quarta-feira, 9 de junho de 2010

35961 até 35970

1
Amor que se sonega e traça rumos
Diversos e embalsama uma esperança
Enquanto no vazio já se lança
Revela a sensação de escassos fumos,
E quando me perdendo sem aprumos
Apenas noutro olhar a temperança
Resíduos de outros tempos na lembrança
Dispersam com terror os doces sumos.
A face desdentada, o olhar sombrio,
O medo se espalhando em desvario
O ritmo se percebe em tom disperso,
E quando inutilmente busco a luz,
Bebendo a cada passo o quanto pus
Inutilmente em mar por onde verso.


2

Acode-me este vazio em noite terna
E tento vislumbrar qualquer detalhe
Da vida quando o sonho se retalhe
Buscando finalmente uma lanterna,
No quanto a realidade me consterna
E sinto da esperança um mero entalhe,
Vivendo cada dia enquanto talhe
A carne em dor intensa a vida inverna,
Aguardo tão somente o derradeiro
Acorde aonde possa ser inteiro
Por mais que a própria vida me degrade,
Sorvendo a minha morte em goles fartos,
Das alegrias sinto em claros partos
A morte que me trague a liberdade.

3


Abrindo os velhos olhos de quem tanto
Sonhara com momentos mais felizes,
E apenas entre dores, cicatrizes
Entranha pelo vago desencanto,
Proliferando a dita em tal quebranto
E quando na verdade tu desdizes
Não vês os meus caminhos em deslizes
E a rota sensação do antigo manto
Jogado sobre os ombros de quem ama,
E sei da inútil farsa em dura trama,
Resido no talvez e disto eu sei
O mundo que pensara todo meu
Há tanto sem destino escureceu
Tomando em tez brumosa inteira a grei.

4

A mesquinhez de um dia mais falível
Imerso em tantas dúvidas traduz
A falsa sensação de tola luz
Num tempo quase alheio ou implausível,
Rasgando o que pudesse ser mais crível
Enfrento tão somente o quanto opus
Meu mundo noutro passo em contraluz
Uma esperança nunca mais visível.
Puída fantasia que ora visto,
E quando nesta senda inda persisto
Restando muito pouco de algum sonho,
O todo se esvaindo passo a passo
Apenas os meus ermos vagos grasso
Num dia tão atroz quanto medonho.


5

Ao receber um beijo em tantas rugas
As marcas de uma vida em tom sombrio,
O olhar para mim mesmo já desvio
E busco na ilusão diversas fugas,
Acordo em dissonância com verdades
E sei deste fantoche que inda resta
Imagem desairosa e tão funesta
Aprisionado sonho em torpes grades.
Perdoe-me decerto por sonhar,
O cardo no caminho, a pedra e o medo,
E quando alguma luz inda concedo
Tentando a fantasia desvendar,
Espelho me traduz sem mais mentira
O quanto a realidade adentra e fira.

6

Amar e ser feliz, compondo em luzes
As sombras da existência quase vã,
E quando se percebe esta manhã
E nela novos brilhos reproduzes,
Os dias mais audazes; se reluzes
Produzes no meu peito um novo afã
Embora entranhe apenas mera cã
Diverso do que pensas me seduzes,
Apenas um momento e nada mais,
Os dias se repetem são iguais
Rotina desvendando a realidade,
Porquanto acreditar neste impossível
Caminho aonde mesmo este implausível
Delírio novamente vem e invade.

7

Sedento caminheiro em tal deserto
Dos sonhos mais atrozes eu percebo
Da amarga realidade em que me embebo
O passo sem destino ou rumo certo,
E quando se apresenta mais aberto
O coração deveras vil placebo
O tanto que pudesse e não concebo
Aos poucos de outros sonhos eu me alerto
E rumo em horizonte mesmo falso
Meu passo penetrando o cadafalso
Sem nada que deveras me socorra
Apenas a lembrança do que um dia
Talvez pudesse ser uma alegria,
Porém me preparava pra masmorra.

8

As sombras dos meus ermos passos, sigo
E tento desvendar qualquer seara
Aonde a própria vida se escancara
Vencendo a cada curva outro perigo.
Amordaçado sonho, em vão prossigo
A vida não seria nunca clara
A morte se aproxima e se prepara
Gerando finalmente em seu jazigo
O abrigo que servira de legado,
Apenas do que tanto imaginei,
Mortalha em ilusões; eu desfiei
No fim há tanto tempo desejado.


9

Eu tento vislumbrar alguma luz
Aonde se pudesse crer na vida,
Mas quando se entranhara sem saída
O labirinto enorme onde compus
Meu passo se resume em fardo e cruz
No quanto se pensara ser urdida
A sorte se prepara em despedida
E desampara mesmo quem produz
Os sonhos entre tantas heresias,
E quando na verdade tu mentias
Traçando em desespero o que pudera
Singrar novo oceano mais distante
Semente a cada broto degradante
Matando sem perdão a primavera.


10

Rosnando do meu lado esta delícia
E nela o precipício delirante,
No quanto meu desejo se agigante
A vida sem terror e sem sevicia
No olhar mais sorrateiro e com malícia
O todo se renova a cada instante
E bebo água sutil e fascinante
Das dores e dos medos, nem notícia,
Assim entre lençóis, bocas e pernas,
As horas são deveras quase eternas
E o gozo prometido se transborda,
Porém um sonhador tão solitário
Ao ver este caminho imaginário,
Num canto abandonado, enfim acorda.

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