ESPIRAL DE SONETOS
1 SONETO
MERA SAUDADE.
1
Pudesse ter ao menos uma vez
O amor do que desejo e não me quis,
Eu não seria assim esta infeliz
Meu mundo não teria insensatez.
Quem sabe poderei ter noutro dia
O encanto que jamais se deu enfim
Talvez ao renascer este jardim
Encontre no caminho a poesia.
A moça dedicada do passado,
Menina enamorada em seu castelo
Momento delicado e mesmo belo,
Há tanto que percebo abandonado.
As rugas não desmentem a verdade
Restando do que fui, mera saudade...
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Restando do que fui, mera saudade,
O olhar enternecido me abandona
E quando a realidade chega à tona
Tristeza do não ser, domina e invade.
Pensando neste amor que ainda trago
Vivendo sem ninguém, sigo vazia,
E quando me percebo em fantasia,
Não ganho do viver sequer afago.
O beijo delicado de quem fora
Outrora a companhia mais constante,
Ao ver a minha vida num instante
Percebo quanto sofre a sonhadora,
Carrego como fosse cicatriz
O amor do que desejo e não me quis.
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O amor do que desejo e não me quis
Persegue-me qual fora um pesadelo
E quando mais constante posso vê-lo
Felicidade escapa por um triz
Encontro em meu caminho falso brilho
Qual fora um diamante embrutecido,
O vento do passado em vago olvido
Traduz estrada amarga aonde eu trilho.
E sendo assim a vida feita em mágoa
Carrego a solidão como bandeira,
A sorte muita vez aventureira
Nos braços de outro alguém, cisma e deságua.
Não fosse o que a verdade contradiz
Eu não seria assim esta infeliz.
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Eu não seria assim esta infeliz
Se amor pudesse além de um sonho,
E quando estes sonetos eu componho
Uma alma se desfia feito atriz;
No quarto de dormir, este abandono
Tomando toda noite não permite
Que amor reconhecendo algum limite
Acalme o pensamento e trague o sono.
Insone qual fantasma, num cigarro
Percebo que o desejo se esfumaça
E quando a solidão devora, traça,
Nos ermos do vazio eu já me esbarro
Pudesse ser o sonho que não vês
Meu mundo não teria insensatez.
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Meu mundo não teria insensatez
Se ao menos estivesses junto a mim,
A história recomeça e não tem fim,
Futuro num momento se desfez.
E o gosto desejado desta fruta
Prazer que não consigo, pois distante,
Por mais que se pensara deslumbrante
A sorte se demonstra mais astuta.
Reluto e já não posso caminhar,
Na ausência da alegria, me perder,
E quando mergulhando em desprazer
Jamais sob meus olhos o luar.
O gozo feito em rara alegoria
Quem sabe poderei ter noutro dia.
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Quem sabe poderei ter noutro dia
O brilho de um amor que em paz se deu
O coração que fora frio e ateu,
Na imensa maravilha se daria
E assim num caminhar bem mais tranqüilo
Depois destas borrascas costumeiras
Bonança mesmo quando não me queiras,
Olhando para além busco e desfilo.
Ancora-se o prazer num peito triste
Deixando para trás o medo e a dor,
O mundo neste instante a se propor
Deveras do que agora, amargo existe
Teria finalmente dentro em mim
O encanto que jamais se deu enfim.
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O encanto que jamais se deu enfim
Não poderia nunca ser aquele
Aonde uma esperança se revele
Traçando nos meus olhos ao que vim.
Escuto a voz de um tempo aonde a luz
Pudesse traduzir felicidade,
E quando me percebo em fria grade
Apenas o vazio reproduz
Enclausurada e tensa nada vejo,
Semente que se aborta da esperança
E quando no passado olhar se lança
Futuro em dor intensa já prevejo
Aonde desvendar amor sem fim?
Talvez ao renascer este jardim.
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Talvez ao renascer este jardim
Eu possa recolher divina rosa,
E nela a minha história prazerosa
Vivendo o que não via quando eu vim
Apostas já perdidas no passado,
A sanha em pleno breu negreja a vida
Percebo muitas vezes iludida
A sorte noutra senda, noutro prado.
Um coração se dando e nada tendo,
Sabendo que jamais terá descanso
Diversa da emoção que não alcanço
Um dia sem prazer nem dividendo
Talvez quem tanto encanto fantasia
Encontre no caminho a poesia.
9
Encontre no caminho a poesia
Quem tanto desejou felicidade
E quando enfim rompesse qualquer grade
O dia mais bonito e em paz teria.
Servindo ao grande amor de minha vida
Eu vejo a luz que tanto procurava
Dos sonhos, fantasias sou escrava
E tenho sem defesas a guarida.
Percebo nos teus olhos o prazer
De quem se deu e agora já recebe
Beleza sem igual da mansa sebe
Aonde mergulhando pode ver
Depois do sofrimento desvendado
A moça dedicada do passado.
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A moça dedicada do passado
Agora se permite sonhadora
Querendo como outrora sempre fora
Delírio deste príncipe encantado.
E nele percebendo a maravilha
Do Amor adolescente. Bela fonte
Que a cada novo dia mais aponte
Caminho aonde o gozo e o sonho trilha.
Brilhando no meu céu imenso sol
Entrego-me aos prazeres que me dás,
Vivendo tanto amor em farta paz,
No olhar de quem desejo; este farol.
No mundo que percebo agora belo
Menina enamorada em seu castelo.
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Menina enamorada em seu castelo
Jamais alguém bebeu tanta alegria,
E o quanto deste amor ainda guia
A cada verso em paz, mostro e revelo.
Abençoado ser a quem me dei,
E tanto desejara a vida inteira,
Sabendo deste tanto que me queira
Clareia com fulgor a minha grei.
E sendo a tua amada, uma donzela
Que um dia imaginaste no passado,
O amor quando demais em alto brado
Gritando esta emoção já se revela
Dourando a minha vida neste anelo
Momento delicado e mesmo belo.
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Momento delicado e mesmo belo
Vivido por quem quis felicidade,
E quando se mostrando uma verdade
À qual sinceramente não me atrelo,
Eu pude perceber a falsa luz
E nela errôneo canto destruído,
Melódica emoção se fez ruído
O que pensara rosa; vejo cruz.
E tento disfarçar, mas não consigo,
O encanto se desfez em um segundo,
E o coração deveras vagabundo
Morrendo sem ninguém, vil desabrigo
Retrata fielmente este reinado,
Há tanto que percebo abandonado.
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Há tanto que percebo abandonado
O sonho mais audaz e mesmo assim
Teimando contra tudo, agora eu vim
Falar deste momento do passado.
Esqueço os dissabores, sigo em frente
E nada mais escondo de ninguém,
Não canto tão somente o que convém
Nem quero ser da vida mais ausente.
O mundo não se esconde. A fantasia
Quimera que destroça e me acalenta,
A sorte se desnuda e violenta
Traduz realidade que me guia.
Por mais que uma ilusão ainda brade
As rugas não desmentem a verdade.
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As rugas não desmentem a verdade
E dela faço assim uma bandeira,
Por mais que outro caminho ainda queira
Somente nela vejo a liberdade.
Audaciosamente muita vez
Seguira contra a força da maré,
Agora me percebo e vou em pé
Diversa da que outrora ainda vês
E nada me detém, nem mesmo a dor,
Partindo para o etéreo, cosmonauta,
A mesa do jantar, deveras lauta
O gosto de um momento redentor.
Por mais que tanto agrade ou desagrade,
Restando do que fui, mera saudade...
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