AMA SECA
Nunca gostei de cães, nunca. Sempre tive certa ojeriza a esses
animais barulhentos, com suas manias absurdas, como arranhar a casa
toda, sujar todos os ambientes, essas coisas...
Todos os cachorrinhos do mundo, em contrapartida, eram adotados por minha irmã, Andréa Cristina.
Deveria se chamar Francisca, tal a mania de trazer filhotes de animais para casa.
Lembro-me
de pelo menos uns dez cães e outros tantos gatos. À noite, durante um
belo par de noites, ninguém conseguia dormir direito com a sinfonia dos
filhotes .
Andréa era cuidadosa e isso fazia com que a maioria
sobrevivesse aos primeiros dias, crescendo amamentados pelas mãos
carinhosas e meigas de Andréa.
Mãos cristinas, verdadeiramente cristinas.
Porém, depois de alguns dias, quando já estavam aptos à sobrevivência, misteriosamente desapareciam.
As
“fugas” noturnas só nos foram esclarecidas depois de muito tempo,
quando meu pai confessou ser o misterioso alforriador dos bichinhos.
Mas
um dia, em Mirai, quando estávamos visitando nossa amada avó, fato que
se repetia nas férias escolares ou nos feriados prolongados, Andréa
abusou.
Àquela época, lá pelo final dos anos sessenta, ainda não
havia essa conscientização com relação aos animais silvestres, portanto o
estilingue ou atiradeira, era um dos brinquedos mais usados pelas
crianças, além da espingarda de chumbinho.
Os ovos e pintinhos da
casa da minha avó estavam desaparecendo, deixando marcas indeléveis da
presença de algum “nefasto” visitante noturno.
O diagnóstico foi firmado e confirmado – Gambá.
Para
quem não sabe, esse bichinho, além do hábito de comer ovo e pequenos
pintinhos e frangos, tem a incontrolável obsessão por cachaça.
Gosta e gosta muito, bebe até cair e, depois disso, ali fica, rindo e satisfeito.
Feito isso, é só dar uma paulada na cabeça e a ninhada agradece.
Um belo dia, após terem sido executadas, com êxito absoluto, as táticas de guerra, meu tio anunciou a morte do fedorento animal.
Passados alguns instantes, eis que surge a minha irmã com uns cinco ou seis pequenos animais rosados nas mãos.
Não era gambá, era gamboa. E estava com uma ninhada dentro da bolsa.
O marsupial deixa o filhote na bolsa até completar o crescimento desses.
E, por sorte dos filhotinhos, isso estava para acontecer a qualquer momento quando houve a execução.
Pois bem, a franciscana Andréa, para assombro de todos e repugnância de alguns, menos do meu pai, resolveu adotar os bichinhos.
Esses
cresceram e, desta vez, sem ajuda do abolicionista Marcos Coutinho
Loures, deram vazão a seus instintos selvagem e fugiram, deixando minha
irmã extremamente tristonha.
Ama-seca de gambá, primeira e última de que tenho notícia.
MARCOS LOURES
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