segunda-feira, 29 de março de 2010

HOMENAGEM A AUGUSTO DOS ANJOS

"Sou uma Sombra! Venho de outras eras,
Do cosmopolitismo das moneras...
Pólipo de recônditas reentrâncias,
Larva de caos telúrico, procedo
Da escuridão do cósmico segredo,
Da substância de todas as substâncias!
A Simbiose das coisas me equilibra.
Em minha ignota mônada, ampla, vibra
A alma dos movimentos rotatórios...
E é de mim que decorrem, simultâneas,
A saúde das forças subterrâneas,
E a morbidez dos seres ilusórios!
Pairando acima dos mundanos tetos,
Não conheço o acidente da Senectus
- Esta universitária sanguessuga
Que produz, sem dispêndio algum de vírus,
O amarelecimento do papírus
E a miséria anatômica da ruga!
Na existência social, possuo uma arma
- O metafisicismo de Abidarma -
E trago, sem bramânicas tesouras,
Como um dorso de azêmola passiva,
A solidariedade subjetiva
De todas as espécies sofredoras.
Com um pouco de saliva quotidiana
Mostro meu nojo à Natureza Humana.
A podridão me serve de Evangelho...
Amo o esterco, os resíduos ruins dos quiosques
E o animal inferior que urra nos bosques
É com certeza meu irmão mais velho!
Tal qual quem para o próprio túmulo olha,
Amarguradamente se me antolha,
À luz do americano plenilúnio,
Na alma crepuscular de minha raça
Como uma vocação para a Desgraça
E um tropismo ancestral para o Infortúnio.
Aí vem sujo, a coçar chagas plebéias,
Trazendo no deserto das idéias
O desespero endêmico do inferno,
Com a cara hirta, tatuada de fuligens
Esse mineiro doido das origens,
Que se chama o Filósofo Moderno!
Quis compreender, quebrando estéreis normas,
A vida fenomênica das Formas,
Que, iguais a fogos passageiros, luzem...
E apenas encontrou na idéia gasta,
O horror dessa mecânica nefasta,
A que todas as coisas se reduzem!
E hão de achá-lo, amanhã, bestas agrestes,
Sobre a esteira sarcófaga das pestes
A mostrar, já nos últimos momentos,
Como quem se submete a uma charqueada,
Ao clarão tropical da luza danada,
O espólio dos seus dedos peçonhentos.
Tal a finalidade dos estames!
Mas ele viverá, rotos os liames
Dessa estranguladora lei que aperta
Todos os agregados perecíveis,
Nas esterizações indefiníveis
Da energia intra-atômica liberta!
Será calor, causa ubíqua de gozo,
Raio X, magnetismo misterioso,
Quimiotaxia, ondulação aérea,
Fonte de repulsões e de prazeres,
Sonoridade potencial dos seres,
Estrangulada dentro da matéria!
E o que ele foi: Clavículas, abdômen,
O coração, a boca, em síntese, o Homem,
- Engrenagem de vísceras vulgares -
Os dedos carregados de peçonha,
Tudo coube na lógica medonha
Dos apodrecimentos musculares!
A desarrumação dos intestinos
Assombra! Vede-a! Os vermes assassinos
Dentro daquela massa que o húmus come,
Numa glutoneria hedionda, brincam,
Como as cadelas que as dentuças trincam
No espasmo fisiológico da fome.
É uma trágica festa emocionante!
A bacteriologia inventariante
Toma conta do corpo que apodrece...
E até os membros da família engulham,
Vendo as larvas malignas que se embrulham
No cadáver malsão, fazendo um s.
E foi então para isto que esse doudo
Estragou o vibrátil plasma todo,
À herança miserável de micróbios!
Estoutro agora é o sátiro peralta
Que o sensualismo sodomista exalta,
Nutrindo sua infâmia a leite e a trigo...
Como que, em suas células vilíssimas,
Há estratificações requintadíssimas,
De uma animalidade sem castigo.
Brancas bacantes bêbedas o beijam.
Suas artérias hírcicas latejam,
Sentindo o odor das carnações abstêmias,
E à noite, vai gozar, ébrio de vício,
No sombrio bazar do meretrício,
O cuspo afrodisíaco das fêmeas.
No horror de sua anômala nevrose,
Toda a sensualidade da simbiose,
Uivando, à noite, em lúbricos arroubos,
Como no babilônico sansara,
Lembra a fome incoercível que escancara
A mucosa carnívora dos lobos.
Sôfrego, o monstro as vítimas aguarda.
Negra paixão congênita, bastarda,
Do seu zooplasma ofídico resulta...
E explode, igual à luz que o ar acomete,
Com a veemência mavórtica do aríete
E os arremessos de uma catapulta.
Mas muitas vezes, quando a noite avança,
Hirto, observa através a tênue trança
Dos filamentos fluídicos de um halo
A destra descarnada de um duende,
Que, tateando nas tênebras, se estende
Dentro da noite má, para agarrá-lo!
Cresce-lhe a intracefálica tortura,
E de su’alma na caverna escura,
Fazendo ultra-epiléticos esforços,
Acorda, com os candeeiros apagados,
Numa coreografia de danados,
A família alarmada dos remorsos.
É o despertar de um povo subterrâneo!
É a fauna cavernícola do crânio
- Macbeths da patológica vigília,
Mostrando, em rembrandtescas telas várias,
As incestuosidades sanguinárias
Que ele tem praticado na família.
As alucinações tácteis pululam.
Sente que megatérios o estrangulam...
A asa negra das moscas o horroriza;
E autopsiando a amaríssima existência
Encontra um cancro assíduo na consciência
E três manchas de sangue na camisa!
Míngua-se o combustível da lanterna
E a consciência do sátiro se inferna,
Reconhecendo, bêbedo de sono,
Na própria ânsia dionísica do gozo,
Essa necessidade de horroroso,
Que é talvez propriedade do carbono!
Ah! Dentro de toda a alma existe a prova
De que a dor como um dartro se renova,
Quando o prazer barbaramente a ataca...
Assim também, observa a ciência crua,
Dentro da elipse ignívoma da lua
A realidade de uma esfera opaca.
Somente a Arte, esculpindo a humana mágoa,
Abranda as rochas rígidas, torna água
Todo o fogo telúrico profundo
E reduz, sem que, entanto, a desintegre,
À condição de uma planície alegre,
A aspereza orográfica do mundo!
Provo desta maneira ao mundo odiento
Pelas grandes razões do sentimento,
Sem os métodos da abstrusa ciência fria
E os trovões gritadores da dialética,
Que a mais alta expressão da dor estética
Consiste essencialmente na alegria.
Continua o martírio das criaturas:
- O homicídio nas vielas mais escuras,
- O ferido que a hostil gleba atra escarva,
- O último solilóquio dos suicidas -
E eu sinto a dor de todas essas vidas
Em minha vida anônima de larval!"
Disse isto a Sombra. E, ouvindo estes vocábulos,
Da luz da lua aos pálidos venábulos,
Na ânsia de um nervosíssimo entusiasmo,
Julgava ouvir monótonas corujas,
Executando, entre caveiras sujas,
A orquestra arrepiadora do sarcasmo!
Era a elegia panteísta do Universo,
Na podridão do sangue humano imerso,
Prostituído talvez, em suas bases...
Era a canção da Natureza exausta,
Chorando e rindo na ironia infausta
Da incoerência infernal daquelas frases.
E o turbilhão de tais fonemas acres
Trovejando grandíloquos massacres,
Há de ferir-me as auditivas portas,
Até que minha efêmera cabeça
Reverta à quietação da treva espessa
E à palidez das fotosferas mortas!



1
“E à palidez das fotosferas mortas!”
A viuvez de uma alma em dores feita,
E quando a realidade se deleita
Diversos os caminhos em que aportas,
Abrindo do passado velhas portas
A sorte nunca sendo satisfeita
A morte se aproxima enquanto deita
As garras nestes sonhos que ora exortas.
Medonho caricato, nada trago
Somente algum resquício de um afago
Mordaz de quem jamais amor me dera,
À sombra do vazio sigo imerso
E usando com terror último verso,
Bebendo a solidão, amiga e fera.

2


“Reverta à quietação da treva espessa”
Os meus anseios toscos e imbecis
Nefastos pensamentos tão servis
Rondando e dominando esta cabeça,
Mas antes que deveras me enlouqueça
Pudesse ter nas mãos o que desdiz
Caminho de um estúpido infeliz
Vislumbro em minha morte o que eu mereça.
Percalços, espinheiros e falácias
Aonde não devia, vãs audácias
Perfazem os caminhos mais atrozes,
E o túmulo me espera, como abrigo,
Deleite se expressando num jazigo
Cessando estes tormentos; meus algozes...

3

“Até que minha efêmera cabeça”
Perceba qualquer luz que ainda possa
Rever este conceito: morte e fossa,
Bem antes que o destino não me esqueça.
A sorte se mostrando sempre avessa
A algum sorriso mesmo que inda adoça
Negando o que seria simples troça,
Porém não vejo voz que se obedeça.
Tropeço num tropel de escuros sonhos
E sei o quão se mostram mais medonhos
Marcando a ferro e a fogo a minha pele;
O corte se aprofunda a cada instante
E o que pensara outrora deslumbrante
Somente se antevê quando repele.

4


“Há de ferir-me as auditivas portas,”
O som das tempestades que me invadem
Por mais que os medos toscos já degradem
Caminhos mais terríveis me comportas
Apego-me ao vazio que inda trazes
Carcaças de esperança apodrecidas
E delas renovando em morte o brilho
Que ainda perfazendo um andarilho
Revê no rebrotar de novas vidas.
Sou pária e nada mais eu poderia
Sabendo do vazio que me doma
Apenas divisão jamais fui soma,
Vagando como um nada em agonia
Nem sombras vou deixar quando partir,
A morte, belo porto, um elixir...


5


“Trovejando grandíloquos massacres,”
Assisto aos meus momentos derradeiros,
Na pútrida expressão velhos canteiros
Momentos delicados morrem acres
Da sorte não desvendo nem mais enigmas
E bebo a sordidez dos verdadeiros
Caminhos entre pedras e espinheiros
Marcando minha pele, tais estigmas,
E as lavas derramando sobre mim,
Recôndita alegria se esfumaça,
A vida se mostrara vã trapaça
A morte me alentando traz o fim
E nele reproduzo o que já fora
Uma alma muitas vezes sonhadora.

6

“E o turbilhão de tais fonemas acres”
Compondo a sinfonia derradeira,
Percebo desta morte a mensageira
Negando da esperança firmes lacres
E calo-me defronte aos temporais
E neles absorvendo simplesmente
A fúria que a verdade não desmente
Gerando o desacerto e nada mais.
Apetecendo a quem se fez palhaço
O fardo do viver imenso caos,
Aonde se pudessem novas naus
O porto em solilóquio já desfaço,
E traço meu caminho em morte e dor
Apodrecido sonho, meu louvor...


7

“Da incoerência infernal daquelas frases”
Somente se percebe o fim no ocaso,
E quando não consigo em tal descaso
Viver além do quanto ainda trazes
Negando uma existência nos mordazes
Caminhos que deveras não me aprazo,
Mergulho no vazio e se me atraso
Pereço pouco a pouco em vãs tenazes.
Medonho caricato tenho ao fim
A sombra do que outrora se fez vida,
A morte sendo enfim assim urdida,
Permite ao caminheiro esta esperança
Trespassa no meu peito solitário
O canto derradeiro e temerário,
Qual fora uma mortalha em fria lança...

8

“Chorando e rindo na ironia infausta”
Mesquinho este retrato especular
E nele sinto a ausência a me tomar,
Uma alma se mostrando enfim exausta
Ocaso da alegria em tez sombria,
O peso do não ser enverga as costas
Verdades em tragédias sendo expostas
Do nada que hoje sou o que se cria?
Verdugo de mim mesmo um suicida
Bebendo da loucura que me excita
A vida por si só sendo finita
Há tanto que percebo já perdida.
E o passo me levando para a morte,
Traduz o redentor sublime norte...

9


” Era a canção da Natureza exausta,”
Tocando os meus sentidos e aspergindo
Momento que deveras sendo infindo
Transforma a solidão em luz mais fausta,

Caóticos caminhos desvendados,
Veredas entre espinho e pedregulho
E quando neste abismo enfim mergulho
Lançando sobre a mesa sortes, dados.

Erguendo o meu olhar busco o horizonte
Sabendo das neblinas mais ferozes,
Porém das alegrias torpes vozes
O novo amanhecer já se desponte.

Fadado ao nada ter por um instante,
Encontro um novo raio fascinante...


10

“Prostituído talvez, em suas bases”
Meu pensamento nada encontra enfim
Somente este vazio dentro em mim,
Por mais que novas luzes inda trazes
A vida se perdendo em frágeis fases
Alheia a qualquer sonho traz no fim
Sedento e sem proveito o meu jardim
Cultivo dentro da alma tais antrazes,
E putrefeito sigo carniceiro
O fim se aproximando em derradeiro
Momento ao qual anseio dia a dia,
E bêbado de luz louca falena
Minha alma se fartando se envenena
E o fim já se aproxima e não se adia...


11

“Na podridão do sangue humano imerso,”
Uma alma rapineira se sacia
E aonde poderia a fantasia
Caminho redentor logo disperso,
Na intrepidez terrível do meu verso
Apenas o retrato da agonia
Quem sabe renovasse a alegoria
Pudesse conhecer outro universo.
Só resta-me entretanto o vão final
E nele como fora um ritual
Carcaça da esperança assim desfila,
Na incrível solidão que enfim herdei
Da subserviência faço a minha lei
Enquanto a morte vem e me destila.


12

“Era a elegia panteísta do Universo,”
A ausência de respostas medo e corte,
Aonde se fizesse enfim a morte
Sentido no vazio estando imerso,
São meros os caminhos e disperso
Somente uma ilusão que me conforte
Eternidade gera algum suporte
Prazer do após vazio mais diverso.
A vida se renova por si só,
Embora variável sua face
Da pútrida verdade ora se trace
Volvendo ao mesmo início: pó ao pó.
E os deuses que se trazem sob os olhos
Proliferando flores entre abrolhos.

13

“A orquestra arrepiadora do sarcasmo”
Explode em dissonantes harmonias
E quando novas dores tu porfias
Somente nos meus ermos sigo pasmo,
E faço da mortalha meu abrigo,
Cansado do não ser e ter aquém
Do olhar este vazio que ora vem
Mostrando algum alento que persigo
Apodrecendo uma alma a cada dia
Esgotos que carrego tão nefastos,
Aonde se pensara dias castos
A morte sem desculpas já se adia.
E a redenção deveras procurada
Constrói em espinheiros minha estrada.

14


“Executando, entre caveiras sujas,”
Um ato que redima meus pecados
Marcando com terror sinas e fados
Expondo-me quais fossem garatujas
Descrevo com terror cada palavra
Diversa do que tanto poderia
Esboça-se no fim esta agonia
Que a sorte tão maldita sempre lavra
Nas pústulas de uma alma imunda vejo
Sequer a redenção em novas luzes
E quando a minha face reproduzes
Encontro este terror, vago negrejo.
E quando me mostrando cadavérico
Renego o meu passado quase homérico...


15

“Julgava ouvir monótonas corujas,”
Entre os espectros vários que ora enfrento
Estando em tal polêmica no centro
As dores se aproximam de lambujas
E sei destas desditas pelas cujas
Caminhos tão sombrios ora adentro
E quando na esperança me concentro
Paisagens se mostrando bem mais sujas.
Alardes dissonantes eclodindo
E o que pensara fosse mais infindo
Produz devassidão e dela traço
O fim de minha história sobre a Terra
Capítulo final que ora se encerra
A morte não concede algum espaço.

16

“Na ânsia de um nervosíssimo entusiasmo,”
Perdera qualquer senso e me entregara
Cevando a via crucis tão amara
Gerada com momentos de sarcasmo,
E quando me mostrara em vão espasmo
A morte em plena vida se declara
Nem mesmo uma ilusão ainda ampara
O olhar ensimesmado e quase pasmo,
Morrer e ser feliz, o que me basta,
A sorte tão funesta outrora casta
Expressa esta agonia em limbos feita,
Demônios cultivados dia a dia
Ao infernal tormento a vida guia
E nele uma alma torpe se deleita.


17

“Da luz da lua aos pálidos venábulos,”
Expressam-se os terrores de quem tenta
Vencer a noite amarga e tão sedenta
Usando os mais extremos dos tentáculos
Maculam-se os diversos caminhares
E geram tão somente dissidências
Ainda que fugisse às penitências
Vagando por terríveis lupanares.
Esgotam-se os caminhos sob a lua
E a crua realidade se expressando
Tornando o meu destino menos brando
Enquanto o sofrimento continua,
Afetam-me diversos dissabores
Negando o que seriam tais albores


18

“Disse isto a Sombra. E, ouvindo estes vocábulos,”
Falando de uma eterna solidão
Os dias doloridos mostrarão
A imunda sensação, prisão e estábulos.
Pudesse conhecer a liberdade
Que, ausente dos meus dias não concebo
E quando morto em vida eu me percebo
Somente sob o olhar a imensa grade.
Pudesse ter ao fim a expectativa
De um tempo que bem sei não voltará
Algum sorriso ao menos mostrará
Que a luz mesmo sombria não me priva.
Porém ouvindo a sombra em seu lamento,
Deveras, sem meu sol, eu me atormento.


19

“Em minha vida anônima de larval"
Apenas me restando alguma sombra
Realidade tanto fere e assombra
E expressa a solidão, terrível, parva

Pudesse ter a morte, já que inerme
E ver apodrecidas esperanças
Ao vago o pensamento então se lança
Traduz a realidade deste verme.
Medonho caricato, nada levo
Somente este vazio e nada mais,
As horas que me restam, terminais
Algum sorriso irônico inda atrevo.
Mas sei que no final eu nada sou,
Carcaça que sorriu, sofreu e amou.

20


“E eu sinto a dor de todas essas vidas”
E delas me proponho um novo dia
Aonde do total que se recria
Ainda houvesse luzes já perdidas,
Medonhos os espectros que rondando
O sonho, se transformam em reais
E geram em terror; descomunais
Imagens do que outrora fora brando,
A morte me açodando me permite
Viver imerso em sombras temerárias
As sortes que bem sei tão procelárias
Não respeitando enfim algum limite
E o pêndulo da vida se refaz
Num êxtase terrível e tenaz.

21



“O último solilóquio dos suicidas”
Às vésperas do fim anunciado,
O quanto deste encanto demarcado
Gerado pelas ânsias de outras vidas.
Negar a própria sorte tão brumosa
E ver em nova esfera soluções
Enquanto na verdade decompões
O gozo de um prazer sempre se glosa,
Decrépitos caminhos se percorrem
Lugares nunca vistos e temidos,
Ouvindo tão somente tais gemidos
Nem mesmo as esperanças o socorrem,
E quando o passo dado é derradeiro,
O tiro com certeza, bem certeiro..


22


“O ferido que a hostil gleba atra escarva,”
Com tentáculos vários, espinheiros
Os cortes se aprofundam em verdadeiros
Nichos onde se exibe cada larva,
A sorte se tornando desta forma
Disforme caricata, dor intensa,
E quando noutra via se compensa
A morte insofismável, fria norma,
Caracteriza o fato mais sutil,
E traça sem defesas o final,
Audácia se mostrando tão banal
O gozo tresloucado se previu,
E o putrefeito corpo ora se expõe
E em pleno respirara já decompõe.


23


“O homicídio nas vielas mais escuras,”
Transborda este retrato tão banal
Da fome que se espalha, o bem e o mal,
Gerando estas disformes vãs figuras,
E a carne mais barata e mais vulgar
Jogada pelas ruas, exposta e nua,
Devora-se deveras sempre crua,
Abutres dividindo o que restar
Do que pudera ser um ser pensante
E agora nada além de podre massa,
Assim ao ver estúpida carcaça
Verdade traduzida neste instante:
Amou, sofreu, pensou, mas e daí?
Resposta procurada encontro aqui.

24


“Continua o martírio das criaturas”
E assim ao me tornar antropofágico
Negando qualquer tom terrível, trágico
Afasto dos meus olhos amarguras,
A morte é costumeira e tão banal,
Aonde se dará em qual momento?
Já não procuro mais qualquer alento
Sabendo inevitável este degrau
Que mesmo me levando a algum lugar
Ainda que não creia, permitindo
Ao sonhador deveras turvo ou lindo,
Orgástico e terrível lupanar?
Só sei que no final mero repasto,
Por vezes salvador, sempre nefasto.

25

“Consiste essencialmente na alegria”
De ter esta certeza construída
Ao longo do que fora quase vida,
E o tempo na verdade nunca adia.
A carne apodrecida já desenha
O quanto desta sombra ainda existe,
E quando se apresenta amarga e triste
Cumprindo solitária esta resenha,
O vasto do vazio se apresenta
E nada além do gozo do não ser,
Permite qualquer forma de prazer
Por vezes tão calada ou violenta.
Escusas ruas credos infelizes,
E a cada novo tempo outros deslizes.


26

“Que a mais alta expressão da dor estética”
Esgarça o que talvez ainda reste,
O tanto do viver árido e agreste
Não torna esta resposta tão hermética.
Somando o nada sempre com o nada,
Resulta-se na face mais exata
Do quanto cada nó já se desata
E a vida não passando de lufada.
O pêndulo necrótico refaz
Da podridão a vida que assim retorna,
Não vejo tempestade em água morna,
Tampouco sinto um ar torpe e mordaz,
Das tais vicissitudes me alimento,
E assim quando eu me for também fomento.


27

“E os trovões gritadores da dialética,”
Gerando sobre a morte mil discursos
Enquanto seguem sempre os cursos
Os rios mesmo em forma mais eclética.
Perdendo a direção da realidade
Sofismas, metafísicas e cultos,
Não vêm esta verdade nos seus vultos
E a troco do vazio ainda brade
Gestando estupidez em óbvia face
O refazer é claro e insofismável,
E nele como um ciclo inevitável
Não há como evitar algum impasse,
Diversidade dita qualquer norma,
Porém inquestionável: se transforma.

28


“Sem os métodos da abstrusa ciência fria”
Eternamente escura a caminhada,
Gerado do vazio e decifrada
A história que deveras não nos guia.
Os mitos e os fantasmas do passado
Ainda vivem e traçam o futuro
Apocalipses rimam com tolices
E neles se percebem as crendices
Tomadas sem razões em solo escuro.
De deuses e demônios poluindo
A lucidez de quem tenta saber,
O que há, o que seria o ser, não ser
Se existe alguma poder que se infindo.
Ciência e consciência lutam contra
A mística que tem resposta pronta.

29


“Pelas grandes razões do sentimento,”
Guiados sem pensar se existe ou não
Tocados dela vã religião
Buscando a qualquer preço algum alento.
Diversos caminhares, mesmo fim,
E a morte se tornando imprescindível,
O medo do final, é tão incrível,
Permite qualquer sonho, bom, ruim.
Demônios que criaram noções d’ética
Sacrossantas figuras divinais,
Gerando do vazio, temporais,
Diversos da resposta mais hermética.
Assim ao se perder tende ao eterno,
Vagando em paraíso, limbo, inferno...

30


“Provo desta maneira ao mundo odiento”
O quanto nada somos frente ao todo
E tendo esta certeza lodo a lodo,
Da morte e só da morte me alimento.
Retroagindo ao nada após ter sido,
Também como alimento para outrem
O vento que partiu de novo vem,
E assim o meu caminho percorrido,
Eternidade? Leda fantasia
Ou crua realidade da matéria,
Incrível neste tempo de miséria
A fome com tamanha serventia.
Ocaso vai gerando novo ocaso,
O tempo tem que ter limite e prazo.


31


“A aspereza orográfica do mundo”
Gerando em cordilheiras as respostas
Que encontro na verdade sempre postas
Nos abissais aonde me aprofundo,
Ascendo aos céus e sei quanto é mentira
Se a morte se refaz em vida e encerra
O ciclo sob a fria e dura terra,
Aonde o meu cadáver já se atira.
Prefiro ter visões da realidade
A crer noutros fantasmas egoístas,
Não tendo do futuro sequer pistas,
Só tenho esta certeza que degrade
Matéria se transforma na matéria
Religião jamais se fez mais séria.



32

“À condição de uma planície alegre,”
Talvez inda pudesse ter no olhar
Esta esperança de outro renovar
E nela toda a sorte já se integre.
Mas quando poderia ter na crença
A solução tranqüila pro problema
Realidade vem e já me algema,
Um ser que na verdade ainda pensa
Já sabe muito bem que uma resposta
Jamais se conhecida deve ser
Bastante para dar algum prazer,
E nela a sua imagem decomposta
Somente traduzindo morte e vida,
Sem outra senda sendo percebida.


33


“E reduz, sem que, entanto, a desintegre,”
Verdade inquestionável que ora vejo,
Além do que se fora algum desejo
Que inutilmente ainda venha e alegre.
Diversa fantasia que inebria
Uma alma tão carente quanto a nossa,
Por mais que da verdade já se apossa
Prefere caminha com fidalguia.
Se verme somos, nada impedirá
De vermes sermos, basta de indulgências;
Não quero deste “eterno” mais clemências,
Se tudo o que eu concebo vejo cá.
Não creio noutro tempo, nem preciso,
Deveras esgotado, o Paraíso.

34


“Todo o fogo telúrico profundo”
Respondendo às questões que nos fazemos,
E nelas quando em fúria nos sangremos
Mostramos quão inútil, fútil mundo.
Asquerosas batalhas se percebem
Por nada que inda possa traduzir
A segurança tosca de um porvir,
Que crenças tão vazias já concebem.
Num passo mais audaz e verdadeiro,
Agigantado ser já se amiúda
E quando a fantasia se transmuda,
Veremos quanto o tempo é corriqueiro.
Gerar e mais gerar, regenerar,
O fim já se traduz no começar.

35


“Abranda as rochas rígidas, torna água”
A crença de um momento mais suave,
Ou mesmo algum terror que nos agrave
Incendiando uma alma eterna frágua.
Assim ao se trazer castigo e prêmio
Tratando humanidade como fosse
Criança que ganhando brinde e doce,
Gerando com igual pensar um grêmio
O peso se dilui e até sorrimos
Ao ver noutro momento o que hoje somos,
Criando um belo fruto destes gomos,
Tentamos sonegar, barros e limos.
No fundo se execrando tal idéia
Apenas se mostrando pra platéia.

