28136
“punha um riso de graça. Tagarela,”
Já não continha a luz e se mostrava
Gerando qual vulcão a imensa lava,
Ao mesmo a fúria se revela
No olhar feito ânsia e gozo, num instante
O foco variável dita o medo,
E quando em novo passo assim procedo,
A senda muitas vezes deslumbrante
Esgota-se em diversa tempestade,
Gestando uma alegria aonde posso
Dizer do caminhar talvez só nosso
E quando se perfaz algema e grade,
No quarto algum momento mais venal,
Após o nosso amor convencional.
28137
“canto a mão da mulher amada e bela”
E sei que tantas vezes seduzido,
Tocado mais profundo na libido,
O amor em gozo audaz assim se sela,
Mas tanto quanto pude acreditar
Difícil caminhada se porfia,
E nela muitas vezes a harmonia
Diversa posso mesmo imaginar,
Ansiosamente vejo que se trama
A sanha de um vivente em luz tão vária,
A morte se prevê e é necessária,
O quão se mostra frágil, mesmo, a chama,
Ditames de um amor que tanto quero,
Mas sei em dissonância, louco e fero.
28138
“Dentro, rendas, cristais, flores... Em cada”
Retrato se mostrando variável,
Por vezes tanto audaz ou intragável
Condena o navegante à derrocada,
Destroços se espalhando pela sala,
O peso do viver vergando então
Quem sabe da completa sedução
E nela uma alma resta enfim vassala,
O corte de um amor pela raiz,
A treva sonegando uma esperança
E quando se porfia uma aliança
A história sonegando contradiz,
O gosto tão amargo do viver,
Invade num instante todo o ser.
28139
“e cortinas de tule na janela”
Trancafiando a sorte em tais paredes,
Aonde se pudessem tantas sedes,
O quarto em solidão, a vida sela,
Geraste pelo menos fantasia,
E nesta confusão de sentimento,
Do nada vez em quando me alimento
Acaso pós acaso o medo guia
A par da tempestade que virá,
Não deixo-me levar em falso trilho,
E quanto mais perdido este andarilho
Não sabe se persiste aqui ou lá,
Somente segue o medo a cada instante,
E dele sua enorme variante.
28140
“tinha sempre gerânios na sacada”
Quem semeara flores e tentara
Conter a grande fenda enorme escara
Aonde se mostrasse mais calada
A vida entranha a mesma primavera
Na sonhadora fronte de quem ama,
E tendo-se fugaz etérea chama,
Quem mais produz deveras mais espera,
O vento se mostrando em fonte audaz
Cravando no meu peito a furiosa
Clava que decerto sempre glosa
O quanto poderia ter em paz,
Não posso traduzir em simples flores,
O todo feito em mágoas e terrores.
28141
“nossa despretensiosa água-furtada,”
Aonde amor pudesse, mas não veio,
Ainda se perfila em vão recreio
A luz que traduzira esta alvorada
Nublosa que deveras se espalhando
Gerara tão somente a solidão,
Os dias no futuro mostrarão,
O quanto desejei em fogo brando
E sendo sempre acesa imensa frágua
Aonde não pudesse desejar
Além do quanto houvera por sonhar,
E em foz tão tenebrosa já deságua
O amor ainda mesmo audaz e fera
A sorte de uma ausente primavera.
28142
“O nosso ninho, a nossa casa, aquela”
Audácia feita em pântano somente,
E nela se traduz podre semente,
Assídua solidão transita em cela,
O parto de um momento mais feliz,
Aborto sem destino, vaga luz,
Ao passo desastroso me conduz
E toda a nossa história não desdiz,
Aonde se mostrasse ora nefasta
O caminhante vê somente o quanto
Do amor se transformara em desencanto,
E a vida noutra via já se afasta,
O gozo momentâneo não comporta,
E assim se trancafia noutra porta.
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