terça-feira, 13 de abril de 2010

HOMENAGEM A BENJAMIN SILVA

ESCADA DA VIDA

Julguei da vida haver galgado a escada,
essa escada de mármore polido,
que nos conduz à estância desejada
de um grande bem, raríssimo atingido.

Hoje vejo, porém, que quase nada
consegui, afinal, haver subido:
—ficou-me longe o termo da jornada
em que eu exausto me quedei vencido.

Pelos desvãos da escada mal me erguendo,
já sem noção e sem fé que anima,
nem sei se vou subindo ou vou descendo...

Por isso os seus extremos jamais acho:
—vejo degraus, olhando para cima,
vejo degraus — olhando para baixo!






1

“Vejo degraus olhando para baixo”
E quando imaginara estar além
Mais alto, bem mais alto sempre vem
Enquanto vez por outro eu já me abaixo,
Assim a vida trama em seus relevos
Momentos mais diversos, glória e dor,
Também quando percebo o decompor
Ou quando envolvido por enlevos
Não posso permitir vanglória ou medo,
Tampouco resistir às tentações
Da forma que deveras tu me expões
Melhor fugir senão tudo eu concedo,
E tendo esta certeza, sigo assim,
Nem tanto no começo, nem no fim.

2


“vejo degraus, olhando para cima,”
E tento muitas vezes desvendar
Pensando no que possa até achar
Mantendo desde sempre o mesmo clima,
Não posso mais calar esta vontade
E quanto mais audaz, maior a fúria,
Porém não suportando alguma incúria
Tampouco qualquer fato que degrade,
Seguindo mansamente o meu caminho
Encontro pedregulhos e espinheiros
E sei que são decerto corriqueiros
E deles novamente me avizinho,
Assim nesta emboscada a vida passa,
Tão frágil se esvaindo, qual fumaça...


3


“Por isso os seus extremos jamais acho”
Tampouco necessito descobrir
Aonde como e quando o meu porvir
Retratará bem mais que simples facho,
Redomas encontrando pelas sendas
E nelas proteção, mas tanto vejo
O quanto transcorrendo o meu desejo
Diverso do que ainda sei e atendas.
Perguntas sem respostas? Tantas tenho,
E quanto mais procuro e nada encontro,
A vida se transcorre em desencontro,
Porquanto ainda tenha muito empenho,
Descubro que não sei e não sabia
Em que resume paz ou alegria.

4


“nem sei se vou subindo ou vou descendo”,
Somente sei que sigo e nada impede
O quanto deste sonho se procede
Ao mesmo tempo em duro dividendo
Mortalha conduzindo cada passo
Atroz os descaminhos, mas eu sinto
O quanto outrora vira quase extinto
Agora novamente assim refaço
E neste carrossel, a vida gira
E neste vendaval não sobra nada
Subida qual descida, mesma escada
A mão que acaricia a que me atira
E tantas vezes teimo contra o vão
Sabendo desta eterna negação.


5


“já sem noção e sem fé que anima,”
Num pendular momento, subo vejo
Na queda o precipício de um desejo
Mudando o que pensara em farta estima,
Nesta estiagem vejo o duro inverno
E neste inverno penso no verão,
Assim ao se mostrar a sedução
Diversa da que sonho ou tanto interno,
Insisto neste passo rumo ao quanto
E nele mesmo entranho-me no sonho,
Enquanto cada dia recomponho,
A face molda em mim o desencanto,
Mortalhas e diversos batistérios,
A vida com terríveis, vãos mistérios.



6


“Pelos desvãos da escada mal me erguendo,”
Não pude decifrar sorte ou temor,
E quantas vezes fujo de um amor
Sabendo desde sempre que estupendo
Caminho se diverge de outro tal
Enquanto se procura a sensação
Do todo em que não tendo direção
Caminha rumo ao fardo ritual,
Vestisse qualquer forma de prazer
Ainda me cabendo algum apelo,
Amor quando demais não quero vê-lo
Domina e desancando todo o ser,
Também se não soubesse deste encanto,
O que seria então? Mero quebranto...


