30156
Nesta luta incessante em que eu pudesse
Vencer o meu temor no dia a dia
Usando tão somente a poesia
E nela só por ela, como em prece
A vida noutro tanto já se tece
E cada nova dor não mais se cria
Rendido aos bons alentos, fantasia,
Deveras com ternura se obedece
Ao sonho mais gentil e sendo assim
Meu verso se espalhando sem um fim,
Gerado pelo gozo incomparável
De um dia mais feliz, leda vontade,
E quando a realidade já me invade
O sonho se tornou tão improvável...
30157
Necessito da força quando luto
Para vencer meus medos e temores,
E quando noutro rumo tu te fores
Esboça-se um momento bem mais bruto,
A sorte se mostrasse em torpe luto
E sendo mais comum, tantos terrores
Não pude controlar os meus humores
E tento mesmo quando nada escuto
Arrisco-me a sonhar, mera esperança
E nada além da morte já me alcança
Cansado de tentar inutilmente
Vencer os meus demônios, nada faço
E quando a cada dia perco espaço
Um cais bem mais distante não se sente.
30158
Para ser conquistada a sorte plena
É necessário mesmo caminhar
E tendo mais distante algum luar
Somente este vazio me serena
A vida por si só já me condena
E dela não consigo mais calar
A voz incomparável a gritar
Mudando com terror a mansa cena,
Senzalas que me deste, inda trago
E bebo cada gota sem afago
Caindo na mesmice da ilusão
Amor pura crendice? Tu disseste,
E quando me percebo em solo agreste
Esqueço n’algum canto o velho grão.
30159
Erguendo sobre os pés os meus anseios
Vivendo sem saber se terei sorte,
Porquanto a própria vida não conforte
Adentro sem saber antigos veios
E colho dos atrozes vis receios
E deles construindo um falso norte,
A cada negação maior o corte
Os dias são deveras mais alheios.
Restando dentro em mim uma esperança
Vazia mesmo quando em tons se lança
Tentando novo brilho, outro matiz,
Quem dera se pudesse a florescência,
Porém amor se faz em convivência
E assim quem sabe um dia eu sou feliz.
30160
Jamais o mesmo amor que tu me deste
Será de certa forma o que eu queria
Aonde se espalhasse a fantasia
O mundo não entorna medo e peste,
O quanto do passado inda trouxeste
E nele se refaz esta utopia,
Usando a mesma velha melodia
Sem ter qualquer caminho que me ateste
Da glória que virá, embora seja
A vida muito além desta sobeja
E rara maravilha que se vê.
As dores fazem parte do cenário,
Porém espinho sendo necessário
Dará para o jardim vivo por que.
30161
Tu és o que sonhei e nunca minto
Razão para viver e ser feliz,
Mas quando a realidade já não quis
Amor ao se mostrar agora extinto
Deveras não trazendo algum instinto
Somente transmudando este matiz
O céu eternamente opaco e gris,
De cores mais alegres já não pinto,
Desta aquarela feita em fantasia
O quanto noutro tempo poderia
Trazer algum alento e nada vejo
A cena do passado mais distante
O mundo que quisera fascinante
Perdido nalgum canto em vão desejo...
30162
Em ti cada sorriso poderia
Traçar novos momentos, mas a vida
Que tanto nos maltrata ou mesmo agrida
Não deixa que se veja novo dia,
Amar sem ter limites? Utopia.
Porém a antiga estrada ora perdida
Prepara para a amarga despedida
E torna sem sentido a poesia,
Resisto aos temporais, mas nada disso
Permite que se creia em novo viço
Aonde movediço meu caminho,
E tanto sem destino, rumo ou meta,
A vida de um atroz, louco poeta
Explica o caminhar tolo e sozinho...
30163
Atados pelos laços da paixão
Pudéssemos seguir a vida afora,
Mas quando esta saudade me devora
Traçando novamente a negação
Vivendo do que fora solução
A morte pouco a pouco rememora
O dia mais feliz e vai embora
Mudando desde já tal direção
Resisto quanto posso, mas não vejo
Saída aonde um dia procurava
Das cinzas da emoção, antiga lava,
O tempo não traria este azulejo
E morto sem saber se ainda existe
Um porto, o coração mordaz e triste...
