quinta-feira, 31 de março de 2011

291

Do cantar em liberdade
Nada mais pudesse ver
Tão somente o que degrade
Cada forma de viver,
Onde quis felicidade
Na verdade, o nada ter.

Escorraço cada engano
E se possa de tal sorte
Desenhar o velho plano
E meu mundo não suporte
O que seja mais um dano
Presumindo novo corte,

Abraçando este vazio,
Cada tempo o desafio.

292

Nada mais pudesse ou tento
Quando a vida se faz leda
A palavra, o verso, o vento
Numa sórdida alameda
E o que possa em sentimento
Cada encanto ora conceda,

Nos meus dias mais sutis
E nos versos mais profanos
Quando outrora um sonho eu quis
Acenando em velhos danos,
Os meus olhos num matiz
Entre traços desumanos,

Apresentando o final
Do meu mundo em tom venal.

293

Acordando para o quanto
Na verdade não viera,
Esperando o desencanto
De uma vida mais austera.
E se nada mais garanto
O meu prazo destempera,

Vendo o prédio desabando,
Vendo a vida se perdendo,
O meu canto em contrabando
O cenário vão e horrendo,
Pouco a pouco me negando
E decerto hoje morrendo.

E crocita o velho corvo
Envolvido em vago estorvo.


294

Navegar contra tais ondas
E sentir a força em luta
Onde a vida tu me escondas
A verdade não refuta
E se mostra em velhas sondas
Esta cena atroz e bruta.

O meu passo se desvenda
O meu canto se aproxima
Do que fosse mais que lenda
Dominando o velho clima,
A verdade ora se estenda
Onde a luz não me redima.

Esperando pelo fim,
Mato o quanto existe em mim.

295

Na verdade que liberta
E maltrata tanta vez,
A palavra não deserta
Quem tentara e já não vês
Acenando onde desperta
A dorida insensatez.

Repetindo este bordão
Com temor cada estribilho,
Sem saber da dimensão
Do caminho aonde eu trilho
Entoando a negação,
No vazio ora me pilho.

Esperando pelo bote,
A serpente me derrote.

296

Esbarrando nos enganos
De quem tanto quis diverso
Caminhar em rotos panos
Planos claros do universo,
E se possa mais insanos,
Sobre o nada agora verso.

Invertendo a direção
Do meu passo e do que tente
A verdade em tal versão
Se mostrando imprevidente,
No final desunião
Nesta morte audaz e urgente.

Nada levo e levaria
Nem sequer a poesia.


297

Na palavra sem medida
Na medida quase exata
De quem nega a própria vida
E deveras já se mata,
O meu canto em voz perdida
Resumindo outra bravata.

Aprendendo com a queda
Com o verso sem sentido
Esperança, a porta veda
E já vejo consumido
O cenário onde se enreda
O tormento onde o lapido.

Apressando o que não veio
Sou somente o vão receio.

298

Basta já de tanta farsa
A verdade não suporta
O que possa e já se esgarça
Renegando enfim a porta,
Libertária e bela garça,
Mas o tempo não se importa,

Apresento o fim da peça
Abaixando o pano quando
O momento se confessa
Noutro tanto desabando,
O meu mundo recomeça
E o final determinando

O que pude e não se veja
Desvendando tal peleja.

299

Resta pouco ou quase nada
Do que um dia se pensara
Ser além da mera estrada
Outra vida bem mais clara,
A palavra já cansada,
No final nada declara,

Resumindo o fim da festa
Neste tiro em rara mira,
A verdade adentra a fresta
E deveras interfira
O meu canto já se infesta
Do que tanto se retira

Do mergulho em abissais,
Em momentos desiguais.

300

Ao perder a direção
Do que tanto poderia
Marco a mesma sensação
Entre a dor e a fantasia,
Noutra rude dimensão,
Na verdade nada havia.

Averiguo o meu passado
Vejo o tempo sem proveito
E carrego do meu lado
O que tanto não aceito,
O meu verso embolorado
O caminho em ermo leito.

Nada mais pudesse ter
Esperando só morrer...

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