10
“e os a quem meu cantar outrora foi jucundo,”
Não podem mais ouvir sequer a minha voz,
A sorte desde então, percebo mais feroz
E nela com certeza, em fardo inglório inundo.
O quanto o coração se faz tão vagabundo,
O medo não pudera apenas ser algoz,
E tendo nos meus pés ainda os velhos pós
Do quanto trafegara outrora pelo mundo.
Eu sei que nada resta a não ser o vazio
E dele quando em verso, o nada ora recrio
Percebo em solidão meus últimos momentos.
Pudesse prosseguir ainda a caminhada,
Mas quando sei que tudo ao fim me trará nada,
Deixando-me levar ao sabor destes ventos...
11
“cujo aplauso, ai de mim! me aperta o coração;”
Plateia feita em dor, alçando velhas tralhas,
E quando se percebe ao fio das navalhas
Somente esta tormenta, imensa solidão,
Aonde se pensara ainda num verão,
Diversas ilusões decerto tu batalhas
E cortas com afinco, as velhas cordoalhas,
Mesquinhas emoções, meus olhos não verão.
Eu posso caminhar em plena tempestade
E mesmo que talvez ainda se degrade
O quanto desejara em noite mais tranqüila,
Somente atrocidade é tudo o que inda temo,
No olhar extasiado eu vejo um novo demo
Que tanto me maltrata enquanto em paz desfila.
12
“Vibra meu canto agora a ignota multidão,”
Sabendo deste imenso e duro temporal
Aonde naufragara há tempos minha nau,
Sem leme, vela e rumo, aonde quis timão
Encontro tão somente a amarga sensação
Do quanto poderia e sendo mais venal
Vagando em noite fria, estrela tão banal
Moldando a cada noite imensa solidão.
Pudesse com meu canto, um dia mais feliz,
Mas nada se mostrando, apenas se desdiz
O que se fez em luz e agora vejo escuro,
Vencida cada etapa, encontro no meu fim,
O resto do que um dia imaginei jardim,
Matando pouco a pouco o sonho que procuro...
13
“que nem com som mortiço os ecos já perturba”
O coração mordaz exposto aos temporais
E quando se resume a vida no jamais,
Vagando sem destino a amarga e imensa turba,
O tempo de sonhar aos poucos se percebe
Ausente deste olhar e morto em leda senda,
O quanto do desejo ainda não desvenda
Matando em luz sombria a outrora bela sebe,
O peso do passado ainda se entranhando
Deixando para trás qualquer tosca esperança
Enquanto a dor invade e toma tudo, e alcança
O quanto imaginara ainda doce e brando.
Sombria realidade escreve em dor intensa
O que pensara outrora em paz e recompensa.
14
“Sumiu-se, aniquilou-se aquela amiga turba,”
E dela não restando ao menos um sinal,
O gozo que pensara outrora triunfal
O dia a dia toma e tudo se conturba.
Vencido caminheiro aguarda novo dia
E nele se refaz o que talvez pudesse
Mergulho no quem sabe e nada se oferece
A sombra do meu sonho, aos poucos se esvazia.
E tudo não permite um ato mais sensato
Às custas deste encanto, um dia se percorre
Em plena solidão, e nada me socorre,
A seca destroçando a fonte em vão regato.
O canto se esvaindo em tanta turbulência,
O amor já se perdendo em dura convivência...
15
“para quem noutro tempo os versos meus cantei”
E agora não sabendo o quanto valeria
O mundo que talvez expresse fantasia
Mudando num instante esta divina grei,
O quadro se tecendo em tons deveras grises,
Ao menos poderei viver outro momento
Que tanto procurara e nele um manso alento
Após quedar-me só envolto em tais deslizes.
O beijo sonegado, a morte se desnuda
E nada do que fora, ainda vive em mim,
A sorte desabando, a dor traçando enfim,
O que talvez dissesse ao menos uma ajuda.
Os versos que cantei agora tão distantes
Momentos que sonhei, eu sinto, são farsantes...
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