quinta-feira, 1 de abril de 2010

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28246

“Têm que dar para Ismael”
Desta África americana
Onde houvera soberana
Mata agora escuro véu
Esfaimada esta guerreira
Que se fez maravilhosa,
Num jardim ausente rosa,
Nem daninha; a seca inteira
O futuro que se deu
A quem tanto havia dado
O presente sonegado,
Um caminho em tanto breu,
Têm que dar somente o nada,
Sorte em fúria, destroçada.

28247


“Que nem o leite de pranto”
Que nem o medo da morte,
Nem a luz que inda conforte
Nem sequer canário e canto,
Desencanto tão somente
Molda a terra antes tão bela
O futuro tece a tela
E sonega uma semente
Produzindo esta aridez
Onde houvera uma esperança
A seara amarga alcança
Todo sonho, insensatez
Negação de algum alento,
Vejo dor e sofrimento.


28248

“Como Agar sofrendo tanto,”
Iracema em dor terrível
Um momento mais temível
Feito em treva, turvo manto,
Geração pós geração
Tanto havia por fazer,
Mas ganância de poder
Causando destruição
Matagais, florestas fartas,
Luzes várias, flores raras,
Se percebem vis escaras
Se das sortes tu te apartas,
E o cenário refletindo
O terror agora infindo.


28249


“N'alma — lágrimas e fel...”
Onde outrora se quis tanto
Se percebe ausente o canto,
Um canário morto ao léu,
Percebendo este areal
E somente este deserto,
Tanto grito e tanto alerto,
Mas pareço algum boçal
Cavaleiro em noite vã
Traduzindo em versos frágeis
Motos-serra são mais ágeis
E sonegam a manhã
Morta assim a terra esboça
Esta face feita em fossa.

28250


“Filhos e algemas nos braços,”
Caminheira do futuro,
Neste solo amargo e duro
Inda tenta leves passos,
Traços mesmo do que fora
Uma sorte mais sutil,
A desdita diz Brasil,
Onde a sorte tentadora
Poderia ter enfim
Um momento mais feliz,
A verdade contradiz
E traz seco este jardim,
A mortalha que reveste
Traduzindo o solo agreste.


28251

“Trazendo com tíbios passos,”
Esta dor que dilacera
Neste olhar terrível fera
Ocupando os seus espaços
Traços ditam o vazio
Sensação de nada ter,
O deserto a se fazer
Um terreno agora frio
Desafios do porvir,
Novos tempos amanhãs
E deveras são malsãs
As estradas a seguir
Se não forem bem cuidadas,
Esperanças destroçadas.

28252


“De longe... bem longe vêm”
Os olhos de quem se deu
No vazio em pleno breu
Da esperança bem aquém
Nada resta nem ao menos
Ilusão e calmaria
Noite vaga, amarga e fria
Onde em climas mais amenos
Poderia ter a sorte
Que talvez inda tivesse
Se pudesse ter a messe
Da alegria que conforte,
Mas a morte traduzindo
O que outrora fora lindo.

28253


“Que sedentas, alquebradas,”
Das florestas nada vejo
Onde houvera algum lampejo
São vazias alvoradas.
O caminho encontra o medo
O terror já se espalhando,
Alegria em contrabando,
A morte ditando enredo,
Nada além do canto atroz
Nada além deste deserto
Tantas vezes eu alerto
Já cansada a minha voz
Deste encanto do passado,
O temor: nosso legado.


28254

“Como Agar o foi também”
Iracema não sabia
Da tristeza e da agonia
Que esperança não contém,
O perder de um novo tempo
O poder gera poder
E deveras posso ver
Tão somente o contratempo
Nele a senda mais dorida,
Agoniza este planeta,
Tanta dor que se cometa,
Destroçando a própria vida,
Neste solo americano,
Desalento e desengano.

28255


“São mulheres desgraçadas,”
Mães dos pobres continentes
Na verdade as indigentes
Pelas sortes mal fadadas
Vendo os filhos destroçados
Mortas horas, novo engano,
O planeta em desengano
Se entregando, ausentes prados
E das matas brasileiras
O deserto se desnuda
Esperança tão miúda
Já não restam mais palmeiras
Ar terrível, podridão,
Em total desolação.

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