometa
Nas ânsias delicadas e felizes
Agora são risonhas cicatrizes
Aonde em tantas crises se fizera,
O amor quando em saudades revivido
Esquece do tormento e soerguido
Recende a mais florida primavera.


32979

Jogado pelas ruas, pária sou
E tento receber algum afeto
Embora o prato seja mais completo
No resto que ninguém quis ou sobrou,
O tanto aonde pude e não restou
Nem mesmo o que pudesse ser dejeto
E agora ao me sentir bem mais abjeto
Insana companhia, aonde eu vou
Vestígios de um farsante, bandoleiro
E deste caricato ainda inteiro
Com lavras e palavras tenebrosas,
Porém na maciez de um velho engano,
Ainda resta a sombra de um humano
Em meio às tais imagens asquerosas.

32980

Queria pelo menos um descanso
Aonde num remanso se mostrasse
A vida sem saber sequer da face
Decomposta que agora em vão alcanço,
E quando sobre os restos eu avanço
Porquanto a tempestade ainda grasse
No tanto que deveras me desgrace
Ainda quero ser ou sou mais manso.
Velejo em fantasias mares tantos...
E bebo da esperança seus encantos,
Acordo solitário e em pleno riso,
Queria alguma paz, e pelo menos
Instantes que pudessem mais amenos
É tudo na verdade, o que preciso...


32981

Apenas meu olhar e nada mais
Expressa a realidade do vazio
No qual por vezes tento e desafio
Sabendo-me distante de algum cais,
Restando do passado em temporais
A velha sensação do ausente estio
E neste mergulhar ainda crio
O peso dos meus dias, velhos ais.
Desfaço o meu caminho a cada ausência
E nesta sorte tento a confluência
Gerada pelo fardo do viver.
E mudo, simplesmente ainda tento
Vencer com calmaria qualquer vento
E neste mesmo instante a me perder...

32982

Não vejo mais tristeza ou alegria
Seguindo calmamente até a morte
E nada que deveras me conforte
Nem tampouco ainda em heresia
Transtorne ou novamente cria
Mundana sensação de gozo e sorte,
Não sou tão frágil nem tão forte,
Apenas brisa leve que se guia
No sol, no imenso sol, e nada mais.
Urgindo em minha vida novo cais?
Cansado até demais para tentar,
As somas já não tento nem invento
Alheio ao que é prazer ou sofrimento,
Aos poucos me entregando sem lutar...

32983

Resisto e tão somente até por que
O tempo não perdoa quem se entrega,
Porém minha alma segue amarga e cega
E tanto desejara e nada vê
No pouco ou neste tanto que inda crê
Por vezes, um poeta, já navega
E quando se percebe, ora renega
E tenta desfazer; busco e cadê?
Não posso ter ainda alguma luz,
Restando a sombra amarga do vazio
Sonhar é quase mesmo um desafio,
Ao qual com toda força eu já me pus,
Mas a alma não se cala em rebeldia
E bebe a se fartar da poesia...

32984

Espúrios caminhares entre tantos
E resta tão somente o meu passado
Diverso do que fora imaginado
E dele sorvo ainda velhos prantos
Jogando meus pedaços pelos cantos
O todo não se mostra mais traçado,
E ainda que pudesse ser logrado
Não resistiria aos vãos quebrantos.
Seguindo cada estrela sem saber
Do fim da mesma história, nada a ver
Somente esta sombria noite eterna,
E quando nos teus olhos me encontrei
Por pouco, novamente me enganei
Achara descoberta uma lanterna...

32985

Nascendo dentro em mim riacho aonde
O tempo se perdera sem sucesso,
E quando ao meu começo enfim regresso
É nele que minha alma já se esconde,
Porquanto a fantasia perde o bonde
Porquanto a vida trague este progresso,
No todo que sonhara, retrocesso
E assim vou perseguindo qualquer fronde
Que possa traduzir esta alameda
Por mais que a própria vida me conceda
Momento de alegria, tudo é vão,
Nascendo dentro em mim a fonte imensa
E nela a cada dia esta alma pensa
Buscando ao fim da vida a direção.


32986

Depois de tanto tempo imaginara
A cena de um passado mais feliz
Porém a própria vida nada quis,
E agora se restando chaga e escara,
O canto que acalenta desampara
A fonte já não mostra o chafariz
Do amor quem fora outrora um aprendiz
Agora não se vê na fronte amara,
Repito com ternura ainda os versos
E quando invento luzes e universos
Eu sempre me enganando, tolamente,
Mas sei que nada resta deste todo,
Quem vive tão somente a lama e o lodo,
Sonhando com o brilho, ledo, mente...

32987

Pudesse retornar à velha casa
Aonde se fez tanto em poucos dias,
Mas nada do que trame em harmonias
As horas são diversas, frágil brasa
E o quanto em poesia nada embasa
Espalha pelos cantos fantasias
E morro sem saber das alegrias
E delas nem sinal, a vida arrasa
E deixa infelizmente esta mortalha
Aonde novamente a sorte talha
Puindo o que restara da esperança,
E morto em vida tento algum respiro,
Mas quando neste abismo eu já me atiro,
A morte novamente assim avança.


32988

Aonde se fizera algum sorriso
Eu vejo tão somente o mesmo espinho,
Seguindo o meu caminho mais sozinho
O passo nunca mais fora preciso,
E o medo transtornando o meu juízo
E sem sentir a paz onde me aninho?
Morrendo sem ninguém tanto carinho
Ainda necessito e vem granizo...
Pudesse te encontrar em lua cheia
Rondando a minha noite em luz perfeita
E assim a própria sorte não rodeia
Deixando o meu caminho em solidão,
A morte a cada dia mais se aceita,
Quem sabe seja mesmo a solução?

32989

O mundo digerindo cada passo
Destrói toda centelha de esperança
E quando no vazio a voz se lança
Ao mesmo tempo o dia já não traço,
Mergulho neste nada e me desfaço,
A voz ao léu sem rumo, ora se cansa
E a sombra aterroriza, fina lança
E bebo do terror a cada espaço,
Moído pela vida, insensatez
E nela cada dor aonde vês
Apenas o fantasma do que fui,
Qual rio que seguindo sem destino,
Buscando alguma foz, já não domino
E sem saber sequer por onde flui...

32990

Amei e me entregando sem saber
Aonde poderia ser feliz,
Deixando em desencanto a cicatriz
E nela coletando o desprazer
Vencido pela fúria posso ver
As chagas entranhando este infeliz
Caminho aonde o sonho ainda quis,
Restando tão somente o nada ter.
Morrendo sem saber qualquer sentido
O mundo noutro tanto destruído
Brumosa tarde cai sobre o cenário
E assim o temporal que eu adivinho
Deixando-me decerto mais sozinho,
Num ar mais que temível, temerário...

32991

Medonhas noites traçam dias claros?
A esperança renovável como fosse
O pote arrebentado sem o doce
E nela seus delírios não são raros.
Mas quando se aproxima a mesma bruma
O tempo variável não permite
Que ainda se perceba sem limite
O quanto o meu olhar não acostuma.
Resisto e vez em quando ainda rio,
E tanto ou muito pouco do que eu era
Resume o que pudesse em primavera
E sei quanto é mentira ou desafio.
Levando a minha vida simplesmente,
Navegando ao sabor desta torrente.


32992

Ainda que eu pudesse acreditar
No quarto abandonado da esperança
E nele a solidão deveras dança
Tocada por um raio de luar,
E mesmo se eu pudesse navegar
O fim, imenso cais já não se alcança
Quem tenta sem amor ou temperança
Jamais alguma coisa há de tocar.
Legando ao meu futuro alguma sombra
Que ainda se permite enquanto assombra
Moldando a cada ausência novo tempo.
Vendendo a solidão, isto é bem claro,
O amor que ainda nego e não declaro
Seria no momento um contratempo?

32993

O corte da navalha adentra o porto
E marca com seus erros meu caminho,
Quem tanto se fizera mais sozinho
Agora se percebe semimorto,
O tempo preparando algum aborto
E nele sempre ausente este carinho,
O resto do que eu fora, me avizinho
E tento caminhar, buscar conforto
Aonde nada houvera nem havia,
Inutilmente tento a poesia,
E a paz que ainda tento não se vê
Matando com ternura o velho amor,
Espero novo templo, redentor,
Mas sei que a vida resta sem por que...

32994

Passando a limpo a vida neste instante
Percebo num espelho esta verdade
E quando quis saber tranqüilidade
O fato se mostrara degradante,
Na senda desvendada, um imigrante
Que aos poucos outros sonhos busca e invade
No todo aonde vive e se degrade
O corpo se imergindo, vil farsante.
Negando o meu destino, desatino
E quando nada mais sequer domino,
Encontro este menino que morrera,
E tanto do passado me alimento
Buscando inutilmente este provento
Que o tempo sem limite pervertera.

32995

Balanças os quadris e vês o fato
Do sonho realizado da galera,
Mas quando novo tempo já se espera
Apenas retratando outro maltrato,
Assim sem poder ter nas mãos o prato
A fome com certeza mais tempera,
Quem tanto desejara desespera,
E sei que no final nada arrebato,
Somente a mesma velha fantasia
E nela toda a senda se veria
Desnuda do que fora uma ilusão,
Amigo, a vida sempre foi assim
Vazio em sobremesa, triste fim,
Restando a quem caminha a tentação...


32996

Bebendo mais um trago da aguardente
Deixada sobre a mesa por acaso,
O tempo vai perdendo rota e prazo
No quanto mais vazio se apresente.
Vivera simplesmente qual demente
E ainda sem saber se eu quero, atraso
E beijo cada sombra deste ocaso
No qual a vida entrega plenamente,
Viver sem amanhã e sem saber
Se ainda poderia amanhecer
Depois de tantas noites solitárias;
A paz tão esperada, falsa luz
E ainda quanto mais lutando opus
Resistem bem ao longe, luminárias...


32997

O que seria da vida sem te ter?
Medonha face exposta da mentira
E quanto mais a luz já se prefira
Maior a turbulência eu posso ver,
Sentindo a cada passo o desprazer
Aonde a realidade ora me atira,
A vida não acerta mais a mira
E o mundo desabando no meu ser.
Não vejo outra saída e nem que eu queira
A sorte dos meus braços, derradeira
Há tanto se perdera noutra cena,
Resisto tão somente por sonhar
Embora veja ao longe este luar,
Enquanto a bruma imensa me envenena...


32998

De repente poderia acreditar
No amor que se fizesse mais presente,
E tudo quanto ainda se apresente
Negando a minha vida, devagar,
Gerando este vazio a demonstrar
O quanto a solidão se faz freqüente
Na vida de um escombro, de um demente
Um barco que não tem onde ancorar.
Naufrágios são comuns, eu te garanto
Restando novamente dor e pranto
Aonde não se vê mais qualquer brilho,
Bebendo gole a gole deste hospício,
Cavando com meus pés o precipício
Inferno em própria vida, assim eu trilho.

32999

Não posso perdoar sonegação
Do sonho mais feliz ou mesmo fraco
E quando noutro porto ainda atraco
Errando vez em quando a direção
Talvez encontre ali a solução
Comendo da esperança mero naco,
Ao quanto poderia se inda ataco
Resposta que virá; decerto é não.
Jogado pelos cantos, sem sentido,
O peso do viver não dividido
Sorriso desdentado desta morte,
Arcando com meus erros novamente,
O beijo que eu buscava já se ausente
Prevendo ausência mesma de suporte.

33000

Sorrisos de ironia costumeiros
Verdade é que eu mereço, errei demais.
Mas quando se percebem vendavais
E neles os meus passos derradeiros,
Ainda poderiam verdadeiros
Momentos noutros tantos desiguais,
E tudo se mostrando em madrigais
Aonde vez em quando ainda esgueiro
E tento renovar o já perdido,
O espelho mostra o tom envelhecido
E a roupa ora puída da esperança
Retalhos sobre a cama, nada além
Ainda a solidão é o que convém
A quem ao desengano enfim se lança.

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