segunda-feira, 4 de abril de 2011

21

O tempo se aproxima do momento
Aonde se decide tudo ou nada,
E quanto mais adentro em tez velada
O fim se aproximando, em ledo intento.

E possa imaginar, ao menos tento,
A velha construção já destroçada
E apenas ao vazio a rota escada,
Erguida nos degraus do sofrimento.

Etéreo caminhante do finito
Adentro esta senzala e quando a fito
Não vejo outro cenário: eternas trevas

E quando imaginasse por ventura
A sorte que infundada se procura,
Sobre o cadáver pútrido, tu cevas.

22

Não presumisse a vida de tal forma,
Arcando com meus ermos e vazios,
O dia prosseguindo segue os rios
E a luta a cada instante me deforma;

Apenas o que resta mal se informa
E os vagos delirares, tão sombrios
Os termos onde vejo em desvarios
As sendas quando a vida se transforma…

Somente resta então esta carcaça
E o tempo que se esvai ora esfumaça
E segue em terminais diversos, rudes.

O quanto em ironia tu professas
Revives do passado tais promessas
E sei que no final te desiludes.

23

Negar o que não vejo e nem pressinto,
Talvez possa trazer ao teu olhar
O mundo tão diverso a se traçar
No quanto este vulcão agora extinto.

O tempo de outro tempo vai distinto
E o néctar não refaz e ao sonegar
A etérea sensação de navegar
Defesa desdenhosa e não consinto.

Invólucro desfeito, meus destroços,
Somente restarão porosos ossos
E o fardo da existência se desfaz.

Não quero e nem presumo nova chance,
Somente no vazio a morte lance,
Trazendo a entediante e opaca paz.

24

Quisera poder crer noutro momento
Em divergência clara com o quanto
Tramara a vida em ledo desencanto,
De um tempo exposto ao rude e turvo vento.

Apenas onde creio e mesmo tento
Ousar além da queda em rude espanto,
O verso não traduz e não garanto
Sequer o que renove o sofrimento.

Contraditório; sigo e não presumo
Nem mesmo o quanto possa em vão resumo
No acréscimo de um tempo sem valia.

E morto, pelo tempo abandonado,
O verso na gaveta, embolorado,
Expressa o que jamais resistiria.

25


Não quero este otimismo do imbecil,
Tampouco me iludir. Tudo já basta.
A vida noutro instante a vejo gasta
Em tom decerto sórdido e sutil.

O quanto desta história ora se viu,
A rota sensação que nos afasta
Do quanto poderia, mas a casta
Dos sonhos noutro tom não permitiu.

Dos deuses que inventamos; nosso alento
O corte na raiz traduz o fato
E quando o nada após teimo e constato,

Embora novo sonho vago; tento
O preço a se pagar; não mais resgato
O corpo ora servido em rude prato

26

As vísceras expostas da esperança,
São tétricas, porém tudo alimenta
A sórdida ilusão, venal, sedenta
Buscando com o nada uma aliança.

Propensa ao que não tenha, a vida lança
A luz inutilmente e sempre tenta,
Porquanto da ilusão que ora fomenta
Entoa na alma simples, temperança.

Já não precisaria de milagre
Tampouco divindade ou vil castigo,
A sorte por si mesma ora nos sagre

Ou traga em ódio e rude pestilência,
E quando em paz ou quase, assim prossigo
Permito com a morte, convivência.

27


Disseste de um momento redentor?
Não bastaria o tédio desta vida?
Após a desejada despedida
O quanto do vazio a recompor?

Embora frutifique cada flor,
Semente traz a forma evoluída,
Mas nada se eterniza e já perdida
Presume o dia fúnebre do ator.

Enceto este caminho, mero inseto
E quando o ciclo aqui, enfim completo,
Apenas me despeço e sigo ao nada.

Lamentos? Na verdade eu agradeço.
Quem fora na existência um adereço
Imagem pelo tempo abandonada...


28

Eternizar o que? Nada me resta,
A pútrida esperança; decompões
E sei das mais diversas ilusões
Assim como da luz turva e funesta.

Já não mais poderia crer na festa
Em ritos tão atrozes, emoções
Jogadas pelo tempo nos porões
E vez em quando vista em leda fresta.

Não quero este funéreo e vago clima,
A morte que decerto me aproxima
Do quanto represento: eterno nada.

Bendita seja então, e nada fale
Enquanto a realidade me avassale
Verdade finalmente escancarada.

29

Amores são verdugos ilusórios
E tramam outros caos onde existia
A luta sem promessa de outro dia
Nem mesmo sonhos calmos, meritórios.

Os dias se repetem – merencórios-
Restando como leda companhia
Somente esta indomável poesia
Resumo dos meus ermos, vãos empórios.

Na sórdida presença de um futuro
Sem paz, sem alegria, ora asseguro
O fim tão ansiado desta peça;

Bufão que imaginara ser possível
Um mundo mais suave e até plausível,
Porém nos próprios pés tanto tropeça.


30

Quisera até falar de amores, sonho...
Palavras que adocicam; mentirosas.
Aonde cultivara algumas rosas
O tempo desolara em tom medonho.

O resto do que sou já decomponho
E sei das minhas noites caprichosas,
Versando sobre trilhas pedregosas,
Da própria poesia, ora me oponho.

Quisera ter nos olhos o horizonte
E ver além do quanto já se via,
Mas quando se aproxima a mais sombria

Verdade noutro tom agora aponte,
E o tétrico momento se desnuda
Sem nada que deveras traga a ajuda.

Nenhum comentário: