quarta-feira, 23 de março de 2011

Sertanejo coração
Quando fala de Maria
Que sabendo deste não
Destinava a hipocrisia
Vendo as tardes de verão,
Sol imenso só traria
Sem a chuva no sertão
E miséria a cada dia,
Esbarrando nesta barra
Sem saber de qualquer chance
Do que tanto se desgarra
Do tormento onde me lance,
Próprio tempo expondo a garra,
Sonho além jamais se alcance.


2

Preso aos meus erros seguindo
Os caminhos do não ser,
O que fora e não deslindo
Traz as formas do sofrer,
E o meu céu vai se esvaindo
Nos entojos do querer,
Quando o tempo decidindo
Salta aos olhos, posso ver.
Lembro de outros dias quando
Dentro da alma o que haveria
Jorra sempre me mostrando
Esperança e fantasia,
Mas agora se negando
Só restando esta agonia.


3

Com ciúmes do passado
Meu presente não suporta,
Cada vez que vê ao lado
O que fora a minha porta,
Num momento apropriado
A saudade vem e corta,
Deixa tudo bagunçado
Esperança enfim se aborta.
Dos pesqueiros da ilusão
Já não tendo qualquer marca
Do que possa o coração
Quando a vida não abarca
Vejo apenas num clarão,
A emoção, embora parca.

4


Lavaria meu olhar
Nas tramóias da existência
E cansado de lutar,
Contra qualquer exigência
Desta vida a se mostrar
Nos anseios da carência
Gera o quanto se tomar
Sem buscar a coerência.
Não poupasse de tal forma
A ilusão que me alimenta,
O caminho se transforma
E sabendo da tormenta
Procurando uma reforma
Que não seja mais sangrenta.

5

Quando a vida se prepara
Nas estâncias da tocaia,
Penetrando esta seara
Toda a sorte que nos traia,
Vaga além do que se ampara
A dorida fantasia
E morrendo em noite clara
Outra sorte não veria,
Invernada? Nem sinais,
Neste estio interminável,
Ouso crer que ora jamais
Novo dia imaginável
Adentrasse em nossos cais,
Neste solo enfim arável.

6

Eu jamais fui preguiçoso,
Mas a chuva que não vem,
Deixa o tempo mais rançoso
Olha a sorte com desdém,
O que possa caprichoso
No final traz o que tem,
Um momento doloroso,
Tão distante de algum bem.
E na ponta do punhal,
Numa bala já perdida,
Imergindo no fatal
Caminhar em rude vida,
De esperança? Nem sinal...
Lida amarga e tão sofrida.

7

Mas quem sabe no futuro
Deposito novo sonho,
Este céu ficando escuro
Apagando o azul medonho,
E talvez no solo duro
O cenário onde componho
Verdejando, eu asseguro
Trace um passo enfim risonho.
Nas tramóias da fortuna,
Nos enganos desta sina,
Inda mais quando reúna
Cada mão mesmo assassina
Num cantar, bela graúna,
Assum preto me fascina.

8

Nos primórdios do meu canto
Ouço a voz desta memória
Que se gaba deste encanto
Ao correr da minha história,
Mas a vida em seu quebranto
Torna a noite merencória,
E o que fora, hoje garanto,
Resumindo em triste escória.
Dos escombros talvez venha
Um caminho que redima,
Modifique e traga ordenha
Ao traçar em novo clima
O que tanto seja e tenha
No meu peito a rara estima.

9

Liberdade, ainda quando
Sei que surja mais tardia,
O meu sonho se notando
No cenário onde teria,
Um anseio ao menos brando
Feito em tons de poesia,
Mergulhando e me entregando
Onde tudo mais se via.
Servilismos? Nem pensar
Já não quero ser vassalo,
Solto etéreo galopar
Nas asas do meu cavalo,
E bebendo do luar,
Ao cantar de cada galo.


10

Nos meus dias mais doridos
Nos meus cantos mais ferozes,
Outros tempos revolvidos
Sem saber sequer das vozes
De quem sabe meus sentidos
Entre tantos vis algozes,
Os meus olhos resumidos
Nos cenários, duras fozes.
Resumindo o verso em paz
E sabendo do que possa,
Transformar e ser capaz
Revivendo a viva roça
O momento mais audaz,
A palavra agora endossa.

11

Nas tomadas cenas tantas
Onde veja sem temores,
O que queira e me garantas
Seja lá por onde fores,
Ouço a voz quando adiantas
Os sentidos em amores,
Vago enquanto me acalantas
Dos canteiros, belas flores;
E num prado verdejante
A colheita garantida,
O caminho que agigante
Modifique cada vida,
E seguindo doravante
Sem pensar em despedida.

12

Poderia ser assim
E talvez o que inda reste
Traga o mundo dentro em mim,
Mesmo quando o rumo já não preste
E decerto chego ao fim,
Num momento mais agreste
Revivendo de onde eu vim,
Meu olhar em meio à peste
Trama o sonho que pudera
Ter nas mãos a liberdade
Apascento a minha fera
Quebro e rompo a velha grade
Esperando a primavera,
Que inda longe, quero e brade.

13

Presunçosa a vida traz
Outro tom quando se esvai,
O caminho se perfaz
Onde o nada me distrai,
Vejo o quanto sou capaz
E esperança quando trai,
Vence o sonho e nada faz,
Tão somente se descai.
Resultado desta luta
Sem saber da sensação
Mais diversa onde se escuta
Os temores que virão,
Desenhada em força bruta,
Tendo paz é solução.

14

Corrediço o nó do sonho
Que jamais se fez além
Do momento onde eu proponho
E deveras nada vem,
Este tom rude e bisonho
Não provoca em mais ninguém
Outro verso que proponho
Ou cenário em claro bem.
Sigo as tramas desta tralha
Que se chama coração
Perco sempre esta batalha
Na difícil decisão,
Quando a vida ora se espalha,
O meu canto dita o não.

15

Brigas tantas com o quanto
Pude ver e não sabia
Na verdade quando canto
Não concebo uma alegria,
Meu olhar em raro espanto
Minha voz em agonia,
O sertão aonde eu planto
Nem um grão já me daria,
Mas na luta sem final
Na secura desta pele,
O que traça em desigual
Caminhar ao fim compele,
Eu nasci e tal e qual
Morte em vão trama e revele.

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