36


“Somente a Arte, esculpindo a humana mágoa,”
Durante certo tempo traduzira
Um último bastião mantendo a pira
Tornando mais potável qualquer água.
No fundo simplesmente uma falácia,
A fonte se esgotando a cada dia,
Gerando a mais terrível heresia
Tomando cada ser com fria audácia.
Não quero e não suporto julgamentos
Apenas por pensares mais diversos
Libertos com certeza são meus versos
E deles traduzindo os alimentes
Que a mente necessita e nada mais,
Não vou ficar exposta a tais boçais.


37


“A realidade de uma esfera opaca”
Gerada pelo mesmo nada ser
Que tanto poderia dar prazer,
Mas sempre o caminhar com fúria empaca.
O traste se vestido com fineza
Transforma qualquer ser mais palatável,
Discurso sendo assim bem mais amável
Deveras alcançando a realeza.
Não quero a majestade da mentira,
Tampouco vou vender as ilusões,
Enquanto paraísos tu expões
Ou mesmo inferno em dura, eterna pira,
Do nada ao nada vejo a realidade,
Não quero fantasia que degrade.


38

“Dentro da elipse ignívoma da lua”
Vulcânicas mentiras, ledo engano,
E quando a sorte muda todo o plano
Expondo a realidade nua e crua,
Fantasmas que geramos e matamos,
A cada novo tempo me permite
Pensar no quanto tênue este limite
Que separa tais servos de seus amos.
A crença de um eterno navegar
É como brincadeira de criança
O gozo pelo qual ela se lança
Pensando no que a possa premiar.
Assim nesta nefasta alegoria,
Estupidez voraz, logo se cria.


39


“Assim também, observa a ciência crua,”
Ultrapassando as hordas mentirosas
E quando se percebem não há rosas
Mentira que deveras se cultua
Aliviando a dor dos ignorantes,
Escracha fantasia gera a cena,
Querendo qualquer coisa que serena,
Não vendo os seus caminhos vacilantes,
Acreditando em falsas profecias,
Mergulham no vazio de quem crê
Além do que devia e sem por que
Tocados por tenazes heresias
Religião se torna estupidez,
Resposta incoerente ao que não vês.

40


“Quando o prazer barbaramente a ataca”
A vida se transforma e gera fatos
Que traçam novos deuses, desacatos
Mergulham numa insânia que inda aplaca
A fúria desejosa do animal
Que existe e não se cala, mas consente,
E quando se tornando incoerente
Aflora este delírio mais carnal,
Hedônico onde edênico seria,
Orgasmos tão diversos valem mais,
E assim nos mais supernos rituais,
Aflora-se deveras a heresia,
E o pânico gerado pelo gozo
Tornando-se decerto fabuloso.

41

“De que a dor como um dartro se renova,”
Herpéticos prazeres que luéticos
Jamais se poderiam ser mais éticos
Trazendo toda a fúria em gozo à prova.
Perpetuando assim dores e risos,
E neles gerações seguem tais mitos,
Aonde se pensaram infinitos
Aqui se transbordando paraísos.
Ocasos entre ocasos são sarcásticos
Espasmos pós espasmos, militâncias
Geradas por loucuras e ganâncias,
Em atos simplesmente mais orgásticos.
Bacantes tempestades assolando,
Bezerros tão dourados se adorando.


42

“Ah! Dentro de toda a alma existe a prova”
Do quanto somos mesmo animalescos
Delírios verdadeiros e dantescos,
No quanto este prazer já se renova.
Atemporais verdades ditam normas
E delas gerações se embebedando,
Vertentes variáveis toscos bandos,
Enquanto toda a crença já deformas,
Nocauteando deuses com delírios
E deles se fazendo torpe imagem
Decoram tão somente esta paisagem,
Condenam aos estúpidos martírios.
E atrás desta figura caricata
Um vendilhão coleta a “podre” prata...


43


“Que é talvez propriedade do carbono”
A vera divindade onde eterniza
A vida muito além e concretiza
Um ente sendo essência e soberano.
Não creio noutra forma senão esta
Que tanto se parece inferior,
Mas dela a todo novo decompor
Enquanto assim a morte, vida gesta.
E desta realidade incontestável
Nenhuma destas crenças usuais
Permite que se veja onde jamais
Pudesse ser o tempo tão findável.
Morrendo e renascendo a cada instante,
O eterno ser disforme se garante.

44

“Essa necessidade de horroroso,”
E pútrido caminho: redenção
E nele a morte encontra a solução
Portanto se transforma dor em gozo,
Geração após traça outra verdade
E transformando o pútrido em viver
Renova-se deveras cada ser
A cada novo tempo se degrade
E traz no olhar certeza mais profunda,
Do etéreo caminhar por sobre a terra,
E assim mal começando já se encerra
Enquanto a realidade se aprofunda
Na morbidade feita em luz sombria,
E nela a própria vida se recria.


45


“Na própria ânsia dionísica do gozo,”
Respostas para a dita divindade
Gerada pelo fogo que mais brade
Tornando este repasto prazeroso,
Não crendo noutro tempo mais feliz
Tampouco num castigo após a morte,
Já não preciso mais que me conforte
Aquilo que deveras contradiz,
Paraísos em formas mais dispersas,
Alhures o que tanto vejo aqui,
Não quero perceber se já perdi
Nem mesmo sobre o quanto ainda versas,
Somente o fardo inútil que carrego,
E teimo quando um deus disforme nego.

46


“Reconhecendo, bêbedo de sono,”
Herméticos caminhos que porfio,
E neles se percebe o desafio
Que a cada amanhecer eu abandono.
Percalços encontrados no caminho
Já não mais justificam as mentiras,
Nem mesmo que se tenham vivas piras
Aonde em doce alento já me aninho.
O prêmio ou um castigo tanto faz,
Jamais eu poderia precisar
Tampouco deste intento transformar
Futuro em tempestade, gozo ou paz.
Acordos; não suporto nem mendigo,
Não quero temporal sequer abrigo.

47


“E a consciência do sátiro se inferna,”
Enquanto a do mais crente se eterniza
E quando a realidade demoniza
Uma alma busca apoio na caserna
E tudo não passando de ilusão
Castrando o que devia ser real,
Traçando sobre o bem e sobre o mal,
Os dias e os momentos que virão,
Da leda fantasia se alimenta
A mente humana feita em cores várias
As sortes são deveras temerárias
Por vezes noutra face violenta.
Mas quando se desnuda e nada tem,
O peso do viver; conheço bem.

48


“Míngua-se o combustível da lanterna”
A cada desengano ou mesmo morte,
Não tendo quem deveras dê suporte
A sorte noutro rumo já se interna,
Não posso sonegar toda a verdade
Inútil caminhar contra a corrente,
E mesmo quando o encanto já se ausente
Mais forte dentro em mim, a vida brade.
Nefastos amanhãs, podre carcaça,
Somente o que me resta, terra e vão,
Assim ao perceber tal direção
Uma esperança tola se esfumaça.
Eternidade? Mero afago tolo,
Confeito sobre um podre e falso bolo.


49


“E três manchas de sangue na camisa”
Traduzem a verdade insofismável,
O quanto se pensara em agradável
Caminho que deveras eterniza
A realidade mostra noutra face
Que tudo não passando de tão fútil
Delírio que deveras se faz útil
A quem possa saber o quanto trace
Mentiras são apenas lenitivos
E nada se mostrara tão fatídico
Desde que se criara o mito ofídico
Os sonhos são deveras mais altivos.
Serpentes, paraísos e castigos,
São na verdade toscos desabrigos.


50


“Encontra um cancro assíduo na consciência”
Herméticos delírios de uma turba,
Que tanto quanto pode mais perturba
Gerando prêmio ou mesmo penitência.
Assim caminha e ganha a liberdade
Quem pensa ser escravo do futuro,
Ainda que se veja bem mais duro
O solo que deveras nos degrade,
Putrefação transforma a vida em vida
E a morte não passando de momento,
Se dela a todo dia me alimento,
Não vejo mais a senda assim perdida,
Um deus se aproximando punitivo,
Diverso do que creio ou mesmo vivo.




51

“E autopsiando a amaríssima existência”
Percebo tão somente o mesmo nada
Realidade torpe já degrada,
Religião tentando ser ciência.
E tendo consciência do que somos,
Apenas passageiros de um vazio,
Aqui a cada verso ora desfio,
Tentando decifrar os vários gomos,
Não posso me calar frente ao sarcasmo
De quem vende ilusões e se enriquece,
Sobrevivendo assim de cada prece,
Deixando se há um Deus, o mesmo pasmo.
Abutres, rapineiras e daninhas
Cordeiros entre ovelhas mais mansinhas...

52


“A asa negra das moscas o horroriza;”
Mas saiba que serão as comensais
Do que pensara ser além e mais,
Porém nunca passou de mera brisa.
Assim entre estas larvas, tantos vermes
Destroços putrefeitos, tua herança
E deles renovando-se esperança
Senão apenas seres mais inermes.
Os vândalos que pensas; necessários
Também do vandalismo te alimentas,
O que talvez pareçam ser tormentas
Facetas tão diversas de corsários,
Deveras são tais deuses; geram vida,
Da carne sem valor, apodrecida.

53

“Sente que megatérios o estrangulam”,
Mas na verdade veja com cuidado,
Apenas traduzindo qualquer fado,
Embora microscópicos, te engulam.
E fartam-se dos restos num banquete
Que há tantos na verdade propicias
Fazendo no teu corpo romarias
Não resta do teu sangue nem filete.
Esgarçam cada parte te desossam
Percebo enfim em ti, utilidades,
Por mais que em altos tons, grites e brades
Os deuses que criaste te destroçam.
E o pântano do qual tu foste feito,
Agora eternizando, último leito.


54


“As alucinações tácteis pululam’
E fazem-te deveras pressentir
O quão inútil seja o teu porvir,
E tantas as riquezas que acumulam
As podres criaturas tão venais,
Esgoto do que fora a criação,
Se nela se mostrasse desde então,
O quão vazio o mundo em ares tais
E tudo não passando de um momento
Após outro momento, sucedendo,
Aonde tu fizeste dividendo
A pútrida verdade diz alento.
E o verme que tu foste que tu és
Devora da cabeça até os pés.




55


“Que ele tem praticado na família”
Os mais pândegos sonhos, tão devassos,
E quando se percebem mais escassos,
A sorte não permite nem mobília
O vento da verdade; eu sei, banal
Não deixa qualquer dúvida, entretanto
Mais fácil e lucrativo um novo canto
E dele a realidade virtual
De um céu iluminado, inferno em lava,
Passivos os cordeiros tão ignaros
Não sabem quanto custam, pois são caros
Enquanto a “santidade” já se lava
Em águas perfumadas, olorosas
Insânias geram cenas pavorosas...


56


“As incestuosidades sanguinárias”
Que, bíblicas transcendem qualquer deus,
Maculam os olhares, geram breus,
E neles as figuras temerárias
De deuses e demônios parecidos,
Ungidos pela mesma falsidade,
E quando a realidade ainda brade,
Ascendem-se com fúria tais libidos,
E humanidade segue sequiosa
De um dia mais tranqüilo, céu em paz,
Mas quando se criara Satanás
Um ágio gigantesco em tez viscosa
Fomenta este mercado feito em almas,
Trazendo para os crentes duros traumas.

57


“Mostrando, em rembrandtescas telas várias,”
Histórias tantas vezes dolorosas
Deveras quando vejo imaginosas
Ao mesmo tempo sendo mais falsárias
Incutem variantes que, terríveis,
Não deixam ao vivente outra saída,
Senão de transforma a própria vida
Em moeda se expondo noutros níveis.
Assusta-me o poder desta gentalha,
Que tanto quanto pode negocia
E vende a qualquer preço a fantasia,
Um cancro tão temível que se espalha.
A podridão expressa em cada tela,
Negociata espúria me revela.

58

“- Macbeths da patológica vigília,”
Herdeiros dos primeiros sacerdotes,
Pensando tão somente em ricos dotes
Dominam todo o clã, toda a família.
E bebem deste sangue apodrecido
Gerado por total estupidez,
Enquanto em tais heréticos tu crês
Teu corpo a cada esquina é consumido.
Jogatinas usando de evangelhos
Distorcem qualquer coisa que se creia,
E engolem com a gula da baleia
Cadáver se expondo: escaravelhos.
E assim se decompõe a realidade
Que a cada nova crença se degrade.

59




“É a fauna cavernícola do crânio”
Que gera a vida envolta noutra vida
E quando a consciência e consumida
Por mais que tanta glória ainda ufane-o
O ser tão poderoso exposto ao verme,
Encontra-se deveras bem mais útil,
A divindade eterna, sendo fútil
Já não traduz o corpo agora inerme,
Esboça-se talvez a reação
De quem tão humilhada e destroçada
Natura pelos homens deformada
Renova em divindade a criação.
Espúrio ser, cadáver da esperança
O homem ao banquete assim se lança.

60


“É o despertar de um povo subterrâneo”
Trazendo o renovar da própria vida,
E quando a realidade decidida
Por mais que se renegue ou desengane-o
É dele a geração da eternidade,
E nele se traduz o ser divino,
Deveras deste fato eu me fascino,
Por tanto quão nefasto este degrade
Fartura de alimento a cada morte
Redimem os erráticos viventes
Olhando com olhares bem mais crentes
Selando assim deveras nossa sorte,
Do povo mais estúpido e boçal
Um ato soberano e magistral.

61


“A família alarmada dos remorsos”
Enfrenta as punições e sacrifícios
Assim enriquecendo com seus vícios
Canalhas sem suores ou esforços
Gerindo as santidades e os perdões
Comercializando o que sem preço,
No olhar a podridão tem endereço
Enquanto os teus deslizes logo expões.
Vendetas costumeiras, deuses falsos,
Espúria e tão cruel negociata
A sorte noutra senda se desata
E vive dos tropeços e percalços,
Abutres sanguinários disfarçados,
Vivendo tão somente dos pecados...


62


“Numa coreografia de danados,”
Dançando em homenagem a um troféu
Comprando um pedacinho deste “Céu”
Vivendo dos; por crenças, enganados.
Assim caminha a sorte sobre a Terra,
Esbarra-se na fúria dos errantes
E quando se percebe por instantes
O quanto em podridão turva se encerra,
A sordidez tomando a eternidade,
O caos se gera em torno do que fora
Imagem mesmo falsa, redentora
Do que pudera ser a divindade.
Canalhas e venais caricaturas,
Com almas, se inda têm, turvas e escuras.


63


“Acorda, com os candeeiros apagados,”
E finge ser lanterna o falso brilho
Do qual e pelo qual se faz um trilho
Traçando mentirosos, toscos Fados,
Perece desta forma a criatura
Gerada pela insânia de um canalha,
O quanto por riqueza se batalha,
Tornando qualquer cena mais impura,
Impiedosos seres caricatos,
Vergonha para a raça, dita humana,
O olhar que tanto vende quanto engana,
Sacia-se em diversos, rasos pratos.
Vendendo a salvação que não existe,
Transforma em grão dourado um mero alpiste;


64

“Fazendo ultra-epiléticos esforços,”
Tentado subverter a natureza
Gerando do vazio uma grandeza
Vendendo em altos juros os remorsos,
Destroços agigantam, criam asas,
Demônios santificam-se deveras
E traçam do não ser as novas feras
E nelas imiscuem fogo e brasas.
Assim os vendilhões, magos venais,
Encarando o morrer como se fosse
Um ato muitas vezes agridoce
Criando após um cais um novo cais,
Dos temporais comuns fazem sustento,
Putrefação do corpo? Um alimento.


65


“E de su’alma na caverna escura,”
Tocados por morcegos e peçonhas,
Aonde quer deveras que inda ponhas
O quanto tu ganhastes na procura,
Vencido pelo tempo, mesmo assim,
Ainda tu desejas muito além,
E quando na verdade nada vem,
Renova-se o caminho, sem um fim.
Eternidade? Mentes sem saber
O quanto é doloroso acreditar,
Melhor é ter certeza e caminhar
Independentemente de morrer.
Senzala após a vida? Vá pro inferno!
Cada momento aqui que seja eterno.


66

“Cresce-lhe a intracefálica tortura,”
E dela sem saber já se alimenta,
O quanto desta vida se faz lenta
Velocidade intensa me amargura.
O gesto mais audaz não impedindo
A sorte desenhada dita a morte,
E quando queres algo que o conforte
Pensando no viver quase que infindo
Tecendo esta mortalha que te veste
E nela este feitio feito em crença,
Sem ter sequer talvez que te convença
Negar a eternidade, um ato agreste?
O quanto tu me afirmas e não creio,
O quanto que te digo, e estás alheio.

67


“Dentro da noite má, para agarrá-lo”
Papões que tu conheces muito bem
Da infância que deveras não mais vem,
A sorte vai seguindo um novo embalo,
Vendido numa feira este demônio
Criado para dar quem sabe um freio,
E tanto quanto pústula, receio,
Gerando tão somente um pandemônio.
Vergastas são comuns em quem castiga
E trama uma vingança, pois mordaz,
Invés de produzir somente a paz
Prostituindo a glória, trama a briga,
Genocídios em nome de uma luz?
Assim é que tu crês nalguma cruz?

68


“Que, tateando nas tênebras, se estende”
Além do quanto pode a divindade
Por tanto quando ainda bem mais brade,
O que se fora cruz já se revende.
O gosto do dinheiro é delicado,
Jamais é saciada assim a fome,
E quanto mais cadáver mais se come,
É caro sempre o preço do pecado.
Julgando e nos jogando num inferno,
Um sacerdote espúrio toma a forma
Criando proveitosa e torpe norma,
Propaga um falso guizo como eterno,
Os quadros se repetem por milênios
Deveras só mudando alguns convênios.




69

“A destra descarnada de um duende,”
Multiforme cadáver se vendendo,
E nele tão somente um dividendo
Do qual a corja imunda já depende,
Sagrando criaturas ou fantoches
Espúrios caminhares sobre a terra,
E nada da verdade ora se encerra,
Deveras são comuns venais deboches,
Assíduas caricatas, cartomantes,
Astrólogos, videntes outros tais,
Vivendo da ignorância dos boçais
E deles retirando os diamantes.
Crendices pós crendices, dizem morte
Do quanto a própria vida nos comporte.


70


“Dos filamentos fluídicos de um halo”
Jogados sobre o crânio de um ignaro,
E quando a santidade assim declaro
Deveras da verdade nada falo,
O pensamento morre a cada esquina
Vendido numa seita, numa crença
Espalha-se venal torpe doença
Que tanto quanto vende já domina
Não posso mais verter sequer palavra
Que possa traduzir o que ora penso,
Diverso quanto sei, ou mesmo imenso
Produto subvertido desta lavra,
Assim, agricultores dos infernos,
Prometem dias claros, bons e eternos.


71


“Hirto, observa através a tênue trança”
A vendeta que é feita em várias tendas,
E quanto bem mais caras as revendas,
Menor eu te garanto, uma esperança
Do demônio vivendo criaturas
Que dizem ter nas mãos toda a verdade,
Ainda quanto mais a vida brade
Da morte sanguessugas mais impuras.
Se há deus ou se não há, louvado seja
Quem bebe deste cálice satânico
O quanto deste deus se faz orgânico
Termina na garrafa de cerveja
Vendida como cálice sagrado,
Em nome do diabo e do pecado.


72


“Mas muitas vezes, quando a noite avança,”
Por sobre as almas torpes, loucas, crédulas
Gerando sempre os dotes, ricas cédulas
No quanto se mostrando deus em lança
O gesto mais estúpido e banal
Num gutural rangido feito atroz,
Demônio se criando dando voz
Ao pútrido fantoche sem igual,
Levando assim diversas multidões
Aos mais perfeitos pântanos e austeros
Olhares tantas vezes bem mais feros
Traçando do pecado exposições.
Leiloam salvação a cada instante,
No bolso reluzente diamante.




73


“Mas muitas vezes, quando a noite avança,”
E traça os mais estúpidos demônios
Aumentam dos canalhas, patrimônios
Enquanto diminui uma esperança.
Assim a cada altar negociatas
São feitas todo dia impunemente,
Quem tanto se faz deus, ou mesmo crente
Em vozes quase uníssonas, cascatas,
Gestando parcimônia onde não há,
Vestindo caricato fato espúrio,
A cada novo canto, outro perjúrio
E seja desta forma aqui ou lá
Sacrílego caminho pra fortuna,
Roubando sem ninguém que ainda puna.

74

“E os arremessos de uma catapulta”
Na secular figura tão famélica
Imagem distorcida que evangélica
Cobrando ao pecador pesada multa
Assalta tantos bolsos quanto mentes,
E gera incoerências onde um dia
Talvez por ter deidade ou maestria
Diversos seres, raros penitentes
Falaram de um amor e do perdão
Agora transformado por imundos,
Em atos mais profanos oriundos
Dos tempos onde havia salvação,
E quando vejo a cena repetida,
Pergunto de que vale a nossa vida?


75



“Com a veemência mavórtica do aríete”
Tentando destroçar quem inda pensa,
A corja procurando recompensa
Eternidade a todos já promete
E vende por trocados ou milhões
Seara inexistente ou se, gratuita,
Realidade então se faz fortuita
Pertuito aonde adentram multidões.
Acordos entre crápulas; cenário
Para um raro e vão cultivo,
O quanto em meio às trevas sobrevivo,
Sabendo do poder de um adversário,
Permite que inda tenha a resistência
E nela peço a ajuda da ciência.

76


“E explode, igual à luz que o ar acomete,”
A insânia ritual que tanto vejo,
Dilui-se nos demônios o desejo,
E a mesma história sempre se repete.
Acordo e quando sinto esta presença
Nefasta do poder e do dinheiro,
Percebo quão enorme este puteiro
E nele se vendendo qualquer crença,
Catástrofes terrestres e mundanas,
Vestindo roupas novas, de castigos,
Momentos usuais, velhos e antigos,
Agora se transformam em profanas
Escravizando assim tolas ovelhas
Domando do alicerce até as telhas.


77

“Do seu zooplasma ofídico resulta”
A eterna sensação: crime e castigo,
Condena-se ao terrível desabrigo
Enquanto a inteligência sempre insulta.
O cárcere da raça propicia
Aos vendilhões da culpa e do perdão,
Poder que se demonstra em podridão
Negando a qualquer ser uma alegria.
Jogando num cassino suas cartas
Demônios gargalhando são reais,
E querem sempre tanto ou muito mais
E logo que conseguem, mesas fartas,
Arrastam-se em correntes gerações
E delas outras turbas quais tufões.


78

“Negra paixão congênita, bastarda,”
Há tanto dominando cada ser,
Espúria dominância do prazer
Usando qualquer luz, vendida farda.
Assim negociando a claridade
Sonegam para tantos, salvação
Quais fossem donos mesmo do perdão,
Por mais que outro caminho a sorte invade.
Esgarçam divindades e os destroços
Os trastes mais vulgares, indigentes,
Somando a cada dia os penitentes
Não deixam que inda sobrem nem os ossos,
Cadáver disputado por pastores
São pútridos deveras seus odores.

79


“Sôfrego, o monstro as vítimas aguarda”
E devorará todos os incautos,
Assim como os demônios nestes lautos
Banquetes onde a sorte se resguarda
Regados com o sangue de quem fora
Outrora numa cruz sacrificado
E agora em toda esquina relembrado
Imagem tantas vezes sonhadora,
Não posso imaginar como seria
A sorte deste pobre que se fez
Naquilo que deveras inda crês,
E serve de repasto e de iguaria
Nos pântanos sarcásticos, igrejas
Em torpes fantasias, mais sobejas.


80


“A mucosa carnívora dos lobos”
Espumando-se ao ver a sua presa
Deliciosamente de surpresa
Espalhadas por tantos, vários globos,
São frágeis tais cordeiros, disso eu sei,
A fome dos abutres, incessante,
E quando se percebe a cada instante
A enorme discrepância de uma lei,
Condena-se com farta crueldade,
Na busca do que fora recompensa,
Maios do que deveras já se pensa,
A fome desta fera que te invade,
Vestindo-se de santa vejo então
Pior do que se fosse algum leão.

81


“Lembra a fome incoercível que escancara”
Glutão insaciável, tal pastor,
Com olhos penetrantes de condor,
Gerando qualquer chaga, medo e escara,
Na fúria desta fera se percebe
O quanto de fartura em sua mesa,
Seguindo com terror tanta torpeza
Devora qualquer ser em fria sebe,
Assisto à derrocada do que outrora
Pensara em salvação, amor e paz,
Terrível criatura mais mordaz
Enquanto se apregoa já devora,
E tendo este disfarce de bondade,
Não há quem não maltrate e nem degrade.


82


“Como no babilônico sansara,”
A vida se porfia e se renova
Enquanto todo dia posta à prova
A pútrida carcaça se depara
Com lobos, rapineiros e chacais,
Usando de armadilhas, bela caça,
Devoram cada parte da carcaça
E querem sempre muito e muito mais.
Assim da solidão de um eremita
À multidão ignara que caminha
Sem rumo ou direção já se avizinha
Usando da palavra mais maldita
Uma horda tão imunda quão profana,
E a todos com demônios mil engana.


83

“Uivando, à noite, em lúbricos arroubos,”
Aguardam suas presas, tais canalhas
Assim também traçando em cordoalhas
Diversos salteadores em seus roubos.
Vestidos de terrível santidade,
Usando da mentira e do castigo,
A corja nos condena ao desabrigo,
Por mais que outro caminho a mesma invade.
Nefastos caricatos traçam planos
Adonam-se de todo este universo
Gerando um deus deveras mais perverso
A salvação vendida em vis enganos.
Restando ao caminheiro a negação
Mal reparando então contradição.

84

“Toda a sensualidade da simbiose,”
Que é permitida dentro das igrejas
Envoltas por festejos e cervejas
Por mais que doutro lado não se goze,
Assisto à derrocada do que fora
Outrora a bela senda onde se via
Um sonhador em plena fantasia,
Traçando nova sorte, redentora.
Preâmbulos do inferno feito aqui,
Somando tais fortunas, nada crendo,
Somente se pensando em dividendo,
Martirizando o pobre que há em ti,
E quando te estraçalham e vomitam,
Os bolsos bem mais cheios, já se excitam.


85

“No horror de sua anômala nevrose,”
Terrores costumeiros; disseminas
E sabes que eles são sobejas minas
Enquanto ao corpo resta uma necrose,
Partícipes da orgástica loucura
Que tanto professaste, vil fantoche
E mesmo quando em ares de deboche
Perfazes com terror a arranhadura
Dos pregos sobrevives, leda cruz,
Aonde ensandecido mensageiro
Do amor que redimisse e fosse inteiro
Goteja tanto sangue, linfa e pus.
Assim ao revendê-lo no mercado,
Tu geras vil moeda, a do pecado!


86


“O cuspo afrodisíaco das fêmeas”
A tentação da carne, isto é pecado?
Se o sexo sempre foi abençoado
Por que tanto desvio enfim e; teme-as?
Hipócritas demônios de uma figa,
Se tudo o que desejas demonizas
Também já poluindo mesmo as brisas
Aonde em que caverna a alma se abriga?
Terríveis agiotas, sacripantas,
Vestindo santidade? São bufões,
Enquanto são das almas vendilhões
Produzem leda série: santos, santas.
E cobram aluguéis destes incautos,
Banquetes são satânicos e lautos.

87


“No sombrio bazar do meretrício,”
Jogado pelos cantos, quem se fez
Um dia por total insensatez
Já que era carpinteiro por ofício,
Lunático talvez, mas com certeza
Uma alma bem mais pura, além da dor,
E quando se propôs um redentor,
Não tinha nem noção desta grandeza.
Falando para tantos mal sabia
Que ali na própria casa onde criara
Imagem mais sublime, em tal seara
Canalha sem perdão prostituía
Na face do cordeiro feito em paz,
Geraram um terrível Satanás.

88

“E à noite, vai gozar, ébrio de vício,”
Depois de ter pregado paz e glória,
No quanto ainda vende-se em vanglória
Cavando com os pés seu precipício.
Se houver um deus, cuidado meu amigo,
Orando pra que tudo seja farsa
Senão tua alma podre, vaga e esparsa
Terá eterna fúria como abrigo.
Aterrorizas todos com pecados,
Que tanto propagaste, mas cometes
Envolto por meninos e pivetes.
Desejos mais terríveis saciados,
E agora vens falar na pobre cruz?
Tua alma acanalhada expele pus.


91

“Brancas bacantes bêbedas o beijam”
Enquanto ele ditando normas, leis
Diverso do que tanto procureis
Mentiras que deveras tanto aleijam
Da glória aonde o manto se sagrara
E agora em luzes falsas são vendidas
Levando às frias trevas tantas vidas
Da chaga escancarando, pois escaras,
Assim ao se fazer bendito, seja
Demônio disfarçado num pastor,
Vendendo bem mais caro cada andor
A sorte bem diversa do que almeja
Uma alma feita em cruz e sacrifício
Satânica afigura um “Sacro Ofício”.

92


“De uma animalidade sem castigo”
Deveras ao se impor sobre os fiéis
Mudando na verdade seus papéis
Traçando a cada dia o desabrigo,
Não posso concordar com execráveis
Demônios se vestindo de pastores,
Causando tão somente dissabores
Aonde deveriam ser amáveis,
Medonhos os fantoches, pois heréticos
E assim ao se proporem redenção
Satãs adormecidos mostrarão
Condenam depois disso os mais ascéticos
Já que prostituíram próprio pai,
Para onde esta canalha agora vai?

93


“Há estratificações requintadíssimas,”
Aonde se pensara em igualdade,
Depois venham berrar fraternidade
Em vozes mentirosas, mas “altíssimas”
Senhores do perdão e do pecado,
Tão torpes quanto imundos passageiros
E quando vão bancando mensageiros
Tentando corromper o nosso fado,
Mesquinhos os cadáveres que vendem,
Farsantes, pois hipócritas tal súcia
Usando cada dia tanta astúcia
Os seus próprios desejos sempre atendem
Usando das crianças indefesas,
Depois vêm proferir suas “grandezas”.


94


“Como que, em suas células vilíssimas”
Usando de um farsante sacerdócio
Ousando maltratar cada beócio
Negociatas feitas, urgentíssimas...
São donos de riquezas, mil colégios,
Os mais caros decerto da cidade,
Depois vêm me dizer de uma humildade
Sandálias franciscanas? Sacrilégios.
Pedir perdão à corja tão imunda?
Jamais se poderia acreditar
Quem faz do próprio altar um lupanar,
E vive sempre às custas das profundas?
Infernizando tudo, nada vê
Vendendo com alto ágio o que não crê!

95

“Nutrindo sua infâmia a leite e a trigo”
Usando do infeliz a carne exposta,
E há tanto com certeza decomposta,
Vendendo caro o grama. Não consigo
Nem posso suportar tanta mentira,
E mesmo que não creia neste pai,
Enquanto a corja escusa sempre trai,
Aonde acreditar em fogo e pira?
Expira-se a verdade a cada dia,
Amortalhando assim quem disse amor,
E mesmo que não seja o salvador,
Ser explorado assim? Jamais devia.
Maldita seja então esta canalha,
Que para os Demos, todos, já trabalha.



96

“Que o sensualismo sodomista exalta,”
Vontades escondidas, seminários,
E neles se trancando nos armários
O sexo que deveras já faz falta,
Assim ao se mostrar mais arredio,
Sacrílego demônio, quase eunuco
Verdade quando dita, sempre educo,
Vivendo tão somente em tosco cio.
Gerações se perdendo neste infausto
Matando gerações que porventura
Ainda seguem cegas na procura
Daquele que se deu em holocausto.
Castrassem, pois então estes satânicos
Ou liberassem gozos mais orgânicos.

97


“Estoutro agora é o sátiro peralta”
Que faz da turbulência seu enredo,
E quanto dos meus sonhos eu concedo
Enquanto este demônio já se exalta.
Incautos desperdiçam seu dinheiro
Em tantos donativos para quem
Deveras na verdade só contém
Satânico caminho, corriqueiro,
E quando se acusado de pedófilo,
Por ter furtado grande doação,
No mínimo o canalha é um ladrão
Bebendo de uma cruz, chega a necrófilo.
E o pandemônio dita norma e lei,
Depois fui eu ateu, que tanto errei...


98


“À herança miserável de micróbios”
Refeita em vida nova, bem mais sábia
E quando desta vida surge lábia
Perfazem descaminhos nunca sóbrios.
Vendendo um pobre ser crucificado,
Jogado num altar, tanta vergonha,
Sabendo da serpente e da peçonha,
Da imensa taxação de algum pecado,
Prostíbulos aonde Madalenas
Apedrejadas morrem dia a dia,
E assim nesta terrível heresia,
Aquele que pensara mais serenas
As vidas pelas quais se dera inteiro,
Do amor e do perdão, vão mensageiro.


99





“Estragou o vibrátil plasma todo,”
Aquele vendilhão num belo templo
Que agora embasbacado já contemplo
Rescende neste instante a charco e lodo.
O povo compartilha a mesma cruz
Daquele irmão que um dia se quis deus,
E quando vejo a sorte num adeus,
Eu tenho pena mesmo de Jesus.
Pudesse esse judeu ter mais juízo
Seria rei, não nego a majestade,
Porém num holocausto à humanidade,
Arcou somente com tal prejuízo,
Enquanto em cima dele fazem festa,
A imagem do cordeiro é tão funesta.


100


“E foi então para isto que esse doudo”
Um dia se deu mesmo em sacrifício
Seguisse carpinteiro, belo ofício
Abrindo alguma tenda, com seu toldo,
Não seria jamais exposto ao fato
De ter a sua face maltrapilha
Domada pelos lobos, vã matilha,
Cabeça decepada noutro prato.
Agora se perfilam desonrosos
Venais e sacripantas, tanto nojo,
Enquanto a cruz eu vejo neste bojo,
Aonde procuraram os leprosos
Agora são vendidos os milagres,
Dos vinhos feitos Graça, só vinagres.




101


“No cadáver malsão, fazendo um s”
Ou melhor um te, percebo o quanto
Ao abraçar o mundo em desencanto,
No olhar eterna e mansa, bela prece,
Encontro este cenário devastado,
E nele as cenas todas se repetem,
Enquanto as multidões enfim competem,
Querendo cada uma o seu legado,
Apodrecendo o pouco que restara
Daquele ser suave e mesmo manso,
Ao ver o sofrimento seu, alcanço
O quanto é dolorosa cada escara
Aberta nesta vil humanidade,
Aonde desejara uma igualdade.


102


“Vendo as larvas malignas que se embrulham”
Comendo cada parte do repasto,
Eu tenho a sensação do tempo gasto
Enquanto tais canalhas o debulham,
Vencido pela insânia no seu tempo,
Agora exposto como um vil troféu,
Olhando para o nada vê um céu
Imenso feito em dor e contratempo,
Assassinos vorazes, rapineiros,
Que outrora devoraram o infeliz,
Atualidade então repete e diz,
Momentos que pensara derradeiros,
A pústula se abrindo em cada chaga,
Satânica figura tudo draga.


103


“E até os membros da família engulham,”
Ao verem quão inútil sacrifício
Jogado num enorme precipício
As turbas do presente tanto empulham
Que a pobre criatura, este judeu,
Ao ter a sensação de eternidade,
Enquanto a cada dia já se invade
O lar que um dia quis que fosse seu,
Depredam, prostituem, negociam,
Prometem o que sabem nunca fazem,
E o que ainda resta; já desfazem
Cena terrível logo propiciam.
Modernos vendilhões, batinas, ternos,
Se alimentando sempre dos infernos.

104




“Toma conta do corpo que apodrece”
A mortalha que um dia a prostituta
Cobrira a criatura que inda luta
Enquanto a realidade se esvaece,
O parto do quem sabe no futuro,
Já anunciando a morte do passado,
Aonde se vivendo do pecado,
O mundo penetrara neste escuro,
Igreja sendo dona do universo?
A humanidade tendo este castigo
Deveras tão terrível, não consigo
Nem quero imaginar neste meu verso,
Já basta o que fizeram com Joana,
A santa que é guerreira e que é profana.

105


“A bacteriologia inventariante”
Traduz o refazer da vida, mas
Aonde se postara Satanás
A corja na verdade sempre mente,
Usando da figura do menino
Que um dia se entregou, qual pobre otário,
E agora rende sempre um honorário
Bem caro para um sórdido cretino,
Abutre carniceiro, um agiota
Vendendo o que de Graça recebeu,
Quem fala mesmo sendo incréu e ateu,
Já viu e muito além de qualquer cota,
Os vermes andam soltos sobre a terra
Enquanto uma esperança já se enterra...


106


“É uma trágica festa emocionante”
Aquela feita em nome do demônio
Satânica figura em puro hormônio
Canibalesco rito deslumbrante,
Assim também se faz em nome dele,
Do herdeiro do reinado de Israel
Dizendo estar num Éden, vulgo céu,
Orgástico desejo já compele
A qualquer festa feita desta forma,
Dos carnavais de deus ou do diabo,
Festejo com certeza mais nababo
Enquanto uma mensagem se deforma,
Iguais em tudo eu vejo tais festeiros,
Somente muda a face dos puteiros.


107


“No espasmo fisiológico da fome”
A sensação da morte se aproxima,
Enquanto humanidade em baixa estima
Não tendo sensação de quem a dome,
Gerando a morte apenas por prazer,
Um velho costumeiro ritual,
Aonde se mostrando o canibal
Devora sem perguntas qualquer ser,
A culpa é do demônio? Meu amigo.
Se somos nós demônios de nós mesmos
Vagando sem destinos pelos esmos,
Deveras demonstrando o que persigo,
Imolam cada vez mais o cordeiro
Santificando então sexo e dinheiro.


108


“Como as cadelas que as dentuças trincam”
Percebo as tais bacantes do senhor,
E quando se fazendo seu louvor
Com cruzes e cadáveres, pois, brincam,
Assisto aos mais profanos caminhares
Longínquas vozes ouço de quem tanto
Pensara num irmão com tanto encanto,
Explorado sem pena nos altares,
Assim caminha rumo ao seu final,
Quem tanto desejara paz e glória
Demônio comemora uma vitória
E ri-se esta serpente sensual,
Enquanto Barrabás se congratula
Nos olhos dos fiéis, somente a gula.

109


“Numa glutoneria hedionda, brincam,”
Usando de uma imagem tão sutil,
Se tudo o que acontece se previu,
Paredes deste templo sei que trincam,
E o gozo insofismável já se alastra
E deixa cada qual bem mais contente,
Aonde se pensara em penitente
Vontade de justiça já se castra.
Hedônicos espectros vagam nus
E deles posso ver a hipocrisia,
E enquanto este cadáver não esfria,
Vendido numa esquina, o tal Jesus,
Que outrora tanto amor ofereceu,
Melhor se o povo fosse enfim, ateu.

110



“Dentro daquela massa que o húmus come,”
O cadáver putrefato de quem tanto
Pensara noutra tempo, novo canto,
Enquanto a realidade já consome
O bêbado palhaço ri de tudo
E mesmo se mostrando este bufão
Caminhos mais diversos mostrarão
Por mais que na verdade não me iludo
Eu sei da caricata criatura
Que veste esta mortalha mais venal
A Páscoa se transforma em bacanal,
Tomando toda a terra esta loucura,
Depois venham falar em Satanás?
Deixem este diabo, pois em paz!

111

“Assombra! Vede-a! Os vermes assassinos”
Passeiam sobre escombros de quem fora
Imagem muitas vezes redentora
E agora não se dobram nem mais sinos,
Jogado pelas ruas, qual escória
Nefasta criatura já mendiga
A sorte que deveras tanto amiga,
Agora tomando ar, mais merencória
Percebo quanto custa a divindade
Melhor não ter seguido a sua sina,
Pior do que o demônio, esta assassina,
A dita sem razão humanidade.
Apodrecendo assim o carpinteiro
Banquete para cada rapineiro.


112





“A desarrumação dos intestinos”
Exposto nesta laparotomia
À sangue frio feita a cada dia,
Por tantos e terríveis vãos cretinos;
Assumem o papel de redentores
Vendendo a salvação que não terão
Aonde se pensara em podridão
Deveras com certeza são senhores.
Jogando no passado toda a sorte,
Dominam o cenário, vendem cruzes,
E quando se percebem toscas luzes
Sem ter sequer quem mesmo já conforte,
Vivendo do pecado tal canalha,
A sorte do cordeiro ora se espalha.


113


“Dos apodrecimentos musculares”
Ao que restar depois destes destroços
Somente poderemos ver os ossos
Jogados feito cruzes nos altares,
Assim ao explorarem o defunto,
Canibalescamente decomposto,
Cobrando com tal ágio seu imposto,
Não tendo com certeza novo assunto,
Expondo este cadáver, seu troféu,
Amor já se esquecendo na tortura,
E quando até do papa esta amargura
Aonde se verá, depois, o Céu?
Prefiro prosseguir assim ateu
Do que sacrificar pobre judeu.

114


“Tudo coube na lógica medonha”
E dela se coleta a dura imagem
Daquele que perdeu sua viagem
E mesmo ainda morto, ledo, sonha.
Vergonha para a toda humanidade,
Cordeiro feito em trágico holocausto
Enquanto nababesco em raro fausto
O Papa vai traçando nova grade,
Metendo seu bedelho fedorento
Naquilo que jamais lhe caberia,
Aonde se traduz a putaria
Canalha degenera em vil tormento,
Proíbe a proteção contra a doença
Depois falar em deus. A quem convença?


115

“Os dedos carregados de peçonha,”
Apontam para a cruz do pobre hebreu,
Que o mundo há tantos anos conheceu
E agora morre mesmo é de vergonha.
Não posso me calar perante os fatos
Que vejo solaparem sua herdade,
Aonde se mostrando a crueldade,
Em finos e mais duros, vãos retratos,
Açoites e vergastas são de deus?
Jamais concordarei com tais torturas,
Me calem se tiverem armaduras
Melhores outros dias, onde ateus
Ao menos não se davam à nobreza
Enquanto maltratavam a pobreza.

116


“Engrenagem de vísceras vulgares “
O ser humano pensa ser maior,
Quando em verdade sei até de cor,
O quanto se vendera em vãos altares,
E geram novos seres tão imundos
Pensando numa nova realidade,
Por mais que ainda veja a humanidade
Entrando pelos vales mais profundos,
Medonhas criaturas matam cristos
E dizem ser normal tanta peçonha,
Por tanto que outro mundo se componha,
Ainda não drenaram velhos quistos,
E sabem muito bem disto que eu falo,
Repito até cansar, jamais me calo.


117


“O coração, a boca, em síntese, o Homem,”
Nefasta criatura que domina
E enquanto se mostrando em tez cretina
Os bens deste planeta se consomem,
Não tendo mais limite crê que deus
O fez tal como fosse semelhante
Que deus seria esse, pois, farsante?
Meus dias são melhores quando ateus.
Jogando toda a sorte tela terra,
Vestindo-se deveras de demônio,
Achando ser demais seu patrimônio,
Verdade a cada dia mais se emperra,
E a velha serventia do planeta,
Diverso do que bíblia já prometa.


118


“E o que ele foi: Clavículas, abdômen,”
Devastado por tantas canalhices
E nada do que dizes caduquices
Enquanto estas belezas negam o homem.
Sórdida garatuja caricata
Um bípede cruel e nada mais,
Gerando a cada dia temporais,
Devastam todo o solo, terra e mata,
Matando o que pudesse ser um dia,
Além de mera imagem do passado,
Dominam salvação ditam pecado,
Mas não percebem tanto esta heresia,
E os vendilhões fazendo cada templo
Aonde a farsa imensa, eu só contemplo.


119


“Estrangulada dentro da matéria”
Imagem do que fora liberdade,
Por mais que a cada dia se degrade,
Espalha sobre tantos a miséria,
Assim ao ver a face do satânico
Que um dia se mostrara como um deus,
Prepara-se somente para o adeus
Um ser feito de escória, pois orgânico,
Jagunços espalhando sobre a face
Desnuda do planeta destruído,
Deixando a liberdade em vago olvido,
Porquanto sobre tudo, gera impasse,
Aonde poderia a mansidão
Se existe tão somente podridão?

120




“Sonoridade potencial dos seres,”
Ainda não se fez mais verdadeira,
Aonde apodreceram a bandeira
Não cabem mais sequer alguns quereres,
E os víveres se acabam pouco a pouco,
Já não sustentam mais fera gulosa,
Que quanto mais deseja quer e goza,
Num brado feito aos berros, quase rouco.
Assisto à derrocada do que tanto
Fazendo da soberba seu discurso,
Mudando de uma história todo o curso,
Deixando como herança o desencanto,
Falando em semelhança, matam deus,
Denigrem sua imagem cães ateus!

121


“Fonte de repulsões e de prazeres,”
A vida se transforma intensamente
No quanto se percebe mais premente
Determinado tempo para os seres,
Do quanto se aproveita cada dia
Permite que se tenha a qualidade
Ou não, e aproveitar tal liberdade
Traduz o que deveras se historia
Felicidade é fato momentâneo
Assim como a tristeza também passa,
Esvai-se de repente qual fumaça
Volátil caminhar tão instantâneo,
Saber singrar o mar em meio aos ventos
Variações de risos, sofrimentos.

122


“Quimiotaxia, ondulação aérea,”
Somando nossos atos e caminhos,
O quanto somos mesmo tão sozinhos
E nunca dominamos a matéria
Que segue por si só, doença e medo,
Alheia ao quanto quero ou não desejo,
No nada ao nada é tudo que prevejo,
E assim se perpetrando o meu enredo,
A cada novo dia, sol ou bruma,
Reflexos do que ocorre dentro em mim,
Sabendo do começo, aonde é o fim?
Aos poucos o que sou somente esfuma
Ondulações do tempo, pendular,
Diversas do que pude imaginar.


123


“Raio X, magnetismo misterioso,”
Olhares que adivinham o futuro,
Ciganos sonhos, ritos tão obscuros
Assim se caminhando em dor e gozo.
Astrólogos, tarôs, búzios; mentiras,
Somente fuga e medo do que vem,
E quando se percebe se é ninguém
A morte nos reparte em várias tiras,
Apenas dos destroços novo ser
E dele noutra forma, eternizando
O quanto que vivemos, desfrutando
De uma tristeza imensa e do prazer
Só sei que nada sei e isso me basta,
Imagem do futuro? Já tão gasta.

124


“Será calor, causa ubíqua de gozo,”
Onipresente esterco do futuro,
O quanto se mergulha em luz e escuro,
Deveras nos permite um fabuloso
Delírio feito em vida, mas ao fundo
Se vê que nada somos e amanhã
Noutra figura opaca, frágil, vã
Enquanto me ofereço e já me inundo
Da pútrida emoção da minha morte,
Na descarnada imagem do que sou,
Ossatura deveras demonstrou
Idêntico caminho, mesma sorte,
E desta realidade sem ter fuga,
Espelho coletando cada ruga.


125


“Da energia intra-atômica liberta”
Raiando imensamente força e luz,
O quanto da verdade reproduz
Enquanto a vida aos poucos me deserta.
Adentrar os segredos; prosseguir
Teimando contra o meu imaginário
O rio encontrará seu estuário,
É tudo o que conheço do porvir,
Do imenso mar chamado mesmo vida,
As águas retornando após momentos,
E neles alegrias e tormentos,
Aonde ocorre encontro diz partida,
Na cíclica existência nosso Norte
Condena-se ao nascer e após à morte.



126


“Nas esterizações indefiníveis”
Organizando a vida em formas tais
Que parecendo antigos rituais,
Deveras conhecidos e plausíveis
Refaz-se em Nitrogênio o quanto é vida
Carbônica existência, nada além,
Do quanto a natureza em si contém
História previsível, conhecida,
Orgânica matéria decomposta
Gerando outra matéria, em novo ser,
No quanto isso possa parecer
Estranho se a verdade assim exposta
Traduz realidade; e a fantasia
Por conta de quem mitos, lendas; cria.


127

“Todos os agregados perecíveis,”
Redundarão em vida após a morte,
Assim se tendo aos olhos nosso norte,
Eternidade em outros frágeis níveis
Não passa de ilusão, sonho egoísta
De quem não se conforma em ser apenas
A peça de engrenagens. Julgam plenas
Por mais que a realidade mostre a pista.
Estúpida e fanática ilusão
Gerando discordância e nada mais,
Aonde se prevê os eternais
Caminhos; só teremos podridão.
Vivemos dos cadáveres e um dia,
Seremos como os tais, uma iguaria.

128



“Dessa estranguladora lei que aperta”
Vislumbro nada além do simples fato
Do quanto se pensara em desacato
Verdade há tanto tempo se acoberta,
Durante gerações não se podia
Falar abertamente de outra forma,
História refletindo nos informa
O quanto se vivera em fantasia,
Fanáticos em ritos mais heréticos
Matando quem deveras discordasse
Não podendo aceitar tal podre face
Tomada pelos vãos e tolos céticos.
Evolução se faz acidental,
Principio, meio e fim: é natural.

129


“Mas ele viverá, rotos os liames”
Em nova forma, é claro, e tomará
O rumo bem diverso do que já
Tivera; são assim os tais ditames
Da vida eternizada sobre a Terra,
Em átomos, moléculas somente,
Refeita noutro grão, noutra semente,
História se repete e não se encerra,
Vagando por instantes, somos tanto
Quanto o mais imbecil dos seres, pois
Será o que teremos no depois,
Porquanto ainda trague o desencanto
Insofismavelmente eis a verdade,
Transformação exige que degrade.

130


“Tal a finalidade dos estames”
Atar o que já fora e o que virá,
Assim a eternidade se fará
Por mais que outros caminhos inda trames,
Decerto tu verás a luz do sol,
Após a tua morte, eu te garanto
Diversa forma, cobre o velho manto,
E tudo continua no arrebol,
Do homem muitas vezes poderoso,
Um verme tão somente uma bactéria,
Assim no renovar de uma matéria,
O rei se mostra um pária, um andrajoso,
E assim ao perceber tua nudez
Aonde se esconder tanta altivez?

131


“O espólio dos seus dedos peçonhentos”
Em meras e asquerosas formas vejo
E quando ao caminhares tão sobejo,
Achando-se mais forte que estes ventos
Percebas quanto inútil tu lutares
Contradições diversas tu verás
Num ar bem mais tranqüilo quão mordaz
As pútridas verdades, teus altares.
E vendo-te deveras deste jeito
A majestade feita em simples ser,
Aonde levarás o teu poder?
A natureza dita e tem seu pleito
Na ínfima presença do que temos
Naquilo que amanhã transformaremos.

132


“Ao clarão tropical da luza danada,”
A vida se transforma em rapidez,
Recomeçando tudo o que desfez
Gerando a que deveras foi gerada,
E assim no refazer da minha história
Recicla-se deveras a matéria,
Da plena magnitude até miséria,
Não importando mais qualquer vanglória
Escória do presente no futuro
Um ser tão magistral, mas não perduro,
Depois ao me tornar um verme apenas,
Revivo sem memória, mas revivo,
E assim não se bastando ser altivo,
Melhor seguir em horas mais serenas.

133



“Como quem se submete a uma charqueada,”
Depois da plenitude de um reinado,
O tempo que vivera desabado
Depois do quanto ser, volvendo ao nada,
Um verme tão somente e nada mais,
Assisto ao meu eterno caminhar,
A natureza sendo meu altar,
E nela tempestades, temporais,
Vencidos depois lamas, charcos, lodos
Enredos tão diversos mesmo rumo,
O quanto do viver somos o sumo
E não escapa nada, vamos todos
Ao fim e ao recomeço, sem final
Eternidade é fato natural.


134


“A mostrar, já nos últimos momentos,”
Tanta necessidade de viver
Se ao fim jamais amigo irás morrer
Não necessitas tantos desalentos,
Eterno sim, tu és, e disso afirmo,
Embora seja ateu, nunca o neguei,
A natureza segue a sua lei
Deveras e te provo e até confirmo,
Extinta a vida em ti, já recomeça
E nunca mais termina depois disso,
Diversidade feita em forma e viço,
Mas somos da engrenagem mera peça,
E quando se demonstra a realidade
Existe sim, garanto, a eternidade.


135


“Sobre a esteira sarcófaga das pestes”
Emanações diversas se percebem
E quando novas mortes se recebem
Terrenos que deveras mais agrestes
Proliferando vida, após o esterco
Jogado em profusão por sob a terra,
E quando a realidade se descerra
De vida após a vida mais me cerco.
A morte não existe; é mero plano
Diversidade gera outro ser,
Daquele que deveras pude ver,
E nisto não existe torpe engano,
Levando ao próprio cerne, a natureza
Transforma qualquer dúvida em certeza.







136


“E hão de achá-lo, amanhã, bestas agrestes”
Enquanto tu pensavas no poder
Verás que quando ao fim poderás crer
Usando tão somente novas vestes
A sorte não traindo o dia a dia,
Transformações diversas são previstas,
E quando na verdade mais avistas,
Noutro sonho qualquer se refugia
Uma alma que se pensa mais audaz
E mesmo se altaneira, ao fim do engodo
Retorna com certeza ao mesmo lodo,
Do qual realidade se compraz,
E assim num ato feito morte e vida,
Encontro compartilha a despedida.


137


“A que todas as coisas se reduzem”
Após o retornar ao seu início,
Atípica mortalha, precipício
Aonde noutras formas já reluzem,
Mutável criatura, vida resta
E deixa após imagem mais sutil,
O quanto a realidade se previu,
Embora te pareça tão funesta,
Assisto ao renascer diariamente
Constância não se vê tampouco a forma
Resume o que deveras se deforma,
Gerando nova vida, e se pressente
Alheio ao que se passa não se vê
Tampouco se procura algum por que.


138


“O horror dessa mecânica nefasta,”
Assusta com certeza, mas percebo
O quanto é necessário algum placebo
Que da realidade, mesmo afasta,
Assim ao se mostrar a divindade
O que em verdade seja alguma fuga,
O corpo ao qual a vida ora se aluga
Deseja crer na própria santidade,
Galgando paraísos invejáveis
Fugindo deste abismo feito em terra,
Diverso do que sabe agora encerra
Caminhos preciosos e louváveis,
Mas quando se percebe por inteiro
O corpo se oferece ao rapineiro.


139


“E apenas encontrou na idéia gasta,”
Algum apoio mesmo. É necessário
Usar com parcimônia algum armário
E se esconder do quanto se devasta
Atroz realidade não sonega
E a morte jamais deixa de trazer
O renovar da vida noutro ser,
A claridade é tanta que te cega.
Preferes crer num gesto sonhador
De uma evidência torpe feita em fé,
Corrente atando assim a cada pé,
Mas que possa te dar tanto louvor,
Deveras este deus que tu criaste,
Em ti já não faria algum contraste.


140


“Que, iguais a fogos passageiros, luzem”
Momentos desta vida tão sutil,
E nela a própria senda se previu
E rumos tão diversos se produzem,
Assim ao caminhar por sobre a Terra
Não vês que a cada passo dado agora
O quanto do que foste te devora
E a fantasia apenas te soterra.
Percebo quanto é fútil crer no quando
Se toda a realidade traz à luz
Caminho para o qual já nos conduz
Matéria em matéria transformando,
Negar a própria sorte não ajuda,
Verdade se mostrando em voz miúda.

141


“A vida fenomênica das Formas,”
Enquanto tão mutável realidade
Transforma mal começa o seu degrade
E dela novos dias, velhas normas.
Sincrônicos momentos pontuais
Acrescentando pouco ou quase nada,
E vendo a mesma história já contada,
Obedecendo aos vários rituais
Permanecendo aquilo que já fora
Em nova face, creio ter assim,
Início coadunando com o fim,
Embora outra verdade é tentadora,
Percebo nesta sebe à volta a vida
Há tanto, eternamente, ressurgida.

142


“Quis compreender, quebrando estéreis normas,”
O refazer da vida em novo nível,
E ainda que pareça ser mais crível
No quanto da verdade já deformas,
Pensar na falsa imagem, divindade,
Suavizando a agreste caminhada,
Seria bem mais fácil do que o nada,
Da mente após a morte, eis a verdade,
Perder a consciência é doloroso,
Deixar tantas estradas para trás
O quanto desta vida satisfaz
Mesmo se feita em dor, temor e gozo,
Assim atado a Terra vejo um deus,
Com olhos na verdade mais ateus.


143


“Que se chama o Filósofo Moderno”
Quem tanto percebera novos tempos
Envoltos pelos mesmos contratempos
Gerados sobre o ser ou não eterno,
Externo opinião, direito meu,
E sinto neste sítio outra vertente
Criada pelo engodo mais urgente
Negando cada passo de um ateu,
E tento traduzir esta esperança
Em forma mais sutil, inteligível
Aonde não pudera ser mais crível,
A mente na verdade não alcança,
O deus sendo criado para dar
Alento ao que ficou e o amparar.



144

“Esse mineiro doido das origens,”
Que transformando a morte em nova vida,
Escuras caminhadas; não duvida
Tampouco se propõe a tais vertigens,
Devora a podridão e se alimenta
Da decomposição gerando após
Um ato que pareça mais atroz
Ou mesmo uma faceta violenta
Da dura realidade sendo assim
Eternidade eu vejo e não renego,
Aonde se podia ser mais cego,
Acreditar num sonho de onde vim,
Partindo para além do vale escuro,
Por onde tão somente já perduro.


145


“Com a cara hirta, tatuada de fuligens”
Minúsculo fantoche te devora
A vida desta forma já se ancora
E volta num momento às vãs origens,
Recicla-se deveras a existência
E tanto se demonstra o quanto fomos,
E agora tão vazios; inda somos
Já não conheço ao menos a clemência
De quem pudesse um dia me mostrar
Diversa realidade da que vejo,
Mesmo se houvesse em mim algum desejo
Persiste cada coisa em seu lugar,
Mutante criatura se eterniza
Diversidade em forma já matiza.


146

“O desespero endêmico do inferno,”
Assusta aos passageiros da agonia
E quando o mito assoma e já te guia,
Diverso do que creio ser eterno,
Vagando pela vida com tal cruz
Da qual tu não libertas, sendo crente
O quanto do futuro se pressente
Em lava, medo, peste, fogo e pus
Diverso do que tentas com enganos
Vestindo esta mortalha antes do tempo,
A cada novo passo um contratempo
Mudança tão freqüente de teus planos,
Inferno que inventaste; este papão,
Mantendo os teus limites sobre o chão.


147


“Trazendo no deserto das idéias”
Momentos tão diversos riso e pranto,
Aonde se pudesse ter encanto,
Deveras tu pensaste em assembléias
E delas julgamentos mais insanos
Dos erros cometidos, contra o ser,
Embora tanto pensas no prazer
Somando no final, diversos danos,
Jogado contra a fúria não decide
E o passo sonegando uma saída,
Destroças o que outrora fora vida
E até por teus engodos, já te agride
Formato onde te punes simplesmente
Demônio dentro em ti; sinto presente.

148


“Aí vem sujo, a coçar chagas plebéias,”
O demônio, parceiro contumaz,
Que tanto te maltrata e satisfaz,
Domando a maior parte das idéias,
E quando foges dele não percebes
O quanto está em ti sempre abrigado,
Moldando no futuro o teu passado,
Ainda caminhando em podres sebes,
Assustas com figuras infantis
Atípicas imagens horrorosas,
Enquanto na verdade, caprichosas
Vontades e desejos tão sutis,
Percebo que criaste a sordidez
Aonde não alcança a sensatez.


149


“E um tropismo ancestral para o Infortúnio”
Transforma a tua vida num inferno,
Aonde poderia ser mais terno,
Deseja tão somente quem já pune-o,
Assisto assim ao fim da vaga peça
Criada há tanto tempo por dementes,
E quando na verdade não pressentes
Sem nada que talvez ainda impeça
O caminhar por pedras espinheiros,
Momentos tão cruéis onda não vês
Sequer se existem mesmo alguns porquês,
Da morte e renascer os engenheiros
Vivendo sob a terra, são medonhos,
Mas não como os demônios de teus sonhos.

150


“Como uma vocação para a Desgraça”
O ser humano goza do sofrer,
Parece que talvez lhe dê prazer
A sorte caprichosa que esfumaça
E traça a solitária desventura
Do prêmio e do castigo, pobre infante,
Não vê que na verdade a cada instante
O sofrimento vem e se perdura
Prenunciando o gozo que virá,
Na cíclica beleza feita em treva
Por mais que na verdade nada ceva,
Deseja esta colheita, e desde já,
O que percebo então inglório mito,
No qual com toda fé, não acredito.

151


“Na alma crepuscular de minha raça”
Eu vejo o nada ser como se fosse
Talvez alguma imagem que agridoce
A própria natureza por si traça,
Vencido caminheiro no futuro
Embalde restará qualquer espaço
Somente o que deveras já desfaço
Aonde na verdade me perduro,
Ausente dos meus olhos a esperança
Que move a humanidade, de outra senda,
O quanto a verdade não desvenda
A fé sem precisão alguma alcança.
Mortalha após mortalha simplesmente
É tudo o que deveras se pressente.





152


“À luz do americano plenilúnio,”
Romântica visão que não comporta
Certeza de fechada sempre a porta
Gerando no futuro este infortúnio,
Medonho caricato do presente
Apenas o que sou e nada mais
Exposto aos tantos fortes vendavais,
Andando pela terra qual demente,
Percebo a solitária desventura
De quem se imaginara bem mais forte,
Não tendo outro caminho que conforte,
A sorte se transforma em amargura,
Aonde os olhos morrem tão ateus,
Bebendo da ilusão invento um deus.

153



“Amarguradamente se me antolha,”
O quadro verdadeiro, mas cruel,
Na ausência do que fora inferno e céu,
A mão na podridão deveras molha
E bebe cada gota deste pus
Criado após a morte da matéria,
Aonde se mostrasse uma bactéria
O sonho do futuro eu decompus,
E transformado em face tão diversa
Medonha garatuja; nada exijo
E quando se prevê o quanto erijo
Da morte que deveras já se versa
Guiando para a vida em forma opaca,
Draconiana imagem gera a estaca.

154


“Tal qual quem para o próprio túmulo olha,”
Percebo a minha morte mansamente
E quando a nova vida se pressente,
Um ser na podridão do vago molha
Seara feita em pútrida verdade,
Não deixa qualquer dúvida, portanto,
Se tendo novo sonho ou desencanto,
O quanto se percebe e se degrade
Permite a tradução do quanto sou,
E nada impediria este caminho,
Nasci e irei morrer sempre sozinho,
A fonte em mim jamais se transmudou,
Meu horizonte extingue e nada mais
Do que os tão costumeiros vendavais.

155



“É com certeza meu irmão mais velho”
O vírus, a bactéria, o verme enfim,
Eternizada a vida no jardim,
E nela participa o escaravelho,
Assim como também a sorte inglória
Gerada desde sempre pela vida,
E sendo transformada e não perdida,
Apenas destroçando-se a memória,
Não posse crer na mão de um ser maior
Domando ou dominando cada passo,
E assim o que sou hoje eu mesmo traço,
Nem tanto nem tão pouco, ou bem menor,
Pensante? Nada além é o que me basta,
A morte de morrer nunca se gasta.


156

“E o animal inferior que urra nos bosques”
Deveras no futuro será rei,
Assim ao dominar inteira grei,
Por mais que na verdade já te enrosques
Nos erros do presente, no futuro
Virás como uma imagem bem diversa,
E assim sobre a verdade ora se versa
E quando vejo o nada que procuro
Encontro-te somente como um ser
Tão ínfimo onde um dia tu pensavas
Em horas mais venais, difíceis bravas,
Manter sob teus olhos o poder,
E vendo que deveras não és nada,
Imagem soberana destroçada.


157


“Amo o esterco, os resíduos ruins dos quiosques”,
Pois deles se fui feito ali reside
Futuro que a natura já preside,
E assim ao refazer matas e bosques
O deus feito em figura tão complexa
Ao mesmo tempo simples, traduzindo
O que se mostra eterno e mesmo infindo,
A morte sempre à vida ora se indexa
E tendo esta certeza nada impede
De prosseguir embora em senda vária,
O quanto se fazendo necessária
A sorte que o morrer sempre concede,
Deixando esta certeza de um eterno
E renovado mundo em que me interno.


158




“A podridão me serve de Evangelho”
Um deus feito em bactéria tão somente
Domina a cada instante plenamente,
Na força de um pequeno escaravelho,
Serpentes são imagens tão sutis,
Deveras punição se ainda houver
Gerada por um ser menor, qualquer
Diverso do que a lenda traz e diz,
Peçonhas são comuns às criaturas
Piores as que têm o ser humano,
Da Terra sendo algoz, verme profano,
Deixando as novas horas mais escuras,
Assim ao se vencer a própria sorte,
A salvação da vida se faz morte.


159


“Mostro meu nojo à Natureza Humana”
Ao vê-la destroçando o ventre aonde
Gerada há tanto tempo, não se esconde
Somente a cada dia se profana,
Destroça o velho ciclo, eternidade,
Introduzindo a morte sem remédio,
E como do demônio, num assédio,
A fúria deste ser tudo degrade,
O deus que ele pensara construir,
Destrói cada esperança da natura,
E a morte que ele cria se perdura
Negando qualquer forma de porvir,
Demônio e deus, deveras somos nós
O matricida frio, duro, algoz.

160


“Com um pouco de saliva quotidiana”
Destrói-se a cada dia mais um pouco,
E o ser tão demoníaco, pois louco,
A quem pensa domina, sempre engana,
Percebo a crueldade neste olhar
Da criatura audaz, quase indigente,
Por mais que novo tempo inda se tente
A vida num momento a se acabar,
O deus assassinado a todo instante,
Demônio com faceta definida,
Aonde houvera luz, a despedida,
Nas mãos deste fantoche, este gigante.
Criara deus, deveras tal demônio,
Ao destroçar da vida, o patrimônio.


161

“De todas as espécies sofredoras.”
A culpa sempre ronda aquela que
Achando-se maior ainda crê
Com garras tão terríveis, corruptoras,
No quanto seja mesmo um próprio deus
Dominando universo, pobre cão,
Aonde se negara qualquer grão,
Prefiro ter meus olhos mais ateus,
E passo a acreditar em Satanás
Com a face diversa da que trazes,
No quanto suas presas são audazes,
No quanto ele destroça e já desfaz,
Humana esta faceta, com certeza,
Imagem que sugere esta torpeza.


162


“A solidariedade subjetiva”
Ainda poderia dar um fim,
No ocaso que se vê, mas nada enfim
Calando a criatura tão altiva,
Ogivas e fantasmas, seus fantoches
E neles expressões de sordidez,
Enquanto se pintando o que tu vês
Ainda fazes troças e deboches,
Assim ao terminar a vida aqui,
Um deus já destruído e destroçado,
Inerte sem futuro, e sem passado,
Assassinado agora e é por ti.
Deixando como herança este vazio,
Que agora em ledos versos, eu desfio.


163


“Como um dorso de azêmola passiva,”
Apenas se mostrando em frágil face,
A vida não passando de um impasse,
De morte a cada dia mais se criva.
O quadro assustar já se afigura
As novas gerações não mais verão
Tampouco poderão saber do grão,
Na noite que virá; bem sei, escura
Escusa imagem, ledo patrimônio,
Herdade que deixaste, mas não vês
E mesmo que inda veja sem talvez
Lutar, tu participas, vil demônio,
E assim ao se fazer final eclipse
Tu criarás o tal apocalipse.

164


“E trago, sem bramânicas tesouras,”
A crua realidade em luz sombria,
Aonde a praga enorme já porfia,
As horas sempre sendo morredouras
Não deixam que se veja algum alento,
Esgota-se a natura a cada instante,
Imagem tão venal, pois degradante
Trazendo para tantos, sofrimento
No reinado do estúpido senhor
Maior que o próprio deus que já criara,
A fera aumentando a enorme escara,
História milenar a decompor,
Somente este destroço sobre a terra,
Capítulo final, assim se encerra.


165


“- O metafisicismo de Abidarma –“
As crenças de momentos tão diversos,
Não cabem na verdade nos meus versos,
A realidade dura me desarma,
Aonde houvera vida, neste instante,
A morte sem saída já se vê,
O quanto disto tudo tem por que,
Riqueza com poder, tudo agigante,
Prostituindo a mãe que gera a vida,
Deidade destroçada, não restando
Sequer algum momento bem mais brando,
Prepara-se afinal a despedida,
E o vento do vazio no futuro,
Cobrindo este planeta opaco e escuro.


166


“Na existência social, possuo uma arma”
Palavra que talvez modificasse,
Mas quando se percebe vil impasse,
Não posso sonegar sequer o carma,
E vejo este momento agonizante
Aonde a vida morre sem defesas,
Assim dos homens, todos seres, presas
Não valem nem sequer um mero instante,
Avassalador demônio está
Numa alma transtornada por poder,
Mostrando-se desnudo me faz ver
Que tudo destruído desde já
Deserto em fina areia toma a Terra,
Melancolia plena, a paz soterra...

167


“E a miséria anatômica da ruga”
Não basta para crer-se tão finito,
Degenerando a vida, eterno rito,
Não deixa escapatória sequer fuga,
A divindade feita em natureza
Assola-se deveras pelo cão,
Que ainda preconiza punição
E gera por si só farta vileza.
Nefasta criatura que venal
Não deixa que se veja alguma paz,
E quando estes destroços; ela traz
Num tenebroso e agreste ritual,
Já não comportará uma esperança,
E a morte sem remédio invade e avança.


168


“O amarelecimento do papírus”
A tosca realidade dos pequenos
Enquanto dos gigantes os venenos
Destroçam mais que algum intenso vírus,
A história revelada do que fora
Não deixa qualquer dúvida o demônio
Domado por ganância e pelo hormônio
Demarca com a fúria tentadora
Caminho para o qual se precipita
Humanidade inteira, e toda a vida
Que ainda resistindo e já perdida,
Deveras tão somente inda palpita,
A pútrida verdade; vislumbrando
E a cada novo dia deslumbrando.




169


“Que produz, sem dispêndio algum de vírus,”
A morte em série após tal temporal,
E quando se mostrando triunfal,
Supera qualquer forma de anti-vírus
Gerando o genocídio entre outros tantos
Terrores, demoníaca figura,
Diverso desta sorte que procura,
Apenas tão somente desenganos,
Assisto à derrocada do planeta
E vejo o que jamais imaginara,
Enquanto este vazio se escancara,
Ausente uma esperança, vil cometa.
E todo este final se aproximando
Satânico terror nos dominando.


170


“- Esta universitária sanguessuga”
Que explora toda a senda, mal se importa
Se ainda havendo luz atrás da porta,
Enquanto houver a força tudo suga,
E trama a discrepância que transforma
A sorte do planeta em que ora habita,
Deveras criatura tão maldita
O que restara ainda já deforma,
E segue sua sina, Satanás
Não deixa sobrar pedra sobre pedra,
A fera mais audaz, decerto medra
Ao ver esta figura tão mordaz,
Aonde houvesse vida, nada resta,
Somente esta paisagem, vã, funesta.


171


“Não conheço o acidente da Senectus”
Tampouco uma explosão que devastasse
Não deixando restar sequer a face
Quanto a que produziu o homem erectus
Se houvesse um criador inteligente
Jamais teria enfim gerado esta arma
Que condenando a vida a triste carma,
Deveras da esperança tão ausente,
Não posso acreditar nesta dantesca
Imagem que se fez de um pai qualquer,
Anômala carcaça aonde houver
Destroça qualquer forma animalesca,
Devastações após devastações
Da vida nem sequer emanações.


172


“Pairando acima dos mundanos tetos,”
Imagens do que fora outrora vida,
Desaba sobre as casas, despedida,
Invadem todo o espaço vis insetos,
E mesmo após o fim não restarão,
Atômica explosão, calor enorme,
Ou gélido cenário que, disforme
Os corpos decompostos cobrirão,
E assim num pesadelo finda a história
E o deus também já morto, natureza,
Somente nos restando uma certeza,
Experiência vil e merencória.
Escória das escórias; ser venal,
Preconizando enfim todo o final.


173


“E a morbidez dos seres ilusórios”
Já não permitiria a sobrevida
Enquanto houvesse luz, rara saída,
Momentos mais felizes, peremptórios,
Mas nada se percebe e vejo o caos
Ancoradouro aonde o barco leva,
A terra se cobrindo espessa treva,
Escada em podres, toscos, vãos degraus.
E a caricata imagem do passado,
Jogada sobre o chão, espólio amargo,
Aonde em procissão se acreditara
Na chaga já percebo enorme escara,
E sigo contra a fúria, sem embargo,
Não sendo nem lunático ou profético,
O fim ora pressinto, mesmo herético.






174


“A saúde das forças subterrâneas,”
Há tanto combalida não permite
Que a vida ultrapassando algum limite
Exale além de forças momentâneas.
Igrejas, patrimônios do demônio,
Vendendo algum pecado mais boçal
Esquece em cada tosco ritual,
A fúria ensandecida de um hormônio,
E quanto se criou um deus bondoso,
Ou mesmo temeroso e tão atroz,
Estava ao ser humano dando voz,
Sobrepujando sempre enfim, o gozo;
E assim ao destruir a divindade,
Canalha bem mais alto sempre brade.


175


“E é de mim que decorrem, simultâneas,”
Vias que talvez possam dizer
Do quanto se mostrando em desprazer,
As horas mais difíceis, vis insânias
O parto sonegado da esperança
Rapinas sendo bípedes pensantes,
Deveras não percebem nem instantes,
Enquanto empunham, tosca e vasta lança.
No quanto poderia ter um sol
Que ainda iluminasse este planeta,
A cada novo engodo que cometa,
Destruição domina este arrebol,
E o fim traz seu aroma, tosco enxofre,
A vida se perdendo já de chofre.

176

“A alma dos movimentos rotatórios”
Talvez deixe restar algum momento
Aonde se pensara num alento,
Embora os dias mostrem tão inglórios
Caminhos pelos quais se aproximando
Cenário em derrocada, tão feroz,
A morte prolongando a sua voz,
As esperanças morrem, triste bando,
E o cárcere criado pela face
Satânica de quem se orgulha tanto,
Espalha com terror o turvo manto,
Somente enredo trágico se trace,
A porta não se abrindo, já se emperra
E a morte dominando toda a Terra.


177

“Em minha ignota mônada, ampla, vibra”
A força que talvez já redimisse,
O sonho se quem sabe alguém ouvisse,
Mas pura realidade se equilibra
Nas fúrias e nas ânsias mais tenazes
Buscando da riqueza o lenitivo
Enquanto da esperança já me privo,
Percebo caricatos tão mordazes,
Se adonam do poder e faze disso,
Apenas um caminho para o gozo,
E o que se fora outrora majestoso,
Não tem sequer mantido um mero viço.
E o gesto terminal de Satanás
Humano tão somente o fim me traz.


178


“A Simbiose das coisas me equilibra”
Ainda que se mostrem sempre frágeis
Os dias necessitam ser mais ágeis
Pesando contra mim a imensa libra.
Pereço a cada dia e sei do quanto
Inválido este brado de um pensante
A cada novo tempo o ledo instante
Traçando no final o desencanto.
Cansado de lutar contra o poder,
Esgoto-se deveras minha senda,
E quando o fim amargo se desvenda,
Ninguém procura mesmo ver e crer,
Lunático cantor, profeta espúrio
A cada novo verso, outro perjúrio?

179


“Da substância de todas as substâncias”
Carbono feito em deus já se perdendo,
Deveras não deixando dividendo,
Ausentes ou bem frágeis militâncias,
Não podem contra a força do dinheiro,
O deus que foi criado por tal fera,
Matando este verão, sem primavera
O inverno se tornado corriqueiro,
Assomam-se demônios, vejo bem
A face denegrida do que somos,
E quando ainda creio no que fomos,
Percebo que somente o nada vem,
Destruidora e torpe criatura,
Das rédeas do futuro se assegura.

180


“Da escuridão do cósmico segredo,”
Negar a própria sorte? Estupidez
Diverso do que espúrio ainda crês.
No verso que ora faço já concedo
Preconizando o fim inevitável,
Desesperança rege e mata deus,
Ainda que meus cantos; sinto ateus
A cada esquina um demo demonstrável,
Na mão que prostitui e explora a dor,
Na infância já perdida em meio aos vândalos
Ainda há hipocrisia dos tais sândalos,
Apascentando ao fim o lutador.
Vergonha, tão somente uma vergonha,
Envolta por enorme e vã peçonha.


181


“Larva de caos telúrico, procedo”
De tempos mais felizes, sonhadores,
Aonde ainda houvera belas flores,
E agora se percebe tanto medo,
Vencido pela intensa morbidez
Na qual se imiscuindo deuses tantos,
Aonde se mostraram tolos prantos,
O quanto se pudera já desfez,
E a glória de um passado tão fugaz
Nas fátuas impressões, fráguas suaves
Agora se perfilam tantas traves
Matando o que inda houvera de uma paz,
Pudesse haver quem sabe um deus pensante,
O mundo mudaria num instante.

182



“Pólipo de recônditas reentrâncias,”
Assisto à derrocada do que fora
Outrora alguma imagem redentora,
E agora se perdendo em militâncias
Diversas entranhadas pela incúria
Gerações perdidas, sem futuro,
O quanto de mim mesmo inda procuro
Traduz imagem tosca em tal penúria.
O vento que viria abençoar
Demônio que criaste tudo impede,
Nem mesmo uma esperança se concede,
Aonde existiria luz solar,
Se a morte finalmente conseguiste
Tornando este cenário bem mais triste.


183

“Do cosmopolitismo das moneras”
Pudesse discernir a melhor sorte,
Que ao menos num momento me conforte
Negando o que se vê nas torpes eras,
Abraço os meus delírios e deleto
O quanto dolorido se faz ver
Vitória do dinheiro e do poder,
Serviço tão bem feito, pois completo.
Assino com meus erros, meus engodos,
Partícipe deste ato terminal
Jogando sobre a Terra a pá de cal
Deixando-me levar pelos vis lodos.
Ainda que pensasse nalgum deus,
Prefiro os caminhares mais ateus.

184


“"Sou uma Sombra! Venho de outras eras,”
Aonde se pensara em luz e glória,
Agora a vida escassa e sem memória
Já não mais revivendo primaveras,
Assola este planeta o frio e o tédio,
Devastação sombria e dolorida,
Morrera neste instante toda a vida,
Erguemos Satanás em alto prédio.
E o pêndulo que eterno dominava,
Agora se calando, não traduz,
O quanto da verdade reproduz,
Tomando pela cinza, fúria e lava,
Ausência de esperança, morto deus,
Natura se demonstra em pleno adeus.

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