1
Antigos claustros trago dentro em mim
Vazios entre as trevas se compondo,
O todo aonde o medo não escondo
Tomando este cenário trama o fim,
Pudesse adivinhar aonde eu vim
E quando novo passo em mim repondo
Os ermos da existência eu teimo e sondo
Uma colônia imensa, este cupim,
O fato de tentar nova vivência
Sabendo do meu mundo em decadência
Esta excrescência viva que alimento,
Do todo imaginário já me afasto
E vendo este cenário turvo e gasto,
A sorte não traduz qualquer fomento.
2
Aonde se vendera por verdade
A falsa imagem feita em dor e luz,
Negando a consistência desta cruz,
E nela se ausentando a liberdade,
O quanto se percebe e já degrade,
Por isso neste instante agora opus
Do todo iridescente vejo em pus
A mais cruel e torpe realidade.
Ausente de esperança sigo além
Do quanto em sacristias se contém
Nem éden nem inferno, somente ocaso,
Meu corpo se entregando em tal festança
Orgástico delírio agora avança
Reparte-se o total em ledo acaso.
3
Procuras recompensa após a morte?
Ignaro caminheiro do vazio,
O quanto a cada ausência desafio
Sem ter sequer o brilho em que comporte,
Ao ter neste não ser um claro aporte
O olhar não é decerto mais sombrio,
Perdendo com o fim, um frágil fio,
Sem ter alento ou dor que me conforte.
Nem céus ou penitências; nada além
Do corpo decomposto sei tão bem
Gerando nova forma em ares tantos,
Diversidade dita esta verdade
No quanto após o fim já se degrade,
Nem alegrias frágeis, desencantos.
4
Em caudalosos rios fogo e lava,
Ou mesmo em vozes mansas e manás,
O quanto na verdade nada traz
E nisto o meu caminho nega a trava,
Apenas o vazio sente a clava
E nela outros delírios, guerra e paz,
Invento em proteção tal satanás
E como recompensa alma se lava.
Adentro os teus diversos patrimônios
E mato sem perdão torpes demônios
Risíveis caricatos e nefastos,
Ao ver estes cenários já bem gastos,
Herética mentira em providência
Gerando a penitência e a própria sorte,
Transcende a falsa imagem de uma morte,
E teima noutro rumo em vã clemência.
5
Os monges, padres, ritos e pastores,
Rebanhos bebem falsas luzes quando
O templo na verdade se montando
Tentando dirimir imensas dores,
E sei quanto mais forte tu te opores
O mundo te olhará com ar infando,
É necessário sim, o contrabando
Deste perdão após os dissabores.
Vacância eterna e dura pestilência
Representando assim a tua ausência,
Não tendo outro momento senão esse
É como premiar tola criança
E quando mais a vida em fúria avança
É como se os terrores, esquecesse.
6
O campo dito santo na verdade,
Resume-se em cadáveres somente,
E ali se vê brotando outra semente
No corpo quando o mesmo se degrade.
Assim ao se vender à humanidade
A falsa sensação que ora desmente
Realidade torpe onde apresente
Gestando a mais devassa falsidade.
Não creio no perdão como se fosse
O pote delicado em raro doce,
Aonde algum infante se sacia,
Dos mortos tão somente escaravelhos
Deixando sem resposta os evangelhos
E neles vejo a vaga hipocrisia.
7
A morte não traz glória nem perdão,
Apenas terminando a leda história
Jogada pelos ermos da memória
Buscando inutilmente a direção
E quando me adentrar putrefação
Aí se concebendo toda a glória
Renova-se decerto com vitória
O tempo que se fora amargo e vão.
Jogado sob a terra, em tez sombria,
O todo pouco a pouco se esvazia
E os ossos testemunham o que fora,
Um ser já dominado em esperança
E agora quando o nada enfim alcança
Silenciando a senda sonhadora.
8
Pudesse recorrer à eternidade
Teria um lenitivo, não mais quero
O mundo sendo atroz, feroz e austero
Negando com ternura a falsidade,
No corpo que este tempo já degrade,
O olhar impaciente, mas sincero
Aonde noutro tanto destempero
A morte dita o fim em trave e grade.
O passo rumo ao sonho? Mera imagem
Do quanto é tão venal esta engrenagem
Que sempre se alimenta da esperança.
Religiosidade? Tolo mal,
A morte se repete e sempre igual
Quando o cadáver gera a comilança.
9
Guardando neste claustro nada vês
E teimas ter decerto uma razão,
E nela com terrível solução
Do nada ainda geras altivez,
No quanto do vazio tu já crês
E bebes desta fúria feita em não,
Esconde-se da vida e não virão
Momentos onde o mundo enfim se fez.
Um ser opaco ausente, quase fútil,
Uma existência turva mera e inútil,
Tentando redimir o que não sabe,
Sonhando com banquetes, claro céu,
Mal vê que na verdade é seu papel
Servir como repasto aonde cabe.
10
Habito a eternidade em discordância,
Ao menos quero ter novos momentos?
E sei dos mais diversos provimentos
E neles cada passo em discrepância,
O fato de viver sem abundância
Garantiria após claros proventos?
Levado pelo infausto em torpes ventos
Cordeiro se adestrando desde a infância.
Ao aceitar assim sem mais respostas,
As horas, dias, vidas são depostas
E nelas nada resta senão isto,
Ossada em decomposta e mais sombria.
O pouco que tu foste se esvazia
Após o meu final ainda existo?
11
Uma alma se findando com a morte
Negando algum cenário mais diverso,
E quando na ilusão prossigo imerso
Procuro alguma luz que inda conforte.
Na ausência consistente de algum norte,
Um nada não se vê sacro ou perverso,
Apenas deste mundo me disperso
Somente o ermo vazio ora comporte,
Quem tanto perguntara ou aceitara
Das dúvidas e dívidas tal vara
Gerada nos escombros da esperança,
A mão que me punira ou que me afaga,
Não traz sequer a luz tampouco a chaga,
Após o derradeiro o nada alcança.
12
Resumo na masmorra o meu final,
E sei sem quem socorra o quanto busco,
Num ato nem venal, audaz ou brusco,
O tempo não se mostra triunfal,
Naufrago no vazio a velha nau
E tento procurar em lusco fusco
O quanto me ilumino ou já me ofusco,
Ausência de outro tempo original,
O todo que hoje sou é meu legado,
Não temo e nem escondo algum pecado,
Se tanto até perdôo e não me omito
Não é porque na glória eu acredito,
Somente por total mero egoísmo,
Prefiro a paz suave de um sorriso
A ter um mais diverso paraíso,
Ou mesmo este temível; ledo abismo.
13
A vida esta miséria que se espalha
E gera novos deuses cada esquina
Enquanto a massa rude se domina
Na ponta mais cruel desta navalha,
Ausente dos meus olhos tal batalha,
A sede de vingança não fascina,
Somente uma alegria pequenina
Enquanto a sorte além a paz atalha.
Retalhos entre tais retaliações
Em várias discrepantes direções,
Não quero algum alento nem presentes,
Tampouco esta sangria entre meus dentes,
Demônios querubins, falsas imagens
E nelas vejo espúrios torpes pajens.
14
Batalhas entre deuses e diabos
Os santos são imagens demoníacas
E nelas outras formas tão maníacas
Dos tantos dias vários meros cabos,
E quando presencio asas, rabos,
Paisagens discordantes e cardíacas
Geradas por venais afrodisíacas
E nelas entre fomes e nababos,
Ourives da palavra o sacristão,
Vendendo bem mais caro algum perdão,
Vivendo do pecado é mais sutil,
E tanto esta vendeta se previu,
Gerando mais riquezas que promessas.
E assim mal tu caminhas, já tropeças.
15
Apenas vejo agora este espetáculo
Gerado pela insânia de um vivente,
Aonde noutro mundo segue crente
Tentando adivinhar em tolo oráculo,
O corte se aproxima do tentáculo
E bebe cada gole da aguardente
E nele se inebria plenamente
Compondo em desserviço um tabernáculo.
Existe alguma forma após a forma?
Não creio e não preciso deste alento,
Se à terra servirei como provento
Não posso me negar a tal desejo,
E sei que da mortalha que me cobre,
Um ato tanto vil ou mesmo nobre,
Que enfim, sem serventia eu já prevejo.
16
Miséria se espalhando sobre lodos
E nesta fantasia em paz futura
A vida com terror já se amargura
E envolve em imprudência tais engodos,
Macabra realidade? Nada disto,
Existo e tão somente me sacia
Verdade sem venal hipocrisia
Até quando no fim, em paz desisto,
Refeito a velha senda aonde agora
Do ser que imaginara estar inerme
Apenas um banquete e cada verme
Com fúria incontrolável já devora,
O que pensara andara e até sonhara,
Agora a cada instante nova escara.
17
Não quero mais a velha juventude
Nem mesmo a mocidade em tola face,
Porquanto meu final aos poucos trace
Não mais suporto o gozo que me ilude,
E quanto mais ainda a vida mude
E trame com terror o que desgrace
Do tolo caminheiro, nada nasce,
Apenas a matéria se transmude.
E sei do quanto posso ou mesmo deve
A cena sendo rápida e tão breve
A decomposta carne em serventia,
Talvez redima assim um ledo engano
Quem nesta podre vida fora dano
Agora em tal cenário serviria.
18
Dos sóis da juvenil face deposta
Não levo mais sinais e nem os quero,
Assim ao ser deveras mais sincero
Apenas retalhado em fina posta,
A morte noutra face diz proposta
Embora te pareça torpe ou fero
Destino em luz sombria até venero,
Perguntas encontrando em tal resposta
A verdadeira luz que ora se espalha
E tanto neste campo de batalha
Já derrotado e sei que nada vem,
Repasto para a vida que ressurge
O tempo noutro tempo enfim já urge
E após o nada ser serei alguém.
19
Dos frutos renováveis sobre a terra,
A morte me permite a redenção,
E quando mais entranho a podridão,
Destino mais sutil ora descerra,
No pouco ou na semente que se enterra
Percebo a mais perfeita floração
Servindo como tal adubação
Enfim desconhecendo paz e guerra,
Dos ódios, pódios, néscios caminhares
Encontro sob o solo os meus altares
E neles sem saber ou ter o senso,
Aquele que foi parco e inexistente
Agora noutra face se apresente
Num prato delicado em contra-senso.
20
Desolação traduz o meu futuro,
E sei do quanto posso e não renego,
O passo no vazio quase cego,
Do nada aonde teimo me asseguro,
E sei do quanto vago em mundo escuro,
E nada do que penso não navego,
Às ânsias da Natura então me entrego
E assim noutro formato eu já perduro,
Regalo para vermes e bactérias,
Assim ao refazer torpes matérias
E nelas outra forma se moldando,
Abençoado rito aonde entranho,
O jogo finalmente sendo ganho,
Num ato tão voraz, audaz e brando.
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