30164
Amor em nossas vidas? Ledo engano,
Jamais acreditei noutro caminho
Não fosse da ilusão; tolo vizinho
O tempo renegando cada plano,
E quando mergulhando em oceano
Abismo e precipício; eu faço o ninho
E neste imenso vão se já me aninho
Do quanto poderia não me ufano.
Mortalhas que teci durante a vida
Agora me cabendo muito bem,
O amor quando demais, nada contém
Senão a própria morte sendo urdida
E tanto poderia, mas sem ter
Só resta a quem porfia, então, morrer...
30165
Meu mundo nos teus braços? Fantasia
Que a vida sonegou faz tanto tempo,
O amor que não vencera contratempo
A cada nova história se perdia.
Restando tão somente esta quimera
E dela não se vê mais solução
Aonde quis deveras o verão
Ou mesmo algum outono ou primavera
Inverna-se em granizo e tempestade,
Geadas dentro em mim, nevasca e frio,
Ainda insanamente desafio,
Mas quando vejo a morte que me invade,
Não resta outro caminho, sigo em frente
Até que esta mortalha me apascente...
30166
Uma felicidade imensa dita a sorte
De quem sabendo o quanto amor permite
Não deixa que a verdade se limite
Ao quanto o dia a dia nos conforte,
E tendo a sensação de raro aporte
Vivendo cada cena no limite
Assim ao se entregar ao que acredite
Perfaz desta ilusão sobejo norte.
Mas tendo dentro em mim esta incerteza
Do quanto poderia ser melhor
Um mundo mais tranqüilo, ou tão pior
Se tudo já perdesse em tal tristeza.
Não tenho as esperanças do menino
Que há tanto nos sobrados da ilusão
Fizera com ternura cada chão
E agora mais distante não domino
As rédeas do que fora uma alegria
Restando ao velho peito, esta agonia...
30167
Tramando toda noite outra esperança
Depois das tempestades dia a dia,
O quanto deste amor é fantasia
Ao nada, ao mesmo lodo já se lança
E quando ainda busco temperança
A sorte se revela em rebeldia
E amor se transformando em heresia
Penetra com firmeza, dura lança.
Mortalha desta vida inútil temo
O quanto não podia acreditar
E vendo sobre brumas o luar,
A nau sem direção sem leme ou remo,
Navega sem destino, perde o porto,
O amor que tanto quis, agora é morto...
30168
Vibrasse em nossos corpos o desejo
Que tanto produzira uma ilusão
Há tempos já mudando esta estação
O quanto se perdera e agora vejo
Vazio o caminhar antes sobejo,
Anseio por momentos que trarão
De novo ao meu caminho a redenção
Restando tão somente dor e pejo.
Audaciosamente eu procurei
As sendas mais bonitas e floridas,
Assim ao perceber as despedidas,
Não pude e nem concebo ser o rei
Deste cenário feito em treva e dor,
Ausente dos meus braços, teu calor...
30169
São páginas relidas tanta vez
Amores entre dores e promessas
E quando nova história recomeças
Revejo o que o passado já desfez
E tento ainda em rara lucidez
Vencer as emoções e sendo dessas
Escravo enquanto pude, mas confessas
Diverso caminhar e nele crês.
São mansos os primórdios de um amor,
A tempestade gere seu final,
E quando se mostrara assim a nau
Em pleno temporal, perdendo a cor,
Acordo solitário novamente
Do quanto esta ilusão eu sei se ausente.
30170
Encontro o meu caminho em noite fria
E bebo cada gota em luz diversa
Falando da emoção aonde versa
O quanto pode enfim a poesia
Não tento mais lutar, a alma porfia
E sabe desta senda mais perversa
Recomeçando assim nossa conversa
A história se repete dia a dia.
Um tempo após o tempo de sonhar
Em contratempo morto algum luar
Luzindo sobre nós a falsa estrela
Que tanto já não guia e nem transforma
O amor quando se perde, em nova forma
Da frágil, tosca luz, não posso vê-la...
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