domingo, 20 de março de 2011

A SOLIDÃO É FERA

Não falei de Lampião
E sequer de cangaceiro
Sendo lá do meu sertão,
Na verdade sou mineiro,
Noutro rumo e dimensão,
Não conheço Conselheiro,
Mas luar na imensidão,
Bebo sempre por inteiro,
E num gole de cachaça
Nos bailados do catira
Solidão decerto passa
Quanto mais a terra gira,
Noutro passo a mesma praça
Onde amor sempre interfira.

2

Nas verdades mentirosas
Nas mentiras verdadeiras
Quanto mais além tu gozas
Também logo ali te esgueiras,
No que possam tantas rosas
As palavras jardineiras,
Muitas vezes caprichosas
Cultivando as derradeiras,
Nada tive e nem teria
Nos anseios de quem trama
Ao vencer a noite fria,
Esperança apaga a chama,
E sequer a fantasia
Noutro tom diverso clama.

3


Ao nascer em meio às serras
E descendo estas montanhas,
As palavras que descerras
Adivinham tantas sanhas,
E se tanto agora enterras
As verdades são tamanhas,
Mas se tanto um passo; emperras.
Nada vejo e nem pudesse
Mesmo assim em tal cortejo
Procurando qualquer prece
Nada mais sequer eu vejo,
Coração nunca obedece
Aos anseios de um desejo.


4


Jamais pude conformar
Com a sorte maltrapilha
E decerto ao procurar
A saudade já me pilha
Sem saber de algum lugar
Noutro toque uma armadilha
E o meu mundo a se negar
Sonegando aonde trilha,
Vagão segue sem saber
Do que faz locomotiva,
Outro tempo a se perder
Numa sanha jamais viva,
Pude tanto conceber
Esta luta, lenitiva.

5

No caminho em pedregulho,
Na aridez de uma esperança
Outras vezes num mergulho
Onde a fúria audaz alcança
O momento aonde orgulho
Faz das suas, a lembrança
Prometendo mais barulho
Do que tanto agora avança,
Não sabendo qualquer rumo
Desta sorte em covardia,
O meu passo hoje resumo
No que tanto não podia,
Outro tempo e se me esfumo,
Sou deveras fantasia.

6

Jagunçada sertaneja
Na tocaia me esperando
Onde quer que tudo veja
Outro passo demonstrando,
A verdade que lateja
Torna o passo mais infando,
E deveras como seja
Ou sequer talvez nem quando,
Mestra noite em lua cheia
Ensinando ao coração
O quanto a vida anseia
Noutra imensa sensação
Onde amor já me rodeia,
Novos tempos se verão.

7

Bebo um gole de aguardente
Nesta boca da saudade
O que quer e se apresente
Noutro passo já degrade
O meu mundo descontente
Sem saber da velha grade,
No final quase demente,
Não percebe a liberdade,
Ouso até acreditar
No que nada representa
A verdade de um luar
Quando a sorte diz tormenta,
Vago além e ao me notar,
Esperança se aposenta.

8

Na incerteza deste passo
Sem saber de algum final,
Outra vez se descompasso
Bebo o rito em corte e sal,
Na incerteza que já traço
Meu momento desigual,
Vejo apenas no cansaço
O que possa um ritual,
A verdade não se cala
Nada falo e sigo em frente,
Adentrando quarto e sala
Quem me dera estar contente,
Porém alma hoje vassala
Noutro passo se apresente.

9

Mergulhando no passado
Vejo as sombras de quem fui,
O meu mundo abandonado
Quando em duro ocaso rui,
Traça o velho desgraçado
Caminhar enquanto influi
No momento desolado
Meu anseio nada intui,
Vendo a sombra do que outrora
Inda trouxe alguma luz,
O cenário não demora
E deveras não produz
O que tanto sei agora
E somente nunca pus.

10

Mas um dia quando o mundo
Resolvesse os seus problemas
Ao romper o quanto algemas
Coração mais vagabundo
Quanto então em ti me inundo
Nada temo, e nada temas,
Mergulhando no profundo
Desenhar em vagos lemas,
Apresenta a solução
Ou talvez ainda venha,
Colocar nesta emoção
Tanto fogo quanto lenha,
Numa frágua o coração
Já sem nada que o contenha.

11


Quando conto minha história
Sem saída e sem proveito
Luta atroz e merencória
No vazio onde me deito,
Nada trago na memória,
Mas decerto eu sempre aceito,
Caminhar sem esta glória,
Funcionário sem seu pleito,
Se eu casei, amei e agora
Sem ninguém que tanto apóia
A verdade então se aflora
E o meu peito apenas bóia
Lua imensa sem demora,
Derradeira e clara jóia.

12

Vou sozinho e sei que nisto
Nada tenho de diverso
Do caminho aonde insisto
No cenário que disperso,
Outro tempo eu não existo,
E se vens eu desconverso,
Um presente tão benquisto
Já não tento em qualquer verso.
Dos amores, nem sinal,
Dos carinhos, onde estão?
O que resta em ritual
Minha vida desde então
Traduzindo a sem igual
E tão louca solidão.

13

Ao fazer meu testamento,
Nada tenho, nem herdeiro
Minha vida solta ao vento,
Quando em vão agora inteiro
O caminho alheamento
Noutro passo o derradeiro,
Transformando este momento
Adubando este canteiro.
Sem as rosas que plantei,
Sem os sonhos que sonhara,
No vazio desta grei
No não ser de uma seara,
O que tanto imaginei,
Já não vem nem se escancara.

14

A verdade nos liberta,
E decerto nada sou,
Nesta porta sempre aberta
Ninguém nunca um dia entrou,
A palavra se deserta
E com ela também vou,
Numa sebe sempre incerta
Todo sonho abandonou.
O passado sem presente
O presente sem futuro,
Onde quer que se apresente
O meu mundo segue escuro,
E se possa imprevidente,
Procurando um chão seguro.

15

Nesta carta que ora lês
A verdade do vazio
Desta vida sem porquês
E do mundo ledo e frio,
Demonstrando a pequenez
Do que possa em tom sombrio,
Tanta gente que ora vês
Tendo o mesmo desafio.
Sem ter nome ou sobrenome,
Num bom dia ou mesmo tchau
Logo após a sombra some,
Tudo volta ao seu normal,
Se a saudade nos consome,
Solidão, pois é fatal…

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