7


“em que eu exausto me quedei vencido”
Depois de ter lutado inutilmente
A vida tantas vezes se pressente
Trazendo novamente o já perdido,
Assim redemoinho de emoção
O tempo diz do tempo o que não cabe,
Até deveras vejo que quem sabe
Caminha com terror ou aversão
Enquanto não conhece outra quimera
Deveras de tocaia numa esquina
No corpo delicado da menina
Esconde-se a terrível besta fera
E tanto quanto posso me negar
Também correndo o risco do luar...

8

“ficou-me longe o termo da jornada”
Embora não descanse um só segundo
Do quanto nada tenho se me inundo
Depois de certo tempo tenho o nada?
Assim o que fazer do velho canto
E dele refazer nova esperança?
Ao longe cada passo não alcança
Deveras o que quero e busco tanto
Servindo como fosse qualquer veste
Mortalha diz do luto e não da vida
Portanto ao ver a escada destruída
Apenas o final já me reveste
E sinto o quanto pude, mas não vi
E assim voltando o tempo estou aqui.


9


“consegui, afinal, haver subido:”
Degraus entre degraus e nada além
Enquanto a realidade inda não vem,
O quanto imaginara ser infindo
Apenas indicando qualquer ponto
Aquém do que pensara ou mais quisera
A vida se prepara e a primavera
Deixada para trás, nem mais desconto
Vencido sem saber se ainda resta
Alguma luz após os temporais
Ausente dos meus olhos qualquer cais
Realidade assim, sempre funesta
Espúrio caminheiro do vazio
O tanto que desejo? Só porfio.


10


“Hoje vejo, porém, que quase nada”
Do quanto desejei ainda tenho,
Porquanto valeria algum empenho
Se a sorte há muito tempo abandonada?
Risonho mundo feito em flórea luz
Anseio pelo quanto ainda pude
E vendo tão distante a juventude
Somente esta mortalha me conduz
Mesquinharia é fato, nada além
Do todo que pensara mais freqüente
E quanto dos meus sonhos já se ausente
Apenas o vazio me contém
Retorno à casa velha, este sobrado
Há tanto que bem sei abandonado.


11


“de um grande bem, raríssimo atingido”
Ao grande abismo um salto e nada mais,
Assim ao transcorrem rituais
O tempo do presente revolvido
Nas ânsias do futuro, o que não há
Nem mesmo se pudesse inda haveria
A roda da fortuna, a fantasia
E tudo desabando aqui ou lá,
Assisto ao meu momento crucial
E sinto que jamais resistirei
Do quanto nada tenho nem terei
A morte se mostrando triunfal,
Risonha tempestade me domina
Secando desde agora qualquer mina.



12


“que nos conduz à estância desejada”
O sonho quanto muito nos ajuda
E tendo a sorte grande ou tão miúda
A muda pode dar em tudo ou nada,
Vestindo esta ilusão sobeja e farta
Ao mesmo tempo a luz que me inebria
Deveras pode ser a da agonia
A vida tantas vezes me descarta
Jogando pelas ruas o meu sonho
E nada pode ser pior que o vão
E tanto me acostumo à negação
Sabendo deste tanto que em medonho
Ar posso desfrutar somente o quando
Há tempos me procuro, disfarçando.



13


“Essa escada de mármore polido”
Apenas não traduz realidade
O tanto que deveras já me agrade
Morrendo em qualquer canto, ou destruído
Não pude controlar a minha voz
Nem mesmo poderia, pois decerto
O rumo se mostrando mais deserto
Traduz o que se fez cruel e atroz
Corroído caminho aonde outrora
Vivera com ternura, mas se vê
Apenas essa face démodé
E dela nem o resto me decora,
Mordaz e mesmo assim ainda tento,
Sabendo no final, o esquecimento.


14


“Julguei da vida haver galgado a escada,”
Aonde perfilara uma esperança
Apenas a nefasta e degradada
Imagem decomposta ainda alcança
Quem sabe tantas vezes renegada
Ainda com a sorte uma aliança
E a morte se trazendo neste nada
Ao qual olhar espúrio enfim se lança
Capenga coração já decifrando
Momento onde talvez pudesse ter
Ao menos um segundo de prazer
E nele se desnuda assim nefando
Nevascas dentro em mim? Cruéis tormentos
E delas aumentando os sofrimentos

Nenhum comentário: