terça-feira, 22 de dezembro de 2015

Fumo

Florbela Espanca


Longe de ti são ermos os caminhos,
Longe de ti não há luar nem rosas,
Longe de ti há noites silenciosas,
Há dias sem calor, beirais sem ninhos!

Meus olhos são dois velhos pobrezinhos
Perdidos pelas noites invernosas...
Abertos, sonham mãos cariciosas,
Tuas mãos doces, plenas de carinhos!

Os dias são Outonos: choram... choram...
Há crisântemos roxos que descoram...
Há murmúrios dolentes de segredos...

Invoco o nosso sonho! Estendo os braços!
E ele é, ó meu Amor, pelos espaços,
Fumo leve que foge entre os meus dedos!...


Estar longe e tão perto e nem percebes
do quanto existe em nós e nada vês
do amor que imenso sinto e nunca crês,
ainda que eu caminhe imensas sebes...

da fonte radiante que um dia bebes
nesta alameda plena em que os ipês
dominam o cenário, a cupidez
dos sonhos onde intensa sei que embebes

meus olhos te procuram, num relance
e quanto mais a ti, meu mundo avance
jamais me afastarei, pois eis-me aqui,

embora muitas vezes não aceites,
a vida se permite a tais deleites
onde estarei, amor, DENTRO DE TI...

Marcos Loures.

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