31801
Matando, devagar, meu coração
Não pude discernir quem mais traria
Ao menos qualquer canto em alegria
Ou mesmo as tempestades de verão,
No quanto a vida mostra indecisão
E assim ao mesmo tempo a fantasia
Transcende ao que pudesse o dia a dia,
Marcando com terror e ingratidão,
Esboço a realidade em novas cores
Sabendo dos antúrios entre as flores
E nelas o canteiro se refaz,
Mas nada do que eu quis tempos atrás
Momentos muitas vezes sonhadores...
31802
Depois da dolorosa decisão
Aonde se tentara qualquer brilho,
E assim quando sozinho inda palmilho
Noturna e corriqueira procissão
Buscando novos dias desde então
E sendo tão cruel cada empecilho,
O quanto de ilusão teimo e polvilho
Traduz a mesma etérea negação.
Resisto e sei porquanto nada levo
Do tanto que pudesse ser longevo
O sentimento amargo que cultivo,
E tento ser feliz, mero fantoche
Enquanto a vida ri e assim deboche
Dos sonhos pelos quais eu fora altivo.
31803
A chuva nos molhando... O frio vento...
Repete o mesmo outono interminável,
E quando noutro inverno é decifrável
O que deveras sigo e mesmo invento,
Nos ermos deste vago tomo assento
E sei a vida ser mesmo intratável,
O solo que bendigo; nunca arável
Exposto às variáveis de um tormento,
Encarnam o que sei realidade,
E nada do que ainda desagrade
Porquanto brade insólito meu peito,
Dos tantos veranicos, nada resta,
A imagem que se vê torpe e funesta
Reflete o desespero quando deito.
31804
Da cama em que explodiam mil desejos.
Não restam nem estrados, nem sinais,
Os dias se repetem sendo iguais
E neles alegrias são lampejos,
Os sons de velhos tontos realejos,
As sombras de momentos divinais
E os ritos entre pedras terminais,
Os cortes entranhando em pés andejos.
Assim porquanto pude acreditar
Mesmo inconstantes raios do luar
Transcendem ao que pude ter no fim.
Ecléticos caminhos percorridos
E neles outros dias são sentidos,
Interminável ciclo dentro em mim.
31805
Depois as alianças, casamento,
Depois do casamento, desavenças
E assim se renovando velhas crenças
Preparam para o mesmo desalento,
E quando variáveis dias tento
As discrepâncias sendo mesmo imensas,
No fundo as mortes sejam recompensas
Embora com terrores, desalento.
Pudesse ter enfim qualquer partilha
Não fosse tão somente destes bens,
E quando minha parte tu conténs
Ao irmanarmos sonhos poderemos
Atravessar tempestas, calmarias,
No quanto espelhastes os meus dias,
Usando pelo menos mesmos remos